segunda-feira, 26 de março de 2012

DIAGNÓSTICO: DESCASO, EGOÍSMO E IRRESPONSABILIDADE

A história de que as adolescentes passageiras do avião em que Jacqueline morreu de pneumonia foram orientadas a se maquiar antes do embarque rumo ao Brasil, pode ser verdade ou não. Tal maquiagem teria por fim disfarçar a palidez dos rostos e evitar problemas como suspeita de gripe suína, com provável impedimento da viagem.
Verdade ou não, isso tem a cara da irresponsabilidade bem brasileira dos nossos empresários, políticos e outras figuras que detêm algum tipo de poder, ainda que momentâneo e sobre um grupo específico de pessoas desatentas em relação a direitos, obrigações e conveniências. No caso, um grupo de adolescentes acompanhados de ninguém mais que seus agentes de viagem e funcionários comprometidos apenas com o sucesso financeiro e a imagem da empresa pela qual se aviltam, se necessário.
São também irresponsáveis os pais que enviam filhos menores a viagens longas, especialmente para o exterior, aos cuidados desses estranhos. Nenhum tio, tia, irmão mais velho, avô, talvez um padrinho de confiança inquestionável. Nenhuma pessoa que saberia tomar uma atitude firme, ainda que fosse necessário envolver a polícia ou gerar um problema diplomático. Se houvesse uma atitude assim, a adolescente não teria morrido. Não de pneumonia. Não de abandono e descaso. Não de forma tão esdrúxula quanto evitável.
É a porcaria da maquiagem. Maquia-se na sociedade, dos rostos às evidências; da crise no senado à corrupção policial; da miséria ao preconceito; da pedofilia entre os poderosos aos desmandos no judiciário, na igreja e na família. E são as maquiagens que tornam tão intrincadas as investigações, resultando quase sempre os arquivamentos, eliminações de provas, desistências, substituições de prioridades via opinião pública e outros atos que garantem a impunidade parcial ou total.
Quase profetizo que em pouco tempo outra notícia afrouxará as manchetes sobre este caso, desviando o foco e desobrigando as autoridades de cavar mais fundo e chegar aos culpados que, certamente, são inalcançáveis. Não seriam, se tanta coisa obscura não estivesse envolvida.

APENAS VIVO

Hoje quase posso dizer as medidas exatas do sofrimento. Na verdade, não louvo nem maldigo a vida, por causa disso. Sequer mandingo na tentativa de uma possivel fuga, pois entendo que a sina se constrói ou aluga o nosso corpo enquanto há pulso.
Muito mais do que isso, agora sei da verdade, face a toda mentira que ela acomoda. Entendo, resignado, que os contentos que a entrecortam são feito modas ou viroses. Só a tristeza é vida, pela tradição que a perpetua enquanto há. Tristeza é lua que rege nosso tempo em nós.
Bem sei que nada nos livra desta história; deste livro de folhas entreabertas que enseja penumbra e solidão. Tenho chances cada vez mais desertas e mesmo assim vou relutando contra todos os lutos do viver, para ver se cumpro meu luto vital e uma certa missão que os clichês impõem a todos.
Sobre tudo o que dói sei quase tudo, e quase nada restou de se atinar sobre as coroas de farpas da conquista exangue dessa cruz que se carrega. Do sangue ralo e coalhado com que se rega o caminho na ilusão de um tempo que ninguém viu.
Há mais grilo do que esperança... Mas parece que a segunda é a última que morre... Por isso vivo. Com que pretensão nem sei, mas vivo.

DAS MELHORES COISAS

Ter fé significa não ter...
Porque fé não combina com presente...
Crer consola e superestima o nada,
para que valham todas as nossas penas...
Céu é distância, por isso nem é;
ao subirmos fica sempre muito além...
Dá prazer visionário ser assim,
vai-se ao fim procurando eternidade,
numa velha verdade sem sentido
que se prova por meio de mentiras;
as que dizem do que foi dito e feito...
Certos futuros não deixam de ser...
Sua magia está no ser futuro...
Vencer é mais digno quando havemos,
pois tem os rompantes dessa pronúncia...
Deus é mistério, portanto não há;
se lhe virmos não terá sido Ele.

PREGUIÇA

O calango dormita num banho de sol
e nem vê que um besouro caminha bem perto;
lá na frente a coruja observa e boceja;
uma cobra rasteja sem ar de ameaça...
Patos nadam - mais nada - no lago lodoso,
folha seca e miúda faz pouso discreto
apoiada na brisa que a trouxe de longe;
há um boi quase monge mugindo no pasto...
A cigarra improvisa uma trilha sonora,
faz a hora mais lenta, passiva e velada;
meio eterna; suspensa; vazia; profunda...
Gavião plana livre, meus olhos também,
vou além das montanhas miúdas e azuis
pra sonhar que ninguém me acordará daqui...

"GRIPPE"

Estão vestindo outras doenças de gripe suína... De tal forma, que a nova gripe já nem é gripe... É griffe suína.

SARNA & SARNA

Uma gripe suína é pior do que o fato
de que alguém rejeitou nosso amor extremado,
a miséria do mundo importa mais que o jato
das lamúrias do amante que não foi amado...

Ser traído em romance é melhor que o reinado
das mentiras de ofício, e de grande aparato,
que transformam política em campo minado;
tornam nossa esperança um produto barato...

Nossos dramas de afetos são fúteis e bobos,
nesta selva de gente gerida por lobos
em estampas vistosas de supercarneiros...

Essa dor novelesca de amor terminado
é menor do que aquela de ver que o senado
se revela ou confirma o pior dos sarneiros...

JAZZ

Hoje quero viver feito água em moinho,
chafariz numa praça de muitos turistas,
nunca mais feito vinho curtindo em barril
nem os ítens de listas que ninguém consulta...
Já cansei de cansar, decidi ser constante,
perseguir meus intentos com tal teimosia
que viver seja instante repetido em série;
correria sem alvo, sem ponto final...
Pensar menos na vida já faz viver mais,
quero sempre querer uma nova saída
e jamais concluir que cheguei ao meu porto...
Abracei este sonho de sonhar além,
ser alguém que não cede à sedução da paz,
nunca jaz onde o tempo executa o seu jazz...

PÁTRIA NADA BRASIL

O país das promessas definha em meu sonho
que não foge à verdade; mantém a razão;
minha gente carrega um comboio tristonho
de alegrias fraudadas por tanta ilusão...

Já me cansa um futuro tão longe da mão;
exibido à distância num filme risonho;
paraíso embrulhado no velho sermão
que acalenta esperanças de um povo bisonho...

Tenho asco da pátria em que a lei é bandida,
quem a gere ou legisla não quer uma vida
partilhada entre todos com tino e justiça...

Um país dominado por gangues de bestas
que arrebanham fiéis com migalhas de cestas;
alimentam seu povo de medo e preguiça...

ARREMATANDO O FIM

Quem quiser que te leve
pra longe de tudo,
para o olho do nada,
o sem fim dessa história
que se arrasta no rastro
do fim que já teve...
É bandeira que o tempo
desgarrou do mastro.
Já te pus nos rejeitos
de minha verdade,
acabou a ferida,
limpei o seu pus;
costurei os extremos
pra fechar o flanco,
ter a página em branco
e começar de novo.
Tu serás usufruto
para quem quiser,
pois te lego e renego
sem pesar nem luto,
quero vida bem longe
das tuas peçonhas.
Será grata surpresa
que alguém te conduza
pela senda confusa
de um ermo qualquer,
pra que saias do alcance
de minha visão.

