segunda-feira, 30 de abril de 2012

FELIZ NATAL?

O amor está nas lojas. Tem de todas as cores, modelos, utilidades e preços... Preços ótimos! Amor a partir de “um e noventa e nove”, para quem não pode fazer declarações mais caras; amor de cem reais, duzentos, mil, até milhões... Já pensou, declarar um amor de milhões de reais? Talvez de dólares? É o natal que está chegando... À sua frente, chegam os ares que se refletem no ensaio de cada olhar, cada braço, voz... Pessoas mudam ou sofrem mutações, para o desempenho da trégua natalina, que vai até o trinta e um de dezembro. Chega o dia de amar o inimigo, para desamá-lo de novo no comecinho do próximo ano, que já será velho no dia dois ou três. Data de perdoar os que nos ferem, porque passa rápido, não custa nada ou quase nada, pois logo poderemos desperdoá-los.
À nossa volta o apoio das lojas, que tornam o amor democrático. Pobres e ricos podem amar, no natal, pois existe amor para todos os bolsos. Há um sentimento forte no ar comprimido pelas axilas que se cumprimentam no silêncio ruidoso das compras. Das caixas registradoras. Até mesmo dos pregões que incentivam esse sentimento, balançando os artigos bregas ou de luxo que têm a tarefa de pescar sorrisos, palavras e reciprocidades em formas de outros presentes... Outras demonstrações embaladas por papéis coloridos e seladas por cartões que registram palavras previsíveis, criadas e impressas por quem não conhece os seus compradores... Mas as mensagens são universais. Servem para qualquer um, nessas datas. E aceitam complementos de quem quer enfeitar um pouco mais.
Nas marquises e viadutos, há os que não podem comprar o amor... Dar nem receber. Nem aquele mais baratinho. Também não podem comê-lo nas formas vistosas de pernis, farofas, rabanadas e outras guloseimas. Nem bebê-lo, nos vinhos e champanhes que se revezam em taças.
Mesmo assim, feliz natal para todos! Para quem pode ou não, afinal, o natal é um grande teatro! É o espetáculo fabuloso que demonstra o ser humano em sua inexistência ideal, íntima, projetada no inconsciente relutante! Na fraqueza universal de criaturas que disputam espaço em um mundo cada vez mais concorrido! Essa disputa se acirra no natal, quando o amor é medido por dar e receber, excluindo os que não podem entrar nessa democracia para a qual não nasceram os indigentes, porque esses perderam há muito tempo. Perderam pra mim e pra você, o que lhes era de direito.

ROBOTIZAÇÃO

Desliguei os sentidos, calei sentimentos,
revesti meus instintos de gelo e neon,
para ver se propago a mais fria das calmas
em um riso sem alma, entretanto sem dor...
Foi urgente me armar da fachada que trago,
desenhar este lago na folha do rosto,
ser a placa de anúncio da minha leveza
e vender mais barato emoções de festim...
Já não dava pra ter os arroubos de afetos
que acendiam fogueiras por todo meu ser,
me tiravam de mim quanto viam por bem...
Precisava vencer esse vício da entrega,
esse amém a chamados de paixões insanas;
explodir essa regra de minha fraqueza...

NATUREZA URBANA

Apesar do implante de solidariedade
que a cidade às vezes emergencia,
isso é via de acesso pontual...
Um instante no todo que nada muda...
... Há um dane-se fixo em cada semblante.

SACRIFÍCIO?

Se você mede o seu sacrifício, comparando-o com o de mais alguém na lida por um ente querido enfermo, isto quer dizer que o ente não é tão querido... pelo menos por você.

DE FAMÍLIA E SOCIEDADE

Em todo conglomerado de parentalha (condomínio ou terreno destinado a moradias de familiares) existe aquela casa que ninguém respeita. É a casa em que todos entram a qualquer hora, convidados ou não. Aquela cuja tomada e torneira externas são usadas por todos como recurso de economia para quase todos e, finalmente, aquela em frente a qual se faz toda a sujeira do dia a dia. Um exemplo disto são os cocôs dos cachorros que aprendem, em tempo recorde, o caminho para o jardim da única residência sem cachorro, porque seus moradores optaram por não causar esse dano aos demais. Aliás, pior do que os cocôs é a invasão posterior dos que resolvem se munir de pás, vassouras e sacolinhas, para continuarem constrangendo os moradores da casa que ninguém respeita, com mais uma longa vasculhada na privacidade já corroída.
Copiando a própria sociedade externa, isso tem muito a ver com posição social. Forma-se uma sociedade privada na qual o menos favorecido é o mais prejudicado. Quero dizer que as casas que ninguém respeita são exatamente as dos menos favorecidos nesses conglomerados. Os que menos contribuíram financeiramente para a construção do todo, ainda que tenham participado como pedreiros ou serventes; os que têm os empregos menos apreciados ou enfrentam desemprego; os que têm sempre as participações mais modestas nos rateios em datas festivas, nos assuntos de doenças dos patriarcas ou matriarcas dos meios e nas obras de reparos gerais. Esses não têm direito a queixa, privacidade, respeito, explicações. Os seus históricos não os favorecem. São fichas sujas no SPC do clã. Marginais irremediáveis que podem se ferir muito, caso quebrem o silêncio.
Na verdade, não falo de uma situação incomum. Em toda a sociedade mundial e nas subsociedades que a sustentam é assim: Nas casas, nos ambientes de trabalho, nas igrejas e demais irmandades, nas associações, clubes, sindicatos e outros ajuntamentos. Até mesmo nas patotas dos meninos de ruas e nas organizações ou gangues criminosas. Neste aspecto, a ferocidade gerada pelas diferenças sociais, ainda que mínimas, levam o ser humano a situações de superioridade ou inferioridade que geram discórdia, subserviência, tirania, ódio, medo, injustiça, gueto, fome. Levaremos ainda um tempo inestimável para nos distanciarmos, em caráter, dos predadores selvagens. Precisamos nos tornar de fato superiores aos ditos animais irracionais, o que requer muito avanço nos campos da ética, do respeito e da solidariedade.