VISÃO DE FUMÊ

Tenho marcas de mundo por todo o meu ser,
uma trouxa de sonhos que o tempo encardiu
e carvões de fogueiras que arderam sem fim;
muitos fins de sem fim, eternidades gastas...
Trago pesos de vida no dorso da essência;
águas densas, profundas, de fé poluída;
carga imensa de mortes e ressurreições,
caminhões de lembranças amargas e doces...
Quase nada me assusta nem produz encanto,
pois o tempo me deu estes olhos de vidro,
parabrisas com filme, visão de fumê...
Novidades têm ares de velhas vivências,
uso filtros, dormências, abafo seus baques,
tenho senso antiataques; radar antimísseis...

quinta-feira, 22 de março de 2012

ENGANOS DE AFETO

Desengano de afeto nos tira de nós,
cria os nós que nos atam ao fundo do poço,
quebra os ossos do espírito e fere na carne,
faz a voz da razão acordar os sentidos...
Os efeitos nefastos do tombo afetivo
são projéteis perdidos que matam quimeras,
tiram todo motivo que o sonho alimenta
e nos fazem saber que a verdade não morre...
Quando nossa emoção cai do céu enganoso,
sofre o golpe doloso do seu desencontro,
vê que todas as nuvens verteram no chão...
Tudo perde horizonte na mira dos olhos,
nossos raios de sol se acinzentam no monte,
mas a vida constrói outro engano afetivo...

SEM VOCÊ

Caminhão sem ditado popular;
mar sem onda, salmoura ou horizonte;
menino sem desejo de pular,
matéria jornalística sem fonte...

Um sermão sem platéia, palco, monte,
uma casa que deixa de ser lar;
sou Rio-Niterói sem barca e ponte,
réu que vai à prisão sem apelar...

Desde sua partida estou sem chão,
qual político sem corrupção;
mais perdido que punk em monastério...

Campeão que por fim perdeu a luta,
padaria sem pão; bordel sem puta;
uma gruta vazia de mistério...

GENTE

Tá na hora de alguém achar correto
ser correto, antiquado, cidadão;
ter bom senso, critério (até afeto);
perdoar e saber pedir perdão...

Chega o tempo em que os passos perdem chão;
que nenhuma esperança encontra teto;
nosso amor nunca passa da paixão,
a maldade floresce desde o feto...

Mas ainda nos resta esse poder
de ganhar o que pomos a perder;
recompor a missão se mostra urgente...

Se não temos a velha eternidade,
precisamos correr contr´a verdade;
já é hora de gente ser mais gente...

CIÊNCIA DE AMAR

Sei de amar e ter troco, isso rege meu ser;
Sei de ser qualquer coisa que agrade a quem amo;
Tenho a bula ou a carta que rege os sentidos
Da carência de tudo por que vivo agora...
Porque sei que de amor surgem todos os sonhos,
Dele nasce o poder do meu senso de humor,
Tudo pode a partir do seu íntimo efeito
Que se explica por si, sem ter como explicar...
Só não sei como sei, por favor, não inquira,
 Sei apenas que sei, meu saber é sentir,
É viver o que sou e me deixar levar...
Minha lei é saber o que o coração intui,
Saber quanto não sei a partir dos sentidos,
Isso inclui a ciência do quanto sofrer...

SE AS LEVO JUNTO

 Para Nathália e Júlia

Vocês tem o meu mundo a flor-da-mão;
minha vida está sob os seus olhares
que me pedem sentido, rumo e sina;
uma esquina que as lance para o mundo...
O sentido pra tudo que me apraz
vem na paz de seus rostos curiosos,
na leveza dos sonhos que despertam
seus estados de plena indagação...
Só há como seguir se as levo junto,
somos este conjunto que se leva
pelo tempo que opera seus milagres...
Sou feliz desde quando me deixei,
minha lei é ser chão de seus caminhos;
vocês são minha vida pessoal...

segunda-feira, 19 de março de 2012

BAIXANDO O EGO

Se você tem problemas de relacionamento com todos ao seu redor, das duas uma: Todos reprovam sua maneira de ser ou você reprova a maneira de ser de todos. Pense nesse detalhe, disposto a reconhecer que o problema não está em quase todo o mundo. A harmonia será muito mais facilmente estabelecida, se a única peça que distoa do todo resolver mudar de postura, uma vez que tal peça tem vontade própria... Ou você acha, em sã consciência, que todos os outros devem mudar em razão de sua preciosa personalidade? 

POLÍTICA DE AMOR

Quem hoje fala de amor é tão "do contra", que não há nada mais esquerdista, incômodo e polêmico do que o amor.

PENA QUE MICHAEL JACKSON NÃO SABIA

Temos um mito. Mito real e vivo. E com uma vida pautada pela coerência, o talento enxuto e uma grande capacidade de administração da vida artística, pública e pessoal. Um artista que “já era”, segundo muitos outros artistas, mas que teve esgotados em cinco dias os ingressos para seu show antecipadamente memorável no estádio Maracanã. Um rei que se derrama em declarações de amor para os súditos, esparrama sua admiração por artistas que sequer chegaram a um quarto de seu caminho e jamais apela para escândalos ou factóides em nome do sucesso. Um sucesso, aiás, que o acompanha há cinquenta anos ininterruptamente e jamais deixou de contar com uma multidão apaixonada, porém respeitosa e reverente. Como a um rei. O rei que ele é.
Nosso ídolo é esse homem que faz questão de ser comum. É romântico sem ser extremado. Gênio sem ser excêntrico. Culto e inteligente sem ser barroco ou rococó. Um caso de amor de milhões que têm a vida pautada pela sua trilha sonora. Roberto Carlos é a bonita novela de nossas vidas, com dramas humanos e reerguimentos sem espalhafato, cantada com voz macia; aveludada; soberana. É o carimbo afetivo de toda uma geração, e já consegue envolver outra geração de artistas e pessoas comuns que vêem nele um exemplo de vida e ponderação que nunca perde a majestade. Trata-se de um ídolo que não tem tietes. Tem profundos admiradores. Um professor de postura; de como se portar perante um povo que ele reconhece digno do seu melhor, mesmo com as falhas normais de um ser humano que sabe ser frágil sem deixar que sua fragilidade o avilte ou torne questionável aos olhos de todos nós, a quem cativou e por quem se tornou responsável. Assumidamente responsável, por meio de sua música e vida.
Temos enorme vantagem sobre o país que deu ao mundo o gênio inquestionável que foi Michael Jackson. Vantagem,porque o nosso gênio é infinitamente superior no conjunto. Em nenhum momento nos causa pena, dúvida ou revolta. Só nos proporciona imagens limpas, transparentes e dignas. Encanta sempre. Nunca desencanta. Quando abriu a vida para nós, com suas tristezas e fragilidades, Fe-lo com tanta lisura, sobriedade, resignação e respeito, que fomos todos solidários, mas sem dramalhões. Ele não chamou para si qualquer movimento consternacionista em massa. Apenas a solidariedade, o carinho e os pêsames sinceros dos milhões de amigos.
O nosso rei é superior. E sua grande polêmica está docemente centrada no enorme talento de fazer e ser um sucesso sem jamais precisar polemizar. Canta e vive o amor, é amado e ama o seu povo, e tudo acontece normalmente. Sem discursos, engajamentos, palavras de efeito proposital nem desempenhos precipitados e desastrosos para manter o trono. Amamos esse homem. Esse mito que é muito mais do que artístico. É pessoal. Está grudado em nossos corações e ouvidos. A sua música é a roupagem de nossas almas, e não sabemos como viver sem ele. Um dia o Brasil terá de passar por isso, e ser forte para tanto, mas tomara que esteja longe esse dia.
Quem dera tivéssemos políticos com essa postura, esse talento e a desenvoltura inigualável para gerir o destino de uma nação, como Roberto Carlos fez e faz com a sua nação de súditos, admiradores e amigos. Nosso rei sabe viver. Ele soube, desde cedo, que é preciso saber viver. Pena que Michael Jackson não aprendeu com ele.

O POÇO É FUNDO

Tenho pressa da vida, o tempo é curto
para tantas verdades irrisórias,
vem um surto e carrega na surpresa
nossas glórias bastardas, irreais...
Quero ter um projeto consistente,
ser exímio no quanto me proponho,
afiar os meus dentes, minhas garras
e cravá-los num sonho realista...
Muita pressa do mundo, a vida gira,
tenho medo é do nada; o poço é fundo,
a mentira me cerca e galanteia...
Grito até nos meus poros, meu silêncio,
pela pressa de nunca mais ter pressa;
ser a peça central do meu destino...

FOME TITÂNICA

Temos fome de coisas que não cabem
nas bandejas imundas dos sopões,
nos discursos nojentos dos governos
ou em seus alçapões eleitorais...
Nossa fome até passa pela fome
do provento que deixa o corpo em pé,
mas avança na fé que sangra e sua
por saúde; justiça; educação...
Uma fome de tudo que nos traga
autoestima, sentido identidade;
a verdade que o sonho idealiza...
Temos fome titânica de vida;
muita fome de quês, porquês, de como
roubam nossa comida e tudo o mais...

IMPRESSÕES DE MEIA IDADE

Meus e-mails de amor se perderão,
como as cartas ficaram nos baús
ou a cruz se perdeu dos vereditos;
hoje é peça vulgar de gargantilhas...
Os torpedos de sites populares
morrerão nas geleiras do futuro,
o futuro também já é passado
no presente veloz dos nossos filhos...
Minhas cartas de amor lá no porão
testemunham que o mundo é passageiro;
o carteiro é relíquia cultural...
Saberemos até que a eternidade
jazerá nos momentos garimpados
pela idade banal de cada um...

PRECE AO NADA

Ela dorme depois da dipirona,
sua muito e seu rosto se abateu,
este ateu quase reza ou se flagela
numa zona sombria e conflitante...
Gostaria de achar essa fé pop
que saltita nos templos destes tempos,
nos entope do clima entorpecente
de alegria dormente ou convulsiva...
Meu amor se derrama sobre ela
em desvelos, silêncios, atenções,
na capela das minhas esperanças...
Peço ao caos, ao silêncio, à solidão,
palavras de condão pra sussurrar
e fazer com que a febre "vá de retro"...

sábado, 17 de março de 2012

FALSA


Sei quem sou, mas perdi a identidade
quando achei que teu corpo a firmaria,
vi teus prados e tive a ingenuidade
da esperança de minha sesmaria...


Solitária e secreta romaria;
busca infértil de paz, felicidade;
ao te achar não pensei que somaria
mais loucuras à funda insanidade...


O teu corpo é o invólucro do nada;
latifúndio que serve de fachada,
maquiagem forjando o teu avesso...


Tens um rosto, mas falta-te uma cara;
a tu´alma é desvão que se mascara;
és quem sei, mesmo assim te desconheço...

SEM LAR

Ser estranho na própria casa pode ser tão cruel quanto não ter onde morar.

APARÊNCIAS

Há muito mais coisas entre a mente e o coração, do que se pode supor em nossa vã fisionomia.

APRENDENDO A ESCREVER A HISTÓRIA


Em um todo, nos quadrinhos da política não há heróis... quando muito, existem vilões oponentes, mas todos têm os mesmos pontos fracos: ganância, egoísmo e vaidade além da imaginação. Isso faz com que eles, entre si e por si, travem uma luta eterna onde as vitórias pontuais são rotativas e inconfiáveis.
Triste mesmo é saber que a luta eterna dos vilões instituídos impõe sequelas à vida real, do povo trabalhador, que de forma desavisada escreve nas urnas essa história... desenha esses personagens... institui esses quadrinhos de autênticos esquadrões da morte de milhões de pessoas... milhões desses autores que recebem como pagamento essas sobras mortais com enorme poder destruidor pela fome, as doenças, a violência e a desinformação.
Apenas nós, os autores, podemos mudar os quadrinhos da política, e com isso, a nossa história real. Temos que substituir os vilões que estão lá, por cidadãos decentes. Com os superpoderes do discernimento moral, da boa fé e do verdadeiro desejo de uma aldeia, um condomínio, uma classe, uma cidade, um país e um mundo melhores para todos.
Punir sempre os vilões com a substituição irreversível e suscitar a pena legal para cada ato ilícito ou criminoso comprovado, aos poucos fará uma faxina nos cargos de comando e representação. Com o tempo, os quadrinhos da política só terão heróis (não populistas nem de pompas, armas, força bruta e máscaras, mas de caráter, caras limpas e trabalho). Aí não haverá guerras internas e todos teremos harmonia e progresso. 
É isso. O quanto precisamos é aprender a escrever, tendo aprendido a ler os resultados dos rabiscos desastrosos que temos feito nas urnas. Tudo por acomodação, falta de critério e de amor próprio.

ALMA SEM LEI


Sou tão livre que chego a sentir medo
do segredo de minha liberdade,
tenho tempo de sobra e sempre é cedo
para crer que alcancei maturidade...


Mas não tenho frissom pela verdade
que se ostenta na ponta de algum dedo
cuja mão é uma concha de vaidade;
uma farsa estampada num enredo...


Minha vida está solta pelo éter,
meu caráter dispensa tal suéter
que agasalha tamanha pantomina...


Sei do quanto não sei até o que sei,
o que penso não tem que virar lei
nem a lei do que pensam me domina...

MEDO E GRITO

Todo grito é um pedido de socorro... inclusive aqueles gritos de quem visa intimidar alguém.

SOMBRAS DE CLICHÊS


Ser honesto apesar de ser pagão,
explodir apesar de ser cordato,
mesmo herói assumir que tem temor,
ter amor sob a faixa de perverso...
É cabível ser grosso e menestrel,
delicado e machão, beato e sexy,
sonhador que mantém o pé no chão,
realista que flerta com luares...
Argamassa combina com poesia,
alergia tem tudo a ver com flor,
um andor também serve de balcão...
Dá pra ser um político limpinho,
como ninho é de pássaros ou cobras;
tudo sobra na sombra dos clichês...

MÁGOA BENDITA


Diluí sentimentos outrora invencíveis,
uma vida se perde nos vagos momentos
do cansaço que acorda o desejo de mundo;
da verdade que brada e me chama prá borda...
Vivo bem desde o dia em que soube quem és,
dei aos pés a certeza do adeus que já dera;
foi o tombo certeiro que me pôs de pé
ou a mágoa bendita que me fez inteiro...
Derrubei os remorsos e dramas da mente,
recompus a minh´alma e colei os destroços,
bem colados; perfeito; nem há cicatriz...
Sou feliz a partir da partida ou do trauma,
desde quando esta calma chegou aos meus olhos
que te viram sem capa; folhagem; disfarce...

AUTO INDULTO


Dessa vez seja o pai, vá ser feliz,
deixe o seu amor básico e verbal
como prova de sua consciência;
uma satisfação da não renúncia...
Goze a vida, esparrame seu prazer,
ame o nosso rebento mas se ame
sobre todas as culpas e conflitos;
como regem seus ditos populares...
Quanto a mim, dessa vez serei a mãe;
resolvi me guardar pra ser aquela
que dissolve a novela das paixões...
Será tudo pra mim amar meus frutos,
dar o tempo em razão de suas vidas,
ser feliz por viver dessa missão...

quarta-feira, 14 de março de 2012

TROGLODITAS CONTEMPORÂNEOS


Sou aberto às mudanças naturais que o tempo impõe, quando essas mudanças significam avanços de mentalidade universal. Mas me fecho pras mutações que aceleram tudo, inclusive o tempo, e atropelam a ordem natural do mundo em nome de um avanço que vandaliza e mata este mundo.
Progresso não tem que antagonizar com a vida. Ambos podem sustentar um ao outro, se deixarmos de ser insustentáveis, celerados e acelerados em nossa ânsia de poder absoluto. A imensa burrice da infinita inteligência humana mora no egoísmo da espécie que se decidiu autossuficiente. Queremos tudo pra nós, como se o todo não dependesse da flora, da fauna, da água e do ar. Sei que estas linhas são quase impublicáveis, piegas que são (pelo quanto soam surradas), mas estas obviedades nunca foram compreendidas pelo nosso instinto assassino de sobrevivência.
Ainda somos os trogloditas que disputam caças com feras e acumulam seus resultados na solidão de suas cavernas, onde maior parte vira carniça. "Nem nós, nem elas", é a nossa filosofia. E como o nosso poder é infinitamente superior ao das outras feras, que também são nossas caças, destruimos tudo ao redor.
Caçamos muito além do que comemos. Matamos o que não se come. Substituimos sem critério o quanto vive e faz viver,  pelo que mata e não tem vida para repor. Se não aprendermos a "dirigir", lançaremos a terra num buraco sem fundo... e sem volta.