DE ROUBO E MENDICÂNCIA

Não acho que pedir tenha sentido avesso ao de roubar, principalmente se quem pede grita o bordão de que uma coisa é melhor que outra. Esse bordão é a voz de assalto. O pedinte sabe que as pessoas dão por medo. Acham “menos pior” serem roubadas desta que da outra forma. É o tal do “pelo menos” que impregna a sociedade, a exemplo do “rouba, mas faz”, atribuído a políticos corruptos que geralmente fazem muita propaganda de obras óbvias e obrigatórias que realizam sempre superfaturadas.
Na verdade, não vejo honra em pedir, seja como for. É claro que me refiro ao pedir costumeiro, secular. Ao viver da piedade, do alívio de consciência ou do medo público. Quem vive assim imita os vermes, as ervas - de- passarinho e tudo o que encosta ou se escora no outro para subviver. Melhor que pedir é catar sucata para vender, é enfrentar o “rapa”, na praia, com uma caixa de picolé, uma bandeja de salgadinhos ou uma penca de óleos de bronzear de péssima qualidade.
Vou além, dizendo que pedir e roubar são crimes, na minha concepção. Ladrão e pedintes vivem do que é do outro. Esperam que o próximo trabalhe, conquiste honesta e dignamente o seu sustento, para dividir com eles que desprezam o trabalho. O agravante do pedinte é que ele tem preguiça até mesmo de apertar um gatilho ou bolar um projeto simples, mas sempre de algum risco, para furtar uma quantia ou algo de alguém, de alguma instituição ou do patrimônio público.
Em suma, o pedinte ameaça e não se arrisca. Tem a tolerância da lei que não proíbe. Gera incômodo, medo, piedade compulsória, e sempre mente para ser bem sucedido, o que se configura exploração da fé pública. Um crime não imputado, neste caso, pela ideia do não enriquecimento. Se me permitem, pedir é roubar... ou é pior do que roubar, porque o pedinte é aquela pessoa que desistiu de tudo, até mesmo de tomar da sociedade uma parte do que julga, equivocadamente, seu.

A CANTAR

Se você cobra
por tantos sapos,
pelos seus micos
e vira bicho,
eu fico inseto
sobre o que faço...
Mas deixe estar,
sei que não monstro,
no entanto pássaro
a minha vida
a cantar.

HABEAS ALMAS

Uma coisa terá de acontecer
pra minh´alma vencer este conflito;
pro meu grito abafado achar o vento
e fluir já não grito; sopro manso...
Algo além do que posso esquadrinhar,
até mesmo intuir ou precaver
pode ver as razões do meu anseio;
desta minha esperança desonrosa...
Sairás afinal da minha vida
ou da tua, se acaso for atalho
prá saída que o tempo tem que dar...
Prisioneiro de angústias intratáveis,
vivo ainda por crer em habbeas almas;
porque são degradáveis os embrulhos...

domingo, 22 de abril de 2012

CHUVA E SONHO

A chuva que agora lava o zinco encardido sobre meu casebre, põe estes olhos cansados e suplicantes na linha do infinito. Ela tamborila e resvala no telhado, numa espécie de ritual silencioso que envolve a brisa e me torna estátua momentânea.
Esses raios que riscam a distância e vão pousar nas montanhas que não vejo, hipnotizam minh´alma. São lampejos que acendem cá no íntimo, algum mundo secreto sonhado por meu ser. Um cenário que acompanha minha inconsciência desde a idade que foge ao poder investigativo que penso ter.
Extático, vejo da varanda esse vitral. É um show do cosmo, nessa  temporada fiel; compromisso anual da estação. Momento em que céu e chão se grudam; se amam. Sequer atentam prá insignificância de minha presença; plateia solitária.
O que eles não sabem é que nada quero além disto. Nada mais que o silêncio deste show e o bocejo que me flagra numa entrega solene... solene e livre... Um desejo de ficar para sempre nesta moldura... figurar na magia deste quadro.

UMA HISTÓRIA POR SE FAZER

Se depender da preguiça que nos possui, continuaremos latindo em vão contra as carruagens de ofício. Contra o vício secular daqueles que sempre tragaram as nossas vidas acesas por sonhos e anseios, que renascem das guimbas todos os dias, e voltam a sonhar.
Pela nossa covardia, levaremos eternamente as pedradas do mesmo silêncio para nossas perguntas lançadas ao vento. Para o momento a momento nesta eternidade que devora esperanças e nem mesmo as arrota ou regurgita.
Os ratos do poder se alimentam das mortes que nos acompanham; dos espinhos e cacos que lanham nossas almas tortas entre os corpos cansados de tanto abandono... Tamanho descaso que se repete a cada nova etapa, nova cara, novo mandato.
Esses ratos vencerão para sempre, se nunca fizermos não apenas algo, mas muito além de latir contra suas passagens. Seus passeios pela história vazia de quem a mereça por feitos dignos, capazes de mudar vidas; fazer jus aos sonhos de um país para todos.
O sonho é legítimo... Mas o sono pesado de nossa indignação atrai o caos. Precisamos acordar para o fato de que as mudanças sociais começam dentro de nós.

GOZO EREMITA

Solitário me caço entre a selva do quarto,
sem ligar prá beleza do quarto-crescente
que me chama lá fora num céu de viscose;
numa dose mais própria de sonho e romance...
Em um gozo eremita imagino seu corpo;
sua casca, seu carpo, a polpa suculenta;
suas ventas fogosas fungando em meu ombro;
meu assombro feliz por tamanho prazer...
Poderia sair, me tocar no quintal,
derramar os meus uivos no pano da noite,
rechear a penumbra de lavas e odores...
Mas a lua está frágil pra minha explosão;
prá fusão de sentidos que agora me tomam
e me fundem ao cio pra sermos um só!

HAVIA GENTE NO MEIO DO CAMINHO

Foram muitos os olhos que um dia julgaram
que a miséria visível seria mais forte,
minha sorte macabra já tinha o carimbo
de quem morre abraçado à certeza do fim...
As visões, os agouros, as más profecias,
os Messias nefastos, institucionais
ou de rua, de cais, de birosca e de casa
amputavam as asas; vetavam meus voos...
Mas olhei outros olhos; de amor e de apoio;
dos que sabem que o joio pode virar trigo
ao achar solo amigo, sincero e propenso...
Encontrei outras vozes, de alerta e verdade,
braços fortes de abraços, de mãos erguedoras
que ajudaram meus pés a recompor os passos...

quarta-feira, 18 de abril de 2012

FOGO FÁTUO

És poeira batida, estou limpo de novo,
recupero minh´alma e meus dias de vida,
pois não moras no sonho do dia seguinte
nem nos versos mais ágeis que agora componho...
Apodreces lá fora de minhas lembranças
consistentes, profundas, que valem saudades,
e não há nas andanças e novas procuras
as verdades passadas que vestem teu rosto...
Sepultei os olhares, a voz, o sorriso;
aticei meus abutres na tua carniça,
para ver se me livro até mesmo do cheiro...
Não me assombra, sequer, esse teu fogo fátuo,
quando flui no canteiro dessas nostalgias
que nas horas vazias me pedem pousada...