FUSO SENTIDO


Uma chance à cabeça pra ver se repousa;
uma pausa na pressa pra me recompor;
um silêncio que tenha o poder de compressa
na minh´alma ferida; fraturada; exposta...
Mergulhar no meu eu e pescar lá no fundo
as verdades que o mundo acumulou em mim,
mas que deixo guardadas no louco desuso
deste fuso sentido que a vida não faz...
Construir no vazio que sempre senti;
mesmo cheio de farpas e cacos de sonhos
alquebrados; tristonhos; quebrados em mil...
Quero muito essa chance do encontro comigo
ao abrigo do instante que pare no tempo
e me faça esquecer do infinito restante...

ESQUECI


Como alguém que folheia um tablóide vulgar,
desocupa um lugar, uma lata, um banheiro,
esvazia o xaxim da samambaia morta
ou retira uma porta que o tempo empenou...
Feito quem se desfaz do vestuário roto,
que se livra do esgoto, a gordura no ralo,
faz aquela faxina debaixo do armário,
põe o velho fichário num arquivo nulo...
Tua história sem graça terminou em mim;
dei um fim nesse peso que jazia n´alma,
decompus teus rangidos na minha memória...
Desnudei-me de tudo que te recompunha;
escovei cada unha tirando a sujeira,
te lancei na soleira dos esquecimentos...

POEMA DE AMOR


Vejo tudo grafite, a vista é vaga,
tudo passa num ritmo contido;
sinto assim, sem sentido nem razão
minha história sem saga se perder...
Vivo dias noturnos sem luar,
cada noite me lesa em muitos dias,
são tardias as horas desde cedo
e meu ar cobra caro dos pulmões...
Quase viro fumaça neste vento,
mas me aguento e consigo resvalar
no silêncio do caos que deixa ir...
Na penumbra do meu senso de humor
falaria de amor, mas me desculpe
quem chegou neste verso crendo nisso...

ULTIMATO

Na prática, ultimato é uma espécie de... "ou te mato!".

AMOR VISCERAL


Quem me quer queira mais do que o monge a pureza,
do que o vate o cenário em que possa inspirar-se,
pois se quero é bem mais do que o réu a defesa
ou que todo bandido o perfeito disfarce...


Se me queres que seja um querer que não passe;
de quem faz do que sente uma eterna surpresa;
renovando a fogueira inerente ao enlace
que responde aos desgastes mantendo a certeza...


Não me queira se menos que os brônquios o ar,
ou que loucos românticos querem voar,
muitos morrem por isso felizes e plenos...


Ao amar busco a lua saltando num poço,
sei querer muito além dos limites do insosso
e desprezo alegrias de amores pequenos...

PARA NOVOS CAMINHOS


Gasto a vida vivendo, isso implica sofrer
por escolhas que faço, atitudes que tomo,
tenho tempo a perder só se for pra ganhar
no teor do que somo a mercê dos meus dias...
Dispensando besteiras que a muitos encantam
e por elas se aplica, se leva rasteiras,
levo a lida lidando, isso envolve acidentes
de percursos, vertentes, medidas e passos...
Nada quero da calma dos pobres de sonhos,
do sossego tristonho de quem silencia
se tornando esse corpo animado sem alma...
Pagarei qualquer preço que o mundo cobrar,
mas assim é que sinto, que sei como cresço
me fazendo sobrar para novos caminhos...

NOITES DE GUETOS


Há nas ruas um cheiro de sangue talhado,
cada laje ou telhado é testemunha inerte,
pelas noites urbanas resvala o dragão
que transporta o cargueiro de vidas humanas...
No silêncio evasivo das encruzilhadas
correm nadas nas veias de tudo que vive,
morrem sonhos que apagam tantos horizontes,
caem pontes de abismos entre fato e sonho...
É nas ruas que jorram detritos de salas,
gabinetes de gala derramam venenos
de projetos forjados em grandes mentiras...
Sai do lixo elitista esse lixo que mata
nas batalhas das ruas tomadas de chagas,
por adagas que rasgam futuros em massa...

REPAI


Assumir as veredas do amor sem recreio,
ser feliz de permeio por seres feliz,
porque basta o teu sonho pra minha verdade;
já não tenho vontade que não seja tua...
Quero dar sem medida e qualquer promissória,
renegar meu passado pelo teu futuro,
sem jamais consentir que uma história de pele
me dissolva no escuro e te leve a sofrer...
Desta vez não serei o tutor pós-moderno
que resolve se amar sobre todas as coisas,
pois se mira no eterno consenso comum...
Dando ouvido ao instinto materno de pai,
ser a mãe que te falta em essência e sentido;
renascer cada dia com teu crescimento...

segunda-feira, 12 de março de 2012

ACOMODADOS

Só se reconhece e critica a acomodação dos que não lutam por bens, cargos e fama. No entanto, existem muitas outras acomodações, quase todas mais graves, e das quais geralmente são portadores os mais fartos, influentes e famosos. Há aqueles que se acomodam com a distância dos filhos, a mesquinhês, a falta de privacidade, a solidão, a pobreza de caráter... Muitos se acomodam com a obesidade, a falta de conhecimento, a insensibilidade, a arrogância, e uma profunda carência de humanidade. Mais grave ainda, tantos outros se acomodam com a violência que os cerca, julgando que ela não os atinge. Acomodam-se também com o incômodo sentimento de querer mais e mais aquilo que já possuem com fartura. No fim das contas, não existem pessoas não acomodadas, e sim, uma imensa variação de acomodações que se acomodam em criticar as acomodações mais previsíveis, talvez as menos nocivas.

DE JULGAR E CONDENAR

Julgamentos não são precipitados, quando existe ética. Eles são automáticos no inconsciente humano. Precipitado é o veredito que atropela o julgamento e se manifesta precocemente, absolvendo ou condenando segundo preconceitos e simpatias pessoais mal administrados.

INVEJA

A inveja não é só a arma, como diz a velha frase; ela é, mais ainda, a alma dos incompetentes.

PEDINDO PAZ


É preciso abrandar esta brasa na mente,
pra romper a corrente que me faz escravo;
quero as águas vindouras lavando meu ego,
arrancando este prego da carne cansada...
Esta cruz do rancor, que não mata nem solta;
a revolta incontida guiando meus passos;
este sangue nos olhos, o fel na saliva,
uma ogiva implodindo no caos dos sentidos...
Tudo em mim pede paz e não sei merecer;
tenho mágoas expostas em lembranças vastas,
guardo pastas de arquivos que suplicam fim...
Perco vida insistindo em cultuar a morte,
lamentar uma sorte que o tempo selou,
sem ceder ao abraço de um novo começo...

CRÔNICA NOMINAL


A Maria de verdade, a Maria. Mas ninguém Amanda no coração. Por mais que tentemos gostar de outra, fica o sentimento específico por aquela, causando noites de Sônia. Falo Célio, quando afirmo que não se pode a Márcia todo momento, quando bem se quer. Benedita seria a hora de esquecer o amor que me despreza, mas a gente Carminha na contramão, quando pensa que avança na rota do esquecimento que o coração quer... Leda engano. 
Tento esquecer no trabalho árduo. Minha mão Elisa, mas tenho Carlos na mente, de tanto elucubrar nos meus afazeres, para ver se ocupo cada espaço e não acabo Malu com tudo isso. Estou Alberto a novas relações, mas o coração se fecha para o amor. Faço de tudo para que meu olho Míriam novos horizontes afetivos, deixo a carne gritar mais alto e chegar a Níveas que nunca imaginei. Quando acordo dessas loucuras e me arrependo por ter usado alguém, vejo que já é tarde; "a Inês é Marta" e não tem jeito.
Houve um tempo em que a esperança de um novo amor Luzia em mim. Agora vivo exatamente o Antônio dessa realidade. Minh´alma está numa Cris de identidade e já vai distante o tempo em que tudo era Glória para mim. Por isso me deixe. Não tenho Júlia de amor para fazer. Júlio por tudo quanto existe, que não seria sincero, se lhe desse perspectiva. Esqueça tudo o que sente, e lute Perla soltura de seu ser. 

ÓBVIO E REDUNDANTE

Os que chegaram lá, chegaram porque foram. Se não tivessem ido, jamais teriam chegado.