CACOFONICE CRÔNICA

Escapei do pior ao te deixar. É triste quando acaba assim o romance, mas foi preciso. Às vezes dá saudade. As folhas do meu álbum dão. Vejo as fotos e lembro que eras tudo: Minha vida, minha paz, os campos verdes de minha vida... ou a única gadinha desses campos que me fizeram tão feliz.
Estou só, no meu cafofo. Revivo as alegrias que este cafofo deu à minh´alma nas tardes de sábado. Ruminar nosso amor é como mascar alho; dá um gosto ruim na boca. Entretanto já foi pior, pois tudo tinha o teu cheiro; até o xampu tinha... e todas as mulheres do mundo pareciam ter o teu rosto.
Quase morri, ao dar adeus. Muitas vezes em meus delírios, vi Adão me chamado pro paraíso, e confesso: Quase fui. Mas uma espécie de fada me socorria. Brotava dos meus sonhos, essa fada, e por fim me convenceu a pôr radar na consciência, para retomar meu caminho... continuar a viver.
A esperança que me faltou por muito tempo, em mim abunda otra vez. Hoje sei quem és, bendigo a hora em que acabou-se tudo, e posso ver os sinais de falência que as amarguras que temi já dão. Sorrio de novo. Não quero mais carpir usando a vida que me sobra, de forma tão doentia.
Só agora sei o que aconteceu: Pequenino, empinadinho, rígido e com mamilos bem rosados.

ARROGÂNCIA

Quem é "o máximo", tem muito a melhorar... basta reconhecer que não é o máximo.

AMOR TECEDOR

Minha boca sabe que amordaça... A causa deste silêncio é a timidez. Também sinto que amortalha o corpo inteiro de angústia e pavor da solidão.
Apesar de tudo, este sentimento é contraditório... Quando mais dói, parecendo isuportável, percebo que amortece. Acalma o todo e sempre me faz querer um novo caso,se mais um se acaba.
Com seu conjunto indecifrável de nuances, o mais cultuado entre os sentimentos tem suas armadilhas. Amo e me deixo amar, mas não ignoro que amorfina, mesmo sem encerrar o ciclo da vida.
...Sempre haverá uma amoreira no meio do caminho, apesar da pedra, para reabastecermos o desejo e a esperança do amor perfeito; verdadeiro; eterno... Sem amorragia.

OCASO

Tuas fases forjadas não têm mais poder
sobre minhas vontades, os laivos de sonhos,
teus estágios de alguém se perderam nas vias
dos meus dias cansados de crer e buscar...
És mais um desses flancos deixados no tempo,
mais um passo entre os mancos de minhas mancadas,
múmia exposta no vácuo das lembranças gastas
do que hoje é passado, apesar da presença...
Teus letreiros agora estão luzindo a esmo;
propaganda enganosa e de pouco atrativo,
têm o mesmo contexto nos tons desbotados...
Não te vejo ao te olhar nos encontros de acaso,
pois morreste no fio daquele horizonte;
um ocaso impossível pra nova manhã...

PODER E MENTIRAS

Não consigo enxergar essa luz populista
enfiada no arroubo das falas de ofício,
residente no vício da velha linguagem
que os poderes comungam, mandato a mandato...
Vejo a cara comum, que a mentira mascara
nessas caras de pau que rebentam das urnas
e prometem até não fazer mais promessas,
prometendo, entretanto, milagres futuros...
Meu irmão assaltado rebate a notícia
de policia padrão, segurança eficaz;
há doentes demais refutando a saúde...
Minhas compras desmentem pesquisas compradas
por governos carentes de repercussões
que as ações não teriam como promover...

AO ALUNO EM DIA DO PROFESSOR

Pense comigo: Há uma horda (na política, na justiça e no empresariado) que todos os dias humilha, constrange, desconforta e pretere as pessoas mais simples deste país, entre as quais estão os alunos de escolas públicas, seus responsáveis e não muito menos os professores. Mas os professores acabam sendo aqueles que recebem a maior carga de negativismo gerada por essa realidade. São o pararraio do aluno revoltado com a revolta dos pais, que estão revoltados com o patrão, que está revoltado com o sistema econômico em constante conflito com a justiça. Tudo isto, sem contar com outros problemas do dia a dia, entre eles o desemprego, o acesso precário à educação, à saúde e ao bem estar geral.
Mas se você é um daqueles alunos "espertos", que não têm medo "mermo" de nada, pense comigo: É justo descarregar sua fúria, quase sempre legítima, reconheço, mas distorcida, exatamente sobre quem mais sofre com você, depois de seus entes queridos? Confesse para si mesmo que é covardia fazer de tudo para desmerecer, frustrar, inibir e até intimidar um professor, depois de ter baixado a cabeça para tanta gente que você teme, porque sabe que não tem o mesmo compromisso de amor, preocupação, respeito e ética por sua vida. Gente que não está ligando nem um pouco para o seu futuro, por exemplo.
Será mesmo revolucionário enlouquecer o professor e continuar beijando a mão de prefeitos, vereadores, deputados e afins, além de presenteá-los ano após ano com seu voto e seu prestígio? Acha que é realmente "brabo", só porque encara o seu mestre e amigo, mas lá no fundo sabe que não é ele o grande culpado de suas amarguras? Seria bom, para o seu bem, que todos queremos, repensar seus atos que pretendem atrair a atenção para conflitos que só poderão ser sanados quando a educação, produto oferecido com amor e rejeitado por sua mágoa, revolta e desconfiança for absorvido por todos, com plenitude. Não apenas pelos figurões dos poderes, para os quais tanto faz que você seja uma pessoa culta, informada e feliz ou não. Na verdade, quanto menos pessoas lutarem por isso, tanto melhor para muitos deles. Para quase todos, até.
Confesso que durante muitos anos também agi assim: Aceitava o preconceito das lojas onde nem era atendido, por causa do meu aspecto, e depois descarregava no professor. Punha sempre a cauda entre as pernas, quando um policial me revistava sem mais nem menos, e em sala de aula me exibia com desaforos, diante da preocupação e do desvelo quase sempre de professoras. Sofria injustiças da justiça, levava surras de meninos mais fortes que eu, e me enchia de forças para bancar o valentão nas aulas. A rua em que eu morava era escura, enlameada, com valas a céu aberto, bosta boiando e eu, já rapaz, continuava votando nos mesmos políticos, sem nunca ter tido coragem de cobrar deles nem de protestar veementemente contra suas falcatruas, mentiras e indiferenças.
No entanto, a mesma história na escola... o "marrento", o cara feia, o "destemido" contra quem nada podia nem queria fazer contra mim. Só a favor. Só pelo meu bem. Com a eterna preocupação de me ajudar a conseguir um futuro digno. E olhe que quando eu estava no antigo primário, no ginasial e no que hoje é o ensino médio, a escola era bem mais rígida; muitas vezes dura, mesmo. Mas sempre tive bons professores, e se acabava encarando um daqueles que punham fogo pelas narinas, baixava a cabeça, que assim funcionava o suficiente para saber que estava na hora do recolhimento de meus arroubos.
Pense hoje no professor como seu amigo. A pessoa que escolheu estar com você, quando podia ter concorrido a uma vaga na Petrobrás ou tantas outras empresas que lhe dariam, economicamente, muito mais retorno. Pense nele como uma pessoa abnegada, que tem o prazer de tentar conduzi-lo a um mundo melhor, mais justo, igualitário e humano. Alguém que divide com você o amor e a atenção que originalmente seriam só dos filhos, e não haveria tal divisão numa empresa fria, burocrática e voltada unicamente para o lucro e o avanço tecnológico.
Seja de fato esperto fazendo por si mesmo o que pode e mudará sua vida e a do país em que vivemos. "Sacaneie" os que não desejam vê-lo chegar "lá", onde estão, porque só querem para si, as riquezas; o prestígio; a fama; o conforto... a cidadania de que desfrutam, muitas vezes de formas desonrosas, anti-cidadãs. Faça isso estudando, preparando-se para olhar de frente, sem complexo e medo, de igual para igual, essa gente que nos trata como lixo e morre de medo da educação, da força que ela tem para mudar tudo. Para tirar o privilégio dos que se julgam, e de certa forma são, os donos do mundo.
É contra a injustiça, a desigualdade, o medo, a bandidagem, a corrupção, a falta de cidadania, o desprezo e a ignorância (tudo ítem do mesmo pacote), que você deve lutar. Você, seus pais, eu, todos os educadores, o povo em geral. Unidos contra os que hoje são os mais fortes, por causa do grande índice de analfabetismo e falta de educação, venceremos as bandalheiras do Brasil e do mundo, tornando-os dignos para nós, nossos filhos e as outras futuras gerações. Pense nisto, neste clima de dia do professor.