SINAL DE VIDA


Deixo a vida brincar de ser séria comigo;
vou nos passos do mundo e me deixo brindar
ao abrigo do rosto; esconder os meus medos,
me fazer de setembro e sequer ser agosto...
Sei fingir que não choro, sorrir do que sofro,
minha paz é lençol com brancura de cloro,
mas convenço e caminho; acredito em futuro
e consigo achar cores na ponta do espinho...
Dou ao tempo os poderes que são seus de fato;
sou apenas um flato que flui nas caladas
de momentos furtivos da própria existência...
Seja lá como for, tenho busca e sentido;
muitas vezes irrompo com cheiro de flor
e me sinto aspirado por algos e alguéns...

FELICIDADE INSOSSA


Faço duo com Gal, também clamo socorro,
porque morro por falta de faltas normais,
tenho paz em excesso; nada por chorar;
nenhum rasgo, tumor, arranhão, abcesso...
Feito Gal sofro a mágoa do não sofrimento,
do nenhum sentimento não correspondido,
meu incômodo estágio de comodidade;
uma felicidade que nada mais quer...
Nunca mais tive pranto nem razão pra tê-lo,
trago n´alma este selo duma resistência
que ninguém; nem eu mesmo consigo romper...
Minha veia precisa sangrar novamente,
peço à mente marmórea para dar um jeito
de fazer o meu peito voltar a sentir...

PREVISÍVEL


Tu és tão tantas outras que até tanto faz
ter-te ou ter outras mais; por um dia, estação,
pra fazer um programa e trocar umas juras
que nos paguem com juros no caixa da cama...
Depois disso e daquilo a rotina dos rostos
transportando nas ruas essências iguais,
passarelas de gostos também viciados
em surpresas normais que o tempo desmascara...
Derrubando este sonho de seres um conto
que rompeu a barreira de minhas verdades,
hoje dou este ponto e te fecho no tempo...
Mas refaço minh´alma e percebo risonho,
tu és tão qualquer uma que ponho de lado
e nem tenho passado que seja contigo...

sexta-feira, 9 de março de 2012

DE AMOR E CONVENIÊNCIA


Não. Não me procuraste apenas para saber como estou. Muito menos por uma nostalgia generosa ou inocente que te conduziu ao correio do teu quarto. O que te moveu de fato foi a mistura da inquietação de sentir que me amas ainda e a determinação de negar para ti mesma, negando para mim. Caprichosa como sei que és, precisavas me ferir uma vez mais como vingança pelo sentimento que te fere profundo através do gume da saudade.
A versão de uma recaída pela estátua que se dispõe às tuas idas e vindas não me convence. Até acredito que vais cristalizar tua vida numa conveniência conjugal, mas isso é tudo. Se não me tens, pelas inconveniências de uma realidade social adversa, da distância etária que a família condena e das minhas esquisitices, então vai ele. Que assim seja, e que venha o futuro.
Unir-te-ás ao padrão. Ao socialmente correto. À comodidade que as semelhanças oferecem. Adaptarás a felicidade no consolo da vida que fará felizes os teus, para sorveres gotas. Reflexos. Viveres do aplauso daqueles que se realizarão por ti, sem considerar a tu´alma; o teu coração. A rebeldia do sonho que te faria feliz comigo não sei até quando, quiçá por um laivo, mas que seria eterno. Lembrança grata e preciosa de quem um dia atendeu o apelo do próprio sentimento e fez tudo valer a pena.
Seja como for, entendo. Espero que absorvas o máximo de frestas dessa ventura que proporcionarás ao redor. Desejo sucesso em tua empreitada matrimonial. Logo terás a chance de amar de novo, porque virão os filhos, e por eles nada será em vão. Será um amor diferente, definitivo e maior, que te ajudará na administração do abismo entre o teu amor por mim e a conveniência por ele... a estátua.

PRATICIDADE AFETIVA


Ninguém morre de amor como se diz
no poema infeliz do mau poeta,
como sai da caneta exagerada
de quem nada encontrou que se aproveite...
Nem se vive de amor como decanta
qualquer anta que saiba usar o verbo,
feito esta que agora verbaliza
para ver se recicla o próprio entulho...
Faço versos com tal praticidade
desde quando a verdade me acordou
das mentiras do amor que nos juramos...
O poema real não tem poesia,
sentimento esvazia em nossos tanques;
haverá sempre um novo amor eterno...

A MÍDIA COMO CONVENIÊNCIA DOS ASTROS


É trabalho da imprensa cavar notícias. Não esperar que elas "caiam do céu", quando as estrelas de qualquer evento, setor ou realidade querem manipulá-la. Sempre que essas estrelas são alvos  de notícias elogiosas, reconhecem que a imprensa fez o seu trabalho. Porém, quando fazem algo menos louvável ou simplesmente não querem mostrar os rostos, dizem que a descoberta - fruto da eficiência investigativa do profissional - é invasão de privacidade.
Todos gostam da mídia quando precisam dela, usando-a despudoradamente para divulgar seu fatos, flatos, arrotos e besteiróis. Quando é a mídia que precisa desses mesmos todos, não eles dela, ganha rótulos pejorativos. Leva portadas e descomposturas. É processada e tida como criminosa. Na verdade, se um ou outro repórter atinge um estágio em que mereça repreensão, ou represália legal, não é a mídia. É apenas um ou outro repórter que se desvirtuou, como fazem outros profissionais - alguns virando notícias não muito ou nada honrosas.
Não é somente a imprensa que invade privacidades para fazer seu trabalho. A justiça também invade. Invade-as o matamosquito, o recenseador, o fiscal do IPTU entre tantos outros profissionais e instituições. Eles precisam trabalhar e têm que ser respeitados em suas atribuições, desde que ajam dentro da ética e da lei, mesmo inseridos nestas características.
Pode-se exigir da imprensa esses princípios de ética; esse cumprimento da lei. Se mais do que a privacidade, o repórter invade o domicílio; se mais do que fato, noticia calúnia;se ao invés da denúncia, publica ofensa pessoal, aí sim: Ele fere artigos, códigos e princípios, fazendo jus a punição legal. Cabe à vítima confiar na justiça e contar com  ela para que não haja impunidade. Vinganças pessoais e animosidade pública só acabam em muito mais constrangimento e desgaste.
Resta informar aos astros e estrelas que só gostam de ser assediados quando lhes convém, que muito mais triste do que a invasão de privacidade que os mantém no topo, é o esquecimento completo. A mídia que os alavanca é a mesma que os anula quando lhes viram as costas. Para quem vive do reconhecimento da opinião pública, acabar no colo do esquecimento é doloroso.
De qualquer modo, quem se acha muito invadido por ser pessoa pública e fazer coisas públicas passíveis de notícia, pode abrir mão do ofício que lhe dá fama e viver sem os conflitos e as alegrias do que faz. Como nada é perfeito e não se pode obter tudo, nenhuma profissão terá somente momentos gratos. Os espinhos e percalços estão por aí, desafiando essa consciência.

QUASE UM CONTO DE FARDAS


Era uma vez uma vez, que seria a dos pobres. Dos ditos excluídos e desamparados. Porque era uma vez uma voz, a da "bola da vez", que nasceu no seio da falta de vez e voz e rompeu a muralha dos donos do silêncio popular. Era uma era, a de quem não via a hora de ver a pátria mudar. Não para outra pátria, mas de postura e realidade. Uma era de quem por ora sonhava aplacar a ira da fome de justiça, igualdade e pão. Cidadania.
Mas era mais uma dessas horas que a ilusão não faz. A voz da veia de quem renegou a vez e se rendeu a vós sabeis bem o quê. Voz com que os nossos avós e ainda os mais antigos sonhavam. E assim fizeram, de todos nós, herdeiros tontos da crença no ser humano que alcança o poder. E era uma vez o sonho desse "venha a nós" de vez em quando. Continuamos no "seja feita a vossa vontade" sem nenhum retorno em nossas esperanças.
A voz, que no fim das contas não foi da nossa vez, calou-se no turbilhão das vantagens pessoais. Das chantagens partidárias. Dos deslumbramentos e da preguiça... Preguiça essa, de sacrificar-se tantas vezes quanto necessário, em razão de tantas vozes que mais uma vez se calam...