FIANÇA COMPULSÓRIA

Paráfrase é tábua de salvação. Autenticação compulsória dos célebres, arrebatada pela insegurança de autores que reconhecem vagos ou incompletos os seus textos. Quem parafraseia não faz além de buscar arrimo, adereço e/ou aquiescência quase sempre daqueles que já não são refutados, porque morreram... e tendo morrido, ganharam reconhecimento eterno como imortais.
Os parafraseados quase ou nunca faziam o mesmo, porque eram autossuficientes; seguros do que escreviam. Tinham certeza que seus escritos valiam por si só; não precisavam do empréstimo nem da fiança de outros nomes. Se algumas vezes foram preteridos ou criticados, eles próprios se bastavam, deixando o reconhecimento público para a posteridade. Posteridade que chegou e se confirma, na republicação em massa e série, de suas obras, e no poder desfibrilador que atua sobre textos e discursos nascidos quase mortos, mas que muitas vezes ganham notoriedade.
Quem se utiliza do recurso, busca uma co-assinatura; um bote que não permita o naufrágio de seus argumentos não raramente rocambolescos; repletos de palavras e efeitos pseudo-eruditos, como vem sendo este parágrafo. A paráfrase nada mais é do que a obturação do texto precário... ou precariado. Isto não foi uma paráfrase.

APESAR DE PISADO

Insisto; logo, existo... desistir seria desexistir.

segunda-feira, 16 de abril de 2012

VELHA DESCONHECIDA

O teu corpo sem alma perdeu expressão
pros meus olhos que outrora não viam mais nada;
hoje minha emoção desconhece teu rosto
nessa cara lavada que um dia beijei...
Quem morou em quem és é distante pra mim,
derreteu entre a casca, evaporou no vento,
ganhou fim onde a vida exigiu transparência
e cobrou sentimento mais sóbrio e profundo...
Tua voz hoje arranha; perdeu melodia;
soa gasta e tardia, sem dom de prever
minhas conchas carentes de acústica sã...
A saudade que sinto é de sentir saudade,
foste minha verdade mais falsa e volúvel;
minha crença mais vã; meu prazer mais vazio...

À SOMBRA

Cavo a minha esperança inconsumada nesses flancos de um povo esperançoso. Um povo que acredita a partir do nada, ou por bem pouco, mas considera justo esse cair e se reerguer cada vez mais ferido e longe de seus ideais. Encanto-me sempre com o encanto popular, que se renova no engenho das fontes fraudadas, das promessas falidas desde os lábios e da malícia de quem encanta a população.
Creio mesmo é na crença dos que seguem, apesar dos motivos forjados e parcos. Motivos pintados de quimeras e espetáculos que nublam suas visões e os faz sorrir pelo que logo depois os fará chorar. Vivo à sombra dessa vida que move os simples e remove suas angústias ao menor sinal de um dia melhor. Contagio-me desse otimismo ingênuo, porém vital, de uma gente cujos bens estão todos no imaginário; na surrealização de seus desejos ou abstração de seus sonhos.
Tenho fé nessa fé que se nutre de restos e parece mais forte a cada frustração. É no sonho dessa massa que monto a minha cama e durmo o sono de quem deixa estar. Não sei do que seria de mim, sem esses que de fato não sabem o que será deles, mas entregam tudo nas mãos da sina... ou de quem chamam Deus. No fundo, endeuso essa gente. Louvo-a pelo seu poder diário de superação.

PIRATARIA HUMANA

Não copie Pilatos; não lave as mãos para a injustiça. Pilataria é crime.

SOBRE O PERDÃO

Nem sempre o perdão é sinônimo de mágoas passadas. Mesmo assim é gratificante perdoar, pois o íntimo se torna um rio de mágoas calmas e cristalinas. Em suma, o perdão liberta o perdoado e despolui o perdoador.