MULHERES GUARDAM LUGAR

Embora sonhem com eles, as mulheres não gostam de homens muito cordatos, delicados e solícitos. Como amigos sim, mas não como homens. O problema é que essas características, segundo o machismo de nossa cultura, pertencem exclusivamente às mulheres, e elas, quando voltarem a ser essencialmente elas, cansadas de pagar o preço de sua revolução social, certamente reclamarão de volta essas qualidades. Sendo assim, será bem mais fácil consegui-las se não estiverem ocupadas.

ROMBO AFETIVO


Flutuamos no caos do que um dia foi sonho,
carregando este peso da esperança morta;
somos farsa enfadonha insistindo nos flancos
do cenário e da porta pra tempo nenhum...
Nada mais nos carimba como passaportes
pra romper as barreiras que o seguir impõe,
são mais fortes que nós os entraves do rumo
que nos faz recuar, cada um para si...
A distância entre nós ludibria o que vemos;
os momentos de amor são miragens na poça
desta nossa ilusão que preservou a lama...
Insistimos na história já depois do fim, 
só nos falta ceder à vertigem do tombo
neste rombo afetivo que há muito se abriu...

ARTE AUTOSSUFICIENTE

A obra de arte autêntica é aquela que provoca o discurso por si mesma. Nos casos em que o discurso emoldura e autentica a arte, o mérito é do discurso... não da arte.

PARA SEMPRE SEMPRE


Meu olhar vai ao fim do que desde o começo
já é fato que ronda por dentro de mim;
minha vida é de adeuses, os deuses não podem
desfazer o destino que os próprios traçaram...
Quando chegas te vejo saindo acolá,
sou feliz reservando este choro futuro,
porque vivo da hora e não faço pirraças
que fariam das graças momentos menores...
E por isso te beijo tal qual indigente,
cravo dentes ferozes em tuas porções,
te possuo com pressa de bicho acuado...
Sorvo toda a tu´alma por este canudo,
nada menos que tudo me deixa feliz,
cada vez é pra sempre nesta possessão...

terça-feira, 6 de março de 2012

CIDADÃOS INSUSTENTÁVEIS


Irimar trafica pássaros, cobras, peixes e aranhas... Mata onças, jacarés, elefantes e outros animais para vender couro, marfim ou qualquer parte que lhe renda um bom dinheiro. Também não hesita em matar pessoas que ameacem seu negócio. Há quem afirme que ele contabiliza quase tantas mortes humanas quanto de bichos.
Sabe-se que Irimar iniciou sua carreira criminosa na infância, quando caçava borboletas para espetá-las em molduras. Prendia calangos em arapucas e os deixava morrer de fome. Arrancava as asas de libélulas, dissecava sapos ao seu modo, para se divertir, e praticava outras "maldadezinhas" que os pais achavam normais e até criativas, com as espécies disponíveis. Inclusive as de suposta estimação.
Carreira de sucesso. Começou a colaborar com a insustentabilidade planetária bem pequenino, e com bichos pequeninos, contando com o apoio dos pais; a indiferença da sociedade; todos os acessos para progredir como "exterminador do futuro". Agora é um dos grandes aceleradores do processo de possível extinção da humanidade, a partir do ambiente que a cerca.
O meio ambiente, que já é de fato meio, ao pé-da-letra, está cada vez mais longe de quando foi um ambiente inteiro. Graças (ou desgraças) a parasitas reais, como o personagem Irimar, que se multiplicam feito pragas... pragas que realmente são, inclusive com a conivência de parte do poder público e da cegueira da justiça, quando lhe convém ser cega... Até quando acharemos também conveniente o nosso silêncio?

EM PÁSCOA


Que o seu coração 
esteja em páscoa...
Páscoa consciência,
páscoa vida,
páscoa família
e consigo mesmo...

INSÔNIA NOSTÁLGICA


Quero doces cobertos de açúcar cristal;
muito sal na pipoca e gordura no churro;
jogar pique pra burro, empinar um catreco,
entornar um caneco de Crush ou grapette...
Fazer barco e gaivota, estalo de papel
ou apenas bolinha (e jogar no colega),
pôr alcunha na "tia", no inspetor de alunos,
dar rasteira no Bruno e levar do "seboso"...
Ganhar bolas de gude nas minhas trapaças;
desenhar moças nuas e babar por elas;
imitar as novelas na Ceiça e na Jô...
Gritarei "eita sô" sem qualquer cerimônia,
vencerei esta insônia e serei um garoto
que não passa do broto; que brinca e sorri...

MALÍCIA ORTOGRÁFICA


Pra não se sabe até quando
tardar a própria extinção,
tem muito hífen pensado
em se forjar travessão.

EDUCAÇÃO ANTIEDUCATIVA

Recebo do professor Edivaldo – Vila da Penha - RJ – o seguinte e-mail: “Caro Demétrio; percebo em maioria de seus textos uma grande preocupação com as questões éticas que envolvem o educar. Vejo que você tem visão ampla no que diz respeito ao comportamento dos jovens de hoje e também dos que o educam. Mas quero lhe passar a impressão horrível que tenho de uma escola em que se estabeleceu entre funcionários de ponta e demais funcionários, uma espécie de sistema de castas. Para o grupo de ponta (e aqueles que o seguem, obedientemente) existem claros privilégios no que tange o tratamento em geral: Refeição diferenciada, talheres separados, água em copos especiais etc., tudo assistido pelos “meros professores”, demais funcionários e os alunos, que certamente veem tudo isso com olhos críticos. Um mau exemplo de separatismo e ostentação de hierarquia justamente onde se deveria aprender o contrário. Gostaria de saber o que você acha desse comportamento anticidadania. É complicado para você, comentar a respeito?”.
Não, Edivaldo. Não tenho qualquer problema em comentar publicamente esse assunto. Primeiro, porque nunca vi esse tipo de prática na escola em que trabalho. Aqui não existe essa ostentação de hierarquia. Segundo, porque as diretoras desta unidade (a Angélica, a Ângela, a Regina e a Márcia) são educadoras comprometidas com a democracia. Além disto, são profundamente religiosas, e como tais, não praticariam atos semelhantes, que pecam contra a igualdade entre e os seres humanos, a ética e a cidadania.
O que o escandaliza é muito mais comum do que se possa imaginar.  A sociedade em que vivemos é assim, e isto se reflete nas fábricas, nos supermercados, nas igrejas, nos presídios e outros estabelecimentos, como em algumas escolas. Algumas, porque a maioria já entendeu que escola não é lugar de separatismo, preconceito, ostentação de privilégios e anticidadania. Trata-se de um lugar em que se deve justamente lutar contra isso, mostrando aos jovens, adolescentes e crianças que o mundo é muito melhor sem essas besteiras que mancham as relações e resultam guetos; desigualdades sociais; ódio; guerras; sentimentos negativos que transformam a vida em sociedade num paiol de conflitos de todas as sortes.
Tentar educar um jovem num ambiente em que ele assiste o contrário de tudo que um educador deve repassar não só de disciplina formal, mas de lições de vida, é como um pai tentar dizer ao filho que não deve gritar palavrões exatamente gritando um palavrão. Ou ensinar a não roubar com palavras, enquanto rouba de alguma forma disfarçada, enrustida, de sorte que a sociedade não perceba ou feche os olhos. Até mesmo o fato de os educadores de sua escola aceitarem essa situação depõe contra o grupo diante dos alunos. Eles veem que são educados por pessoas acomodadas, que aceitam ser tratadas como seres inferiores e indignos. Neste ponto, aprendem a ser também pessoas que se auto-excluem ou se revoltam contra a sociedade em um todo, com práticas que ferem essa sociedade.
Mas não brigue, Edivaldo. Arranje uma forma de educar esses educadores tortos, com muita didática. Faça de conta que eles são as crianças ou jovens que você tem em sala de aula e tenha muito tato. Eles aprenderão com você e alguns colegas seus, que compartilham de sua indignação. Você deve saber que existem colegas quietinhos, mas que também gostariam de fazer parte do grupo dos privilegiados, que não hesitariam em prejudicá-lo para isso. Ninguém sabe, na verdade, quantos são os que não aceitam, lá no íntimo, esse tipo de comportamento.