FEITO FLOR

Seja lá
como for,
seja como flor:
Até depois
que se for,
faça alguém feliz.

quinta-feira, 12 de abril de 2012

MEU INSTINTO ASSASSINO

Quando me sentia vencedor volta o zumbido, e com ele, a mosca verde. Com ambos, a minha fúria incontida que já quebrara um copo e derrubara também os badulaques de sobre uma cômoda.
Bicho nojento. Vai lá na rua, pousa nas bostas de mendigos e cães, e vem tirar meu sossego; acender minha raiva. Lanço mão de um pano velho e saio batendo a esmo, vociferando alto, como se ela entendesse. Aliás, acho até que de fato. Entende mesmo. Dribla os golpes, faz piruetas, paira e faz um rasante... zomba do meu show.
Geralmente, sou pessoa de paz. Não discuto; não brigo; não faço greves, protestos nem passeatas de qualquer natureza. Mas a mosca, maldita mosca, sempre me põe do avesso. O pior de quem sou, a minha parte assassina, o que a danada consegue arrancar de mim é medonho; assustador. Peço até o seu sigilo, para ninguém mais ficar impressionado comigo.
Imagine você, que depois de alguns minutos intermináveis de peleja e fúria, desejo insanamente que a mosca seja uma pessoa. Se assim fosse, matá-la-ia enforcada, fazendo-a estrebuchar e se arrepender. Após matá-la, ficaria bem calmo e cuidaria da casa. Isso incluiria varrer o incômodo.
Entretanto, não tenha medo: Só a mosca me deixa assim. Jamais desejei que um ser humano fosse mosca, para matá-lo como se faz a uma... mosca. Seja como for, este assunto fica entre nós...
                                      ...        ...
... Não vá zumbir nos ouvidos de outras pessoas.

INSTITUCIONAL

Por mais infeliz que esteja, não se suicide, afinal, isso é redundância. Mas se quiser suicidar, esteja à vontade, pois assim você morre sem ferir a gramática.

FALÊNCIA DE AFETO

Recentemente orientei minha filha mais velha sobre algo bastante inusitado para um homem como eu, que teve uma criação simples e desarmada. Disse-lhe que o homem que se casará com sua tia não será seu tio, depois de casado. Portanto, está desde já coibido que se estabeleça uma rotina de contatos físicos como abraços e beijos. Da mesma forma, as conversas reservadas, os segredinhos e outras coisas que certos marmanjos modernos adoram, quando se trata de menininhas. Quero que ela o trate com respeito e simpatia, mas com as devidas formalidades.
Confesso que a minha admoestação vai acompanhada de certo constrangimento e uma tristeza infinita, quando não de remorso. Tenho consciência do quanto sou antiquado aos olhos de muita gente, e do quanto posso estar sendo injusto ao generalizar a questão. Lembro que a minha infância não foi pautada por esses cuidados, e isso me fez um bem tamanho: O Tio José Carlos era tio, porque era casado com a Tia Elídia. Pedíamos bênção, recebíamos afagos e beijos. Igualmente, a Tia Enedina era tia por ser casada com o Tio Manuel. A mesma confiança, os mesmos afagos e a certeza do afeto verdadeiro.
Justifico o meu temor com as notícias cada vez mais gritantes de abusos contra crianças e adolescentes, por membros das parentalhas e pelos que passam a compô-las por casamento. Em geral, pessoas que gozam da confiança de todos. Nem tratamos do capítulo vizinhança, porque neste ponto, a questão foi até banalizada. Não se pode mesmo confiar plenamente num vizinho, quando se trata de filho pequeno. Mesmo sabendo que o mundo está bem sortido de pessoas confiáveis, de boa índole, não há como adivinhar quem seja o possível monstro da família ou da vizinhança, baseando-se nos discursos, expressões, religião, muito menos na idade.
Os tempos mudam, e com os tempos, mudam as formas de criar os filhos. Isso representa uma falência de afeto, confiança e outros itens que sempre foram ingredientes fundamentais de união familiar. É realmente lamentável que se precise orientar um filho sobre cuidados com a própria família, mas a realidade obriga. E de formas mais veladas, para que a vida não fique insustentável, é até necessário estendermos essas orientações no que tange os tios legítimos; em alguns casos, até os avós.
Tomara que os netos de nossos netos consigam inaugurar uma era mais humana, em que as pessoas possam confiar nos sorrisos, nos afagos e afetos... Nas gentilezas. Um mundo em que a pedofilia seja uma palavra perdida no dicionário ou no museu das palavras extintas e insubstituíveis. Verei através de outros olhos, esse tempo em que falar de maldade semelhante será digno de certo “pra mim, você está falando grego”.

EXISTE O QUASE IGUAL

Há mamães e mamões, cocôs e cocos. Amo Jose, porém Jose ama José. Se o político frauda, será sempre menos fralda para o bebê. Não dou asa pro azar, mas briga é brega, e quem a tudo revida, um dia pode não ter chance de revinda.
Sou a favor de um favo para cada um. Acho absurdo que alguns tenham dez graças ou mais, e outros só desgraças. Temporão não tem que chegar ao mesmo tempo em que o temporal, mas deve estar mesmo preparado para o caso de ocaso tenebroso.
Quem tem a vista apurada compra só à vista e sabe que Machado e machado são distintos; a exemplo de Franciscos, não são todos de Assis. A meu ver o luxo é lixo e lixa lincha as unhas. Um porco é parco, se a festa está repleta.
Ovos e avos são quebrados na divisão injusta. Parir tem a hora de parar. Pau e pão se parecem quando o pão é dormido, mas continuam pau e pão. Paz faz bem; no entanto, pás têm tudo a ver com guerra. Violência.
Tendo pais e país, a criança terá tudo. Mortandade concentrada vira mortadela. Folha falha e desgarra quando chega outono, e fada é foda, se a vara mágica dá defeito. Tenho muitos anos, mas um ânus basta, para quem tem vício de fazer merda.
Quase nem atino mais pro destino que decidi dar ao texto. Um contexto sem texto quiçá dissesse muito mais. Tento apenas, se tanto, mostrar que não é contragramática. De fato existe o famigerado quase igual.

A QUEM ME QUEIRA

Terei mundo a partir de algum lugar
que não feche a janela do infinito,
não abafe os meus gritos casuais
e não tente calar as esperanças...
Minha vida quer mundo em qualquer canto,
qualquer vida que aceite o meu sonhar,
quer a luz desse olhar que saiba ver
um encanto escondido em minha mágoa...
Se me quer faça um curso de quem sou;
tire notas plausíveis e componha
sua história nas pautas deste caos...
Serei livre a partir de me prender
a quem tenha o poder de me soltar
na certeza do quanto já sou seu...

QUANDO A VIDA PESA

Cada dia me acorda pro quanto não sei;
Essa lei me desgasta e desgosta bem fundo;
Toda noite me apronta prá grande ciência
De que a vida supera o que dê pra sondar...
É nas folhas do mundo que a história revela
Quanto nada se junta nas obras do todo,
Como a fútil novela de cada existência
Se derrama no vácuo da grande utopia...
Vale a pena viver, se não damos ouvidos
Aos lamentos que fluem de nossas cisternas,
Quando somos movidos por autopiedade...
Começamos no fim, cada vez que tentamos
Arrombar as verdades que trazem cansaço
E se prendem ao passo com todos os pesos...

quarta-feira, 11 de abril de 2012

VIRTUDE DE SONHAR

A vitória não tenha exatamente
Que abater oponente, ocupar pódio,
Ser alguém não exige a supressão
Dessa mesma intenção de alguém ao lado...
Há um mundo pra lá dos nossos braços,
Uma vida infinita e divisível,
Nossos passos não têm que se apossar
Do limite possível para o outro...
Trabalhar não traduz o fazer guerra,
Pois a terra precisa dessas mãos
Pra que o tempo não pare de florir...
Vamos ser lavradores, não soldados,
Desarmar a versão banalizada
Que se deu à virtude de sonhar...

SOBRE FOFOQUEIROS

Quem espalha uma intriga faz jus à ira, mas quem ouve (ou lê) a intriga e prontamente absorve sem questionar o outro lado, faz jus à piedade... afinal, o fofoqueiro passivo é covarde, fraco, e sua personalidade nem é sua... é de quem a queira modelar.

HALTEROFILETRAS

Muito herói já salvou a humanidade
sem ganhar o Nobel nem outro prêmio,
porque sua missão teve a verdade
que dispensa honraria, faixa e grêmio...

Pra reger um caiaque, apenas reme-o;
leve pouco, jamais uma vaidade;
chame um sábio, talvez agum boêmio
que remonte o cenário à tenra idade...

Muitos gênios não passam pela escola,
nem a gripe é suína ou espanhola
por estar no vulcão da pandemia...

Um artista não tem que ser Picasso,
dá pra ser escritor sem tanto inchaço
pra encher um fardão de academia...

PEQUENO

De minha filha, Júlia, referindo-se a um anão: "Pai; aquele moço é pequeno desde pequeno?"

OPINIÃO ROUBADA

De que adianta pedirmos uma opinião sincera, se o nosso tom de voz intmida e exige o endosso de nossa máxima?

OPINIÃO ROUBADA

De que adianta pedirmos uma opinião sincera, se o nosso tom de voz intmida e exige o endosso de nossa máxima?

O BOM DO LADO MAU

Deixarmos claro o que temos de mau, tem seu lado bom... É que o nosso lado bom, por menor que seja, sobressai muito mais e a sua imprevisibilidade gera encantamento.

HIGIENE

Desliguei a sirene, calei os sentidos;
Minha caça de amor se rendeu ao vazio,
Meu silêncio gritou que se faz necessário
Que a mordaça em meu cio continue assim...
Algemei qualquer laivo de alguma paixão,
Pra que o chão nunca mais se desmanche aos meus pés
E ninguém me derrube do senso restante;
Minha estante acomode uma história real...
És um sótão perdido na minha razão,
Um terreno baldio deixado pra lá,
A ração derramada em caminhos de lama...
Nunca mais turvarás o que tenho de bom,
Pois o quanto senti saberei a quem dar;
Fiz a minha higiene, limpei-me de ti...

INVESTINDO NO AMOR

"Investir numa nova relação" é uma máxima bem adequada para o início de uma nova tentativa amorosa, em um mundo cada vez mais capitalista. De uma forma genérica, a mulher investe seus dotes visando antes a estabilidade financeira, depois a felicidade afetiva, e o homem investe seus recursos econômicos e sociais no amor da mulher, sabendo que sem isto será quase impossível. Por causa desse investimento, em tempos de crise as relações amorosas estão indo à falência e pedindo concordata com muita facilidade.
Às mulheres, a garantia de que reconhecemos os esforços e o talento com que um número delas, cada vez mais maior, busca essa estabilidade com esforço próprio. Vai em busca da independência numa espécie de informalidade, à margem das relações produtivas materialmente. Também sabemos que é crescente o número de homens que "investem", à moda feminina, em relações com essas mulheres. E pasmem, são menores as estatísticas de falências. Isso revela uma superioridade notória da capacidade afetiva da mulher.

OLHOS CIENTES

Já conheço covís, pois tenho lado lobo;
minha banda serpente conhece uma trama;
sei de bois e boicotes, que também sou bobo,
tenho lado lodoso (entendo bem de lama)...

Na fumaça longínqua identifico a chama;
para mim basta um ponto pra que seja o globo;
vejo mata fechada numa simples rama,
ver além me parece cauteloso e probo...

Atuei nos mais vários tablados da vida,
cicatrizes me fazem prever a ferida,
trago flancos que podem antever crateras...

Fui vilão tantas vezes, não guardo segredos,
tive minhas invejas, rancores e medos;
a minh´alma felina conhece panteras...

sábado, 7 de abril de 2012

ACOMODAÇÃO E POLITICAGEM

Se o mais ineficiente e omisso entre os governantes fizer, ao fim de seu mandato, uma lista de tudo o que realizou em seus quatro anos, essa lista sempre será imensa. Afinal, ninguém passa tanto tempo sem fazer nada. Mais ainda, ninguém terá como praticar nem mesmo seus atos de corrupçaõ, como desvios de verbas públicas, se não tiver como justificar com gastos em obras, e mais comumente com atos de assistencialismo, o uso dessas verbas.
O que pode medir, de fato, a importância de uma gestão, são os atos, medidas e obras que mudaram a vida de uma cidade, um estado, ou país. A eficiência de um governante se reflete na felicidade real e duradoura de seu povo. Não no sem número de praças, asfaltamentos, pontes, passarelas, prédios escolares e reparos em obras públicas, que são nada mais do que rotina. Coisas obrigatórias, que o dia a dia exige, sem nenhuma revolução social. Como não há nenhuma revolução social nos assistencialismos que não projetam o futuro, não transformam vidas nem garantem dignidade. São apenas currais. "Favores" que acabam junto com os mandatos daqueles que os criaram.
Valorizo imensamente projetos que revolucionaram de formas significativas a sociedade, transformando conceitos, modos de vida, realidades sociais. Quem não valoriza um projeto como o do divórcio, a lei Maria da Penha, o sistema de cotas, a lei 10.639/03, que trata da aplicação de estudos de africanidade nas escolas, e outros do mesmo peso? Os resultados finais podem ser questionados, por causa da desobediência e da falta de pulso para fazer cumprir, mas são projetos e leis que têm ou teriam como tornar a realidade muito melhor. 
Mudaram vidas, tornaram o Brasil mais justo e suportável, as leis trabalhistas, por exemplo, que deram direitos fundamentais antes não sonhados: Carteira assinada, décimo terceiro salário, férias etc. Se hoje esses direitos são insuficientes e o salário mínimo não dá para quase nada, não é porque tais leis foram ruins, e sim, porque as exigências cresceram. A relidade requer mais. O país cresceu, e com ele os conceitos de conforto, vida digna, cidadania. Os políticos é que não se dignam a atender as necessidades de ajustamento dessas leis ao nosso tempo. 
Mais recentemente, temos a criação dos juizados especiais, as leis contra o preconceito, e muitos outros avanços capazes de promover a qualidade de vida de todos nós. Pena que lidamos com o vício do não fazer valer, ou do fazê-lo precariamente. A corrupçaõ é maior do que a aplicação das leis. Os favorecimentos, o tráfico de influências, a má vontade política, mais a acomodaçãodo povo tornam o Brasil impróprio para viver bem.  
Inicia-se mais uma campanha eleitoral. É comum vermos políticos exibindo seus feitos. Na maioria das vezes, feitos que apenas fazem parte da rotina de cidades, estados, e do país. O mínimo obrigatório é numeroso, quando apresentado em forma de lista. Simplificando bastante, é feito alguém do lar, que enumera todos os afazeres diários como lavar vasilhas e roupas, varrer casa, espanar móveis, cozinhar, cuidar de filho etc. Afazeres que são muitos, cansam, mas que são obrigações diárias. Não mudam a vida familiar. Não revolucionam a casa.
Quando virmos esses políticos lançando aos nossos rostos os seus feitos, analisemos os efeitos. O que seus projetos, leis e atos fizeram de fato por nós. O que mudou em nossas vidas. Como são as nossas cidades, estados, o país, depois do que fizeram. Existe uma diferença? Existe um antes e depois deles? Pensemos nisso, e deixemos de premiar, a cada eleição, aqueles que não fizeram nada além do obrigatório, e quase sempre, com a única intenção de lucrar pessoalmente com isso. 