EUGÊNIO?


 (Comentando um comentário de Frederico Silva)

Classificar como gênio da literatura um escritor que as mídias de ponta não puseram no topo desse grupo é um tanto arriscado. As coisas estão todas arrumadinhas, em seus devidos lugares, e quem as desarruma pode sofrer sanções retaliativas. Acho, por exemplo, que o Deneir é um gênio das artes, mas às vezes me rechaçam, indignados, como que mandando esperar que o mercado formal o reconheça primeiro. Antes disso é proibido nominar gênios. As grandes mídias já o reconhecem como um  dos grandes, mas daí para uma "canonização" pública obrigatória há muitos passos por se cumprirem. Um deles é morrer. Por falar nisto, esqueci a morte. Como pode me chamar de gênio da literatura, se ainda vivo?
Está "escrito" que o rei do futebol é o Pelé; o da música brasileira é o Roberto Carlos. A dama do teatro brasileiro é a Fernanda Montenegro, por mais que eu julgue a Dona Laura Cardoso essa dama. Dizê-lo em público pode me condenar ao purgatório, porque isso também já foi arrumado, como está resolvido nos países cristãos, que o salvador da humanidade é Jesus Cristo, o que não discuto, até mesmo porque vivo num país cristão. A verdade é que ninguém foge aos clichês impunemente, e sua afirmação a meu respeito pode lhe render alguns dissabores, ainda que não haja consequências drásticas, pois os que mandam nos rótulos julgarão brincadeira. Ou levarão na esportiva, para estar antenado com o mundo dos clichês.
De minha parte, fico lisonjeado porque sei, no fundo da indisfarçável vaidade, que suas palavras são sinceras. Deixarei o comentário exposto, denunciando sua ousadia para desarrumar. Afinal, só um gênio tem coragem de classificar como tal uma personalidade obscura; que o país desconhece. É um quadro abstrato e caótico aos olhos de quem segue pelas retas, nunca esperando revoluções. O que me resta é respeitar a bagunça e conferir, para ver se cumpro os requisitos básicos da rotulação... Se estou morto, por exemplo.

POEMA AO MOLHO PARDO


Sangro versos pisados tingidos de pus,
tenho peso de cruz nestes ombros arcados
e não sei a que venho nem aonde vou,
muito menos quem sou sob a velha estadia...
Sei que sangro estes versos cobertos de breu,
mal passados no fogo de minhas angústias,
sou a carta marcada na mesa do jogo
autuado em flagrante com voz de prisão...
Descartado e sozinho me deixo sangrar
entre versos anêmicos; pálidos; tristes;
desaguar no vazio de pautas quaisquer...
Vêm do corte profundo nas veias da entranha
estes versos manchados de vida e de mundo,
molho pardo sem sal nem condimento algum...

RECICLANDO A RECICLAGEM


O direcionamento que a mídia tem dado à questão reciclagem, nos últimos anos, com ampla adesão dos mais diferentes grupos sociais, em especial as escolas me deixa temeroso. Vejo em tudo isso um grande jogo para a manutenção das indústrias de embalagens, que infestam cada vez mais o meio ambiente e alimentam a correria dos famintos às lixeiras domésticas e aos lixões, enquanto os empregos dignos continuam escassos. Incluídos na mesma correria estão os jovens estudantes, que são orientados por seus professores a catar embalagens nas ruas, valas, rios e becos, para a realização de trabalhos que se pretendem didáticos, educativos, mas que funcionam de formas distorcidas e viciadas.
Deploro a reciclagem como recurso de acomodação, aceitação e adaptação da miséria. Não aceito que se diga à criança que a sua falta de brinquedos pode ser suprida por um carrinho de latas de leite em pó. Leite que ele mesmo possivelmente não consome, porque é muito pobre. Também rejeito que se ensine a essa mesma criança que a casca da batata é mais nutritiva do que a própria batata, com a intenção de fazê-la perceber, com alegria, que a casca da batata de seu vizinho mais abastado, que jamais comeria a casca, pode matar sua fome.
Sempre reciclei. Na infância, por pobreza, e isso ninguém me ensinou. A pobreza em si já me levava a fazê-lo. E não era uma alegria reciclar por isso. Era sim, uma tentativa de amenizar minha dor pela falta do essencial para suprir minhas necessidades de alimento e diversão. Apenas quando cresci, já trabalhava e podia consumir (o que é o requisito básico da cidadania), foi que descobri o prazer de reciclar como recurso de arte, criatividade e preservação ambiental. Isso me deu um novo contexto. Uma visão muito mais ampla e formidável do que é reciclar com alegria.
Não vejo vantagem alguma, quando me dizem que o Brasil é um dos países que mais reciclam, porque sei das condições em que se recicla no meu país: Quem consome joga fora de qualquer maneira, porque não tem educação, e logo as embalagens pet, as caixas de leite longa vida, os papelões e outros rótulos estão nos bueiros, nas valas, nos rios e lixões sem tratamento, à disposição dos catadores. Dos miseráveis, que também aproveitam para comer os restos de comida que lá encontram, e até dos estudantes que as escolas põem nas ruas à cata de peças imundas que depois serão trocadas por computadores e impressoras para tais escolas (e ninguém venha me dizer que de alguma forma serão também dos alunos), o que classifico de trabalho infantil. Um trabalho que expõe esses estudantes ao risco de doenças infectocontagiosas.
Um país ideal será aquele no qual nenhum ser humano precise chafurdar no lixo em busca de sua sobrevivência. Um país onde o povo, com poder de consumo, separe criteriosamente o lixo; os profissionais remunerados de limpeza urbana o recolham e as indústrias de rótulos refabriquem, sem que essa trajetória tenha passado pela triste rotina dos catadores de lixo. Uma história de reciclagem sem miséria. Será que desta forma o Brasil ainda estaria, hoje, entre os que mais reciclam?
Se reciclarmos apenas por arte, criatividade e lição de preservação ambiental não será necessário procurar lixo nas ruas. Temos em casa o necessário: Garrafas, latas, caixas de fósforos e outras embalagens devidamente limpas, pois ainda não se infectaram. Se somos educadores e faremos trabalhos com alunos, peçamos isso a eles: Que tragam de suas casas embalagens limpas, recém-usadas, em quantidade suficiente para tais trabalhos; não para depósito e uso posterior.
Também há que se observar que a reciclagem ideal, para reaproveitamento da indústria, é aquela em que se guarda a embalagem exatamente como é, bastando amassá-la ou comprimi-la, pondo-a depois em separado, para a coleta pelos profissionais de limpeza urbana. A samambaia artesanal feita de pet, por exemplo, dificilmente será reaproveitada pela indústria. Seu destino será mesmo poluir o meio ambiente. 
Em suma, no que tange a questão reciclagem, creio que precisamos nos reciclar.

SEM GREVE DE FAMA


Famosos protestam sempre contra o assédio excessivo da imprensa e da massa tietacional. No entanto, o grande paradoxo desses protestos é que eles são feitos exatamente nos maiores órgãos de mídia; os mais massificados; dirigidos em especial às camadas mais ávidas por celebridades.
Os falsos movimentos pela privacidade são, coincidentemente, liderados por ídolos falastrões e não poucas vezes com as carreiras em leve declínio. Visam claramente o contrário do que afirmam, vociferando nas rádios, nos programas dominicais de auditório, revistas de fofocas e colunas deslumbradas de jornais consumidos pelo povão.
Não há entre os famosos qualquer campanha do tipo Fama Zero, com um breve afastamento voluntário da mídia. Famoso algum se dispõe a fazer uma greve de fama, porque pode funcionar e não é isso o que ele quer... Pelo menos o famoso que se superexpõe, alegando ser contra a superexposição.

ANTISSOCRATISMO

Tudo que sei é que sei alguma coisa. Se não soubesse não estaria em sala de aula... Ou estaria, mas não ensinando, e sim praticando falsa ideologia.

FILHO PRETERIDO


Se há três ou mais irmãos em uma casa, é algo bastante vezeiro haver uma predileção paterna e/ou materna. Lamentável, porém comum. O que diminui a frustração dos restantes é a solidariedade que nasce da indiferença. Não há solidão, porque esses restantes têm um ao outro e acabam lucrando afetivamente, mesmo não tapando por completo o burado deixado pela exclusão compartilhada.
Novela recentemente concluída, A FAVORITA - Rede Globo de Televisão - levantou uma questão oposta e bem mais cruel do que a preferência. Entre as três irmãs de uma família bastante simpática, uma era preterida. Cida foi renegada pela mãe, que era toda mimos para as demais. A razão se revelou no fim da trama, com uma reconciliação que raramente ocorre na vida real, pois a mãe ou o pai que prefere ou pretere um filho quase nunca reconhece ou assume. Quando o faz, apresenta sempre uma justificativa esdrúxula que nem de longe corresponde à realidade.
A solidão de um filho preterido é irremediável. Ainda que ele goze de um ambiente amistoso com os irmãos, não há quem sinta com ele os efeitos desse abandono afetivo. Ninguém compartilha o seu sentimento nem há como estabelecer uma rede segura de solidariedade, pois os filhos não renegados têm uma dívida natural de gratidão que dissolve qualquer espírito de inconfidência pela qual perderiam seus privilégios. São neutros por conveniência.
Não abordada pela novela, existe ainda uma face dessa questão que agrava sobremaneira os traumas e complexos do filho preterido. É a união dos privilegiados, que acabam também preterindo o irmão. Visam mais e mais o prestígio com a mãe ou o pai, e isto se torna um concurso interno por níveis de preferência, que exclui por completo quem já não tem mesmo chance alguma. São inúmeras as famílias portadoras desse câncer que rói as relações.  
Em suma, não é somente a sociedade externa que podemos classificar como selva. Este chavão é bem aplicável nas famílias. Pelo menos em grande parte, formando esta a sociedade com os reflexos e vírus de conflitos incontáveis que tornam o mundo pior.

SÃO JOÃO


Roceiros de araque
na festa urbana de roça.
Capital de junho.

MILAGRES DO CARNAVAL 1


Um Hitler mulato.
Alegoria, alegria
sambando no asfalto.

DOCE FARRA


Meninos melados...
Carambolas e "carambas";
doçura e prazer.

domingo, 4 de março de 2012

PRECONCEITO SANTO


Quando publiquei em algumas comunidades literárias o soneto SULTÃO DOS MARES, no qual estabelecia um romance com a sereia Janaína, que enciumava Marabô, Oguntê, Inaê, Oloxum e Sobá, e evocava a intervenção pacífica de Iemanjá, na verdade fiz uma estatística. Desejava saber o índice de queda do número de pessoas que me visitam sempre. Sei exatamente qual é o preconceito que move uma grande massa, em todo o Brasil. É de cunho religioso e racial. Estabelecer um mote utilizando figuras lendárias ou mitológicas com nomes de origem africana mexe com o imaginário de um número cada vez maior de fanáticos institucionais e racistas. Janaína e Iemanjá, em especial, remetem às crenças africanas ou de origem. Há quem creia nelas como entidades divinas, o que deve ser respeitado, e há quem as tenha como um ícone de nossa cultura que envolve superstições e crendices que não ferem nem danificam nossa mente, nosso espírito e a moral, muito menos o corpo. Pelo contrário, enriquece e não nos deixa afastar de nossas raízes hoje tão renegadas e temidas.
Como tudo isto lembra nossas raízes, evidentemente faz recordar que nosso berço é negro, a África é a mãe da humanidade, e as correntes religiosas de raízes européias e norteamericanas querem nos afastar dessa consciência (e estão conseguindo), visando unicamente o poder sobre o homem. Querem dominar, e para tanto, é necessário que apaguem da memória de todo o mundo, qualquer lembrança de que um dia o continente africano foi a potência que todos querem ser, com o risco de voltar aos seus bons tempos. É difícil para pessoas simples e desarmadas, de boa fé, perceber as questões políticas que envolvem as guerras religiosas (frias e bélicas) em todo o mundo. Cada pessoa que passe a odiar a África a partir de sua cultura, sua religiosidade e cor, passa a ser mais um aliado nessa guerra contra a essência de nossa identidade. A ignorância que advém do sucesso das lideranças religiosas com base no poder e no preconceito é tanta, que seus seguidores nem querem se aculturar, temendo as "influências malignas" em suas vidas dominadas pelo medo do inferno e da "mão pesada" de um Deus que a "branquitude oficial" criou para os mais espertos e vende para os mais humildes por um alto preço em espécie, subserviência e delegação de poder ilimitado.
Só acho uma pena que poetas e prosadores, pessoas ditas tão esclarecidas e de mentes amplas, arejadas, não tenham conceitos próprios a respeito dessa questão. Não procuram ver tudo isso com olhos despojados de influências. Desarmados de temores infundados. Livres desse pavor de um Deus que, se existe, estebelece (como os livros ditos sagrados rezam) uma igualdade universal. Será que a religião é contra o saber? Será que o saber ameaça a religião? Será que o grande pecado do suposto Adão foi expor esse Deus ao medo
de sua bagagem de conhecimentos? É preciso que cada um comungue sua fé, o que respeito de todo o coração, mas que cada pessoa seja ela mesma, sem temer o conhecimento, a ampliação de seus horizontes e universos e, principalmente, a força do mal em sua vida. Creio que dê para cada pessoa estabelecer um parâmetro pessoal, para não se alienar do mundo e se tornar um brucutu. Um homem contemporâneo das cavernas.

POEMA POLUENTE


O meu ar poluente vai ao céu
E destrói a pelica desse azul,
Norte e sul se confundem sob a cinza
Do meu cinza impossível de sondar...
A tristeza derrama o seu efeito,
Minha sombra desenha o fim dos tempos;
Tempos gastos com sonhos, esperanças
Que desmentem seu fundo cor-de-rosa...
Sou a bomba em silêncio nuclear,
A mudez da explosão que rói o mundo
Sem um olho que veja o que acontece...
Vou mais fundo que as asas podem ir,
Numa rota sombria sem futuro,
Pelo escuro de tudo que se foi...
Meu poema polui o seu olhar,
Seu olhar dissemina o meu poema
Sobre todas as auras desse espaço
Que não faço questão de preencher...

NOSSA SEM HORA


Que horas são...
São horas
de oração?
Ora... São
quaisquer horas
as de oração...
Então façamos,
minha senhora,
esta oração
a nossa sem hora...

PANOS DA HIPOCRISIA


Casamento reatado é uma calça velha que a cada dia rasga num ponto diferente. Jamais será outra vez inteiro, e com o tempo, não haverá remendo que fique. Restará aos cônjuges expor a bunda prá sociedade que sempre soube da realidade escondida nos panos gastos da hipocrisia.
Afinal, a sociedade é justamente o retrato dessa forçação de imagens que não correspondem ao seu perfil. Em suma, equivale a dizer que todos escondem de todo o mundo o que todo o mundo esconde de todos. Um círculo vicioso.

FALANDO GREGO


Uma história de partes mal dispostas,
tramas tontas, enredo sem consenso;
um mistério que abusa das respostas,
louco além do que sei (ou do que penso)...


Meu caminho tropeça neste lenço
com que venho perdido nas propostas
dessa paz que me deixa insano e tenso;
medo atroz que me toma e corta em postas...


Uma vida que nega o seu sentido,
sonho a sonho desfeito e desmentido
na moldura com tela de promessas...


Ando a esmo sabendo que não chego,
meu discurso de alguém que fala grego
nega e sabe que o mundo prega peças...

SULTÃO DOS MARES


Pedirei Janaína em casamento;
Marabô me perdoa essa desfeita;
Inaê já deixou de xingamento,
Oloxum até anda satisfeita...


Se Caiala pensou ser minha eleita;
Oguntê ou Sobá; pergunto ao vento
em que ponto falhou a tal receita
de fazer entender meu sentimento...


Quando achei que ficava tudo bem,
chegam cantos das águas muito além;
trazem dores, lamentos e pesares...


Horizonte se agita e perde a linha;
só me resta pedir à mãe-rainha
pra levar sua paz aos sete mares...