RELAÇO

Era o fim; a certeza do vazio;
mas do fio de nosso precipício
refizemos início, meio e sim...

PSICO...

Você acha terríveis as psicopatas? Espere até conhecer uma psicogalinha.

SOFREDORA OUR CONCOUR

Que ninguém surja com uma tristezazinha qualquer... Atacarás de uma depressão invencível. Vencerás a todos. Para todas as dores de cabeça que sintam ao teu redor, terás sempre a maior das enxaquecas. Não haverá resfriado que vença teus cansaços; desânimo capaz de superar tuas anemias; íngua que se compare ao tumor com que surgirás de chofre. 
São teus problemas os mais graves. Tuas causas, as mais importantes. A solidão que declaras, quando alguém se diz solitário, é desmedida. Vences todos os torneios de amargura, medo e cansaço. O mais incompreendido entre os demais seres é bem mais compreendido que você.  Se alguém é injustiçado, és a vítima em potencial. Onde os outros amargam frustração, já perdeste as esperanças de tudo.
Às vezes quero que entendas meus sofrimentos normais. Penso em desabafar um pouco, sem menosprezo algum ao que sofres. Logo entendo que não posso competir. És mártir em potencial. Se algo me fere, tuas chagas são imensas. Meus vazios são nada, face ao abismo eterno do qual tu´alma não encontra cura. Se não quero agravar os teus estados, melhor estar bem e cuidar diligentemente para que tudo e todos estejam.
Seja como for, eu te amo. Calo as minhas agonias e tento levar o nosso amor sem grandes incidentes. Aceito-te como és, o preço é alto e preciso pagar, se não quiser te perder. Choro escondido, para que não vertas rios de lágrimas. Procuro não cair, para que não surjas devidamente sepultada, exigindo meus remorsos mais profundos.

terça-feira, 3 de abril de 2012

SOCIEDADE SELVAGEM

Em um de seus versos, o samba mais verdadeiro, na minha opinião, composto por Dona Ivone Lara, diz o seguinte: "Alguém me avisou pra pisar neste chão devagarinho". Dona Ivone, uma conhecedora profunda do mundo real, falou de sociedade. Da realidade separatista, egoísta e desigual que tempera o caráter do ser humano e se faz presente nos mais diferentes meios e grupos.
Alguém, senão todos, está sempre a postos para dar o aviso. É melhor, para quem chega, pisar mesmo devagarinho, sem qualquer ameaça de se destacar. Cada centímetro de qualquer espaço é disputado com todas as características de selvageria presentes no mundo em que vivemos. Ninguém aceita o risco de ceder lugar, e muitos são capazes de atrocidades ostensivas ou veladas para não acabarem ficando à somba do esforço, da aplicação ou do talento de quem se revele disposto a mostrar a que veio.
Escolas, igrejas, ongs, gangues, quadrilhas, empresas e sindicatos são apenas alguns dos ambientes em que essa disputa é mas acirrada. Mas existem meios ou grupos que para muitos estão acima de qualquer suspeita, e no entanto fervilham, por excesso de concorrência. É o caso dos grêmios literários e academias; dos meios artísticos; das ditas sociedades filantrópicas, como os rotarys e maçonarias. Não existe como saber o que está por trás de cada gesto contrito, cada discurso apaixonado, atitude nobre ou heróica. Tudo pode ou não, ser fachada.
Na verdade, cada pessoa que chega expõe o grupo ao pavor de vê-la crescer, tornar-se forte, líder, e acabar assumindo o comando. É realmente necessário pisar devagarinho, ser sutil, modesto, e praticamente jurar que não fará sucesso. Na sociedade, em um todo, as maiores chances de ser senhor estão nas mãos de quem sabe se forjar escravo até o momento oportuno.

ALGO ALÉM DA VISÃO

Este bloco de gelo acoberta uma chama;
meu olhar de Saara tem um lago oculto;
algo bom me reside, apesar da má fama,
sou alguém nas entranhas da faixa e do vulto...

Levo muitos pecados, mas mereço indulto;
tenho vida real escondida na trama
do boato e do vero; da ira e do culto;
acharás a minh´alma, revirando a lama...

Quem me quer venha fundo, mergulhe sem cisma;
queira mesmo a verdade, menospreze o prisma,
pra julgar meu melado considere a cana...

Tudo tem fundamento, sentido e razão;
cada cena e cenário algo além da visão;
minha capa de andróide uma máquina humana...

ESTRELAS NEFASTAS

Numa família que sofre o drama da doença grave ou da perda de um ente querido, a pessoa que mais sofre por esse ente querido não é a que mais chora nem a que mais declara ou propaga seu sofrimento... Muito menos aquela que desmaia repetidamente e diz querer ser enterrada na mesma cova.
Pode ser (e quase sempre é assim), que a pessoa de fato mais atingida pelo sofrimento seja exatamente a mais calada... A que menos exibe lágrimas e lamentos. A que menos discursa sobre a sua dor, até mesmo sobre o amor extremado que devota ou devotava ao ente em questão. O amor não é um produto que tem marcas e patentes com graus de superioridade ou excelência.
Geralmente, o maior desempenho nestes casos é premiado com muitos consolos; palavras de apreciação pela capacidade notória de sentir; abraços, beijos e atenções intermináveis; admiração. O agente é tratado como se fosse ele, o moribundo ou falecido. Ao mesmo tempo, a pessoa menos performática sofre um distanciamento velado. Fica marcada como fria, insensível... Sem a gritante capacidade de amar, por exemplo, a própria mãe.
Ninguém percebe que o "insensível", nessas horas, poupa a todos de um sofrimento em dobro. Não exige para si também as atenções que devem estar todas voltadas para quem as requer por direito e natureza. Seu sofrimento é real. Não se mistura ao "showfrimento" de quem se elege a maior vítima das circunstâncias, tornando-se a estrela nefasta dessas circunstâncias.
Lembro-me que ainda era bem menino, quando minha avó materna morreu. Enquanto uma das filhas, a minha tia, desmaiava continuamente e gritava o seu desejo de ser enterrada junto a ela, o que desviava todo o foco da fatalidade, minha mãe se mantinha em silêncio. Sem muitas lágrimas. Tomava as devidas providências burocráticas do sepultamento. Ainda vejo os olhares de reprovação sobre ela, por parte dos admiradores ferrenhos da sensibilidade extremada de minha tia.
Dias depois do sepultamento de minha avó, num momento em que meus irmãos brincavam na rua, entrei de mansinho em casa e flagrei minha mãe num canto, chorando só. Copiosamente, mas em silêncio. Sem soluços nem gemidos. Quando me viu se recompôs. Com um leve sorriso, disse que estava com saudades de minha avó... Era " só isso, mas estava tudo bem". Não precisava dizer nada aos meus irmãos nem às outras pessoas.
As "outras pessoas", aliás, disfarçadamente sumiram de nossa casa. Estavam muito ocupadas, quando não com seus afazeres, com os desvelos que dedicavam à minha tia, que de fato estava bem. Bem melhor do que minha mãe, agora renegada pela injustiça do julgamento velado da parentalha.

NA CONTRAMÃO

Pelas alas do tempo me adapto ao mundo,
mas queria descer, se pudesse freá-lo;
quase sempre ofereço algum cheque sem fundo;
ele zomba e me nega o menor intervalo...

Caminhar é sem graça, nem merece abalo;
esta calma em meu rosto é de alguém moribundo
que já viu todo encanto escoar por um ralo;
tenho alma dispersa, plasma vagabundo...

A missão que me algema é sem direito a trégua,
cada passo que dou rende mais uma légua,
mas começo a sentir onde mora o segredo...

Nesta pena de vida por não sei qual crime,
para ver se o destino afinal me redime,
terei boa conduta e partirei mais cedo...

SOBREVIVÊNCIA MESQUINHA

Com o crescimento vertiginoso da corrupção, da violência, do preconceito e da exclusão social, acabaram nosso espanto, indignação e repulsa. Se hoje temos medo, não é mais da deterioração ou do extermínio da humanidade como um todo. Nosso medo é egoísta. É apenas do que possa acontecer a nós próprios e aos nossos entes queridos. Por isso nos acomodamos com grades, condomínios, alarmes, circuitos internos, cacos de vidro nos muros, seguranças pessoais ou cães ferozes no quintal.
Pelo egoísmo e a acomodação que nos marcam, não denunciamos a covardia na casa ao lado. A bandidagem na esquina. O abuso sexual contra o filho, a filha da vizinha ou ela própria. Vemos como atitudes apenas incorretras e sem muita gravidade, os atos criminosos dos nossos políticos, desde que não nos atinjam diretamente. Ficamos sempre passivos perante os desvios de focos pela imprensa, quando lhe é conveniente ou lucrativo acobertar algo.
Fazemos o mesmo, ou deixamos de fazer o que devemos, perante a exploração de menores, a pedofilia e tudo o mais que torna a sociedade cada vez pior. Vivemos neste planeta, que é nosso, como se fôssemos extraterrestres e não tivéssemos nada com isso. Em suma, tudo está como está porque resolvemos cruzar os braços. Resolvemos não resolver. Queremos sobreviver e pronto.

PESSOAS

Se dermos fim ao endeusamento de certas pessoas, há de ser automático o fim do menosprezo a outras pessoas; no caso, as de menor poder aquisitivo, as que não têm cargos importantes, as anônimas e simples... e até simplórias.

CULPA POPULAR

Somos nossos opróbrios; os próprios carrascos;
ninguém pôs estas cordas em nossas gargantas;
eles trotam sem rédeas porque damos cascos,
acobertam seus crimes porque damos mantas...

Nós plantamos a selva e criamos as antas,
mas é nossa carcaça que vira churrasco
quando nossos castelos discordam das plantas
e desabam dos sonhos expondo o fiasco...

Porém eles não caem do seu carnaval;
fazem farra infinita e lhes damos aval;
ensaiamos protestos, mas nos falta voz...

Todos eles estão onde um dia os pusemos,
têm os lemes, guidãos, os volantes e remos;
levam cheques em branco assinados por nós...

CÉU DE CREPOM

Apostei num fantasma de corpo presente,
No presente de grego que a vida me deu,
Minha mente caiu no alçapão afetivo
E perdeu a noção do sensato e concreto...
Agarrei-me ao cenário que o sonho montou,
Pois o chão esvaído me obrigou a isto,
Só restou mergulhar no vazio proposto
Pelo misto insondável de minhas quimeras...
Foste a causa não nobre que abracei de cego,
Já não nego a loucura daquela paixão
Que roubou a certeza de minhas vontades...
Abracei a mentira, beijei um papel,
Foste céu de crepom que afinal derreti;
um rapel que jamais achará terra firme...

ORIGAMI

Há um olho em alerta escondido no vento,
conferindo as pendências; ,os flancos; as sobras;
uma funda certeza no meu pensamento
quase aponta os caminhos e suas manobras...

Saberei me livrar das hienas e as cobras,
pois a vida entendeu de me dar o talento
(este é meu origami; capricho nas dobras;
valorizo a magia de cada momento)...

Cabe ao tempo a cobrança por nossas escolhas,
galho a galho se despe de todas as folhas,
tudo expõe a verdade na hora inconteste...

Cada dia revela seu tom de cobrança,
mora nisto a valia de minha esperança
de pagares por tudo que um dia fizeste...