segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

CHEGA DE GENTE QUE TROTA


Tenho dificuldades para crer que um indivíduo chega ao ensino superior sem ter evoluído nada ou quase nada. Ou mesmo tendo involuído, como é o caso desses delinquentes que não se importam de ferir, ás vezes matar, apenas pelo prazer de um trote violento, sem propósito e razão. As últimas notícias sobre consequências drásticas, às vezes trágicas de trotes que alguns calouros têm sofrido nas universidades me deixam desanimado com o poder que falta à educação que recebemos nas instituições de ensino, de nos tornar melhores, sociáveis, modernos e humanos. Que moderidade perversa move os nossos jovens, levando-os a praticar vandalismos como esse, piores do que pichar e destruir patrimônio o público? A cada dia percebemos que não vimos tudo em termos de selvageria humana. E nos espanta perceber que nas escolas, em especial nas universidades ocorrem alguns dos atos mais hediondos do ser humano contra o próprio ser humano.
Falta algo. Não; falta muito em nosso sistema educacional. Será que os educadores têm mesmo que limitar seu trabalho ao ofício frio e metódico de intelectualizar? Será que não temos, mesmo com salários defazados, vítimas de injustiças sociais pelos nossos governantes e marcados pela falta de condiçoes de trabalho... que fazer algo mais do que ensinar disciplinas instituídas? Acho que deveríamos ir além da burocracia educacional, na tentativa de formar cidadãos. No desejo sincero de entregar às universidades jovens capazes de refletir como pessoas, e assim considerar o outro como alguém digno de respeito. Não precisamos ensinar amor, porque isso não se ensina, mas podemos ensisnar civilidade, ressuscitar, de forma oficiosa e sem burocracia, a velha "moral e cívica", sem moralismos, mas com profundo poder de reflexão sobre direitos e deveres. Deveres além dos cristalizados como "do consumidor" ou quaisquer outros que visem tão somente os processos indenizatórios que fazem mais bem ao ego (às vezes ao bolso) do que ao espírito íntimo de cidadania e de humanidade. Creio que deveríamos separar nossas brigas contra o governo de nossos atos como educadores, preocupados com um mundo melhor. Até mesmo com governantes e parlamentares melhores, formados por nossa consciência e pelo desejo de um mundo melhor. Responsabilidade social não passa pelas brigas de classes ou sindicais. É algo pessoal e intransferível, como nunca esquecemos que as nossas senhas bancárias e cartões de crédito são. Podemos "bater" em nossos patrões e proteger nossos alunos.
Se passarmos a nos preocupar com os jovens que entregamos às universidades, sabendo que eles podem ser os futuros "veteranos" das universidades onde nossos filhos serão os futuros "calouros", seremos bem mais preocupados com esse detalhe do educar para o mundo, e não apenas para o mercado de trabalho. Mais ainda; se virmos cada jovem com essa preocupação,  faremos tudo o que pudermos para que nossos descendentes herdem esse mundo com o qual sonhamos hoje... sempre o hoje, porque estamos aqui e somos egoístas. Só a nossa mudança de consciência e postura será capaz de garantir uma sociedade que não trota. Se estamos "andando" para isso, já estamos trotando. Nossos passos são trotes e nunca serão capazes de ajudar a compor uma sociedade que realmente caminhe. Formemos cidadãos. Deixemos os trotes para bichos de cascos. Animais sociais precisam ser melhores. E com urgência.  

CADUQUICE KID


A estas horas da idade, passou a parte mais doce. Ficou no solo do íntimo a fatia que mais atrai o desejo de conhecer o que há de vir. Sob o couro estes calos que revestem minh´alma. Sinto entre a calma do rosto este sabor amargo de aflição, pelo sem sabor de saber que não resta muito para tirar proveito. 
Vim parar neste vácuo, dei de cara com o nada e tudo mostra o fim. Resta a acomodação de um sim ao destino, para pousar meu sofrer e me perder no pó. Ser só a tal ponto esteriliza o vigor da porfia e desfia os sentidos com critério rígido. Tudo faz meus anos pesarem. Fico velho, apesar de bem moço.
Tomara que um dia, quando a velhice chegar de fato, perceba que ainda existe vida e me remoce. Vejo em torno essa gama de pessoas que voltam no tempo e passam a viver, depois de meio mortas, como estou agora. A adolescência é uma espécie de velhice reversível. Acho que é. Só saberei mais tarde.

LUTA INSANA


Aprendeu-se a ditar como quem pede;
a matar com doçura, simpatia,
sendo mais popular que Charles Chaplin
sob o velho bigode à moda Hitler...
Ninguém raspa o bigode repressor
dessa cara postiça do poder,
do rolo compressor que nos amolda
pra perder o desejo de brigar...
Descobriu-se que a farda era flagrante,
que a patente nos ombros tinha o peso
dos olhares externos pros escombros...
Hoje sabem ser feras à paisana;
seus venenos têm sonhos adoçados;
luta insana, de quem os desafia...

VIRTUDE ALTERNATIVA

O religioso, ao fazer o bem, geralmente faz porque é religioso. Neste caso, bendigo a piedade livre que às vezes flui do coração de um ímpio.

DIVERSIDADE

Não somos todos iguais perante nada e ninguém. Isso é bom, porque não há riqueza sem diversidade. No amor, por exemplo, seria insosso e monótono olhar o mundo e não ver escolha. Não ter um rosto, um olhar, uma alma, um caráter... Um conjunto de valores que "fechem" com os nossos anseios.

DÉCIMO-PRIMEIRO MANDAMENTO

11- Cumpra os mandamentos anteriores não por serem mandamentos, mas porque sua índole o conduz a fazê-lo naturalmente... Caso contrário esqueça tudo; afinal, não valerá mesmo nada.

DE VIVER


Quem não sabe viver perdeu a vez
de ficar no aconchego do seu nada;
trouxe a tes como saco de seus nervos,
carne, ossada, conjunto visceral...
Veio vago, sem alma, sequer arma
pra lutar a favor ou contra o quê,
tem um carma que nunca entenderá,
pois não pode crescer internamente...
Ninguém sabe quem é, se jamais foi,
vai usando migalhas de vivências
que parecem gritar no seu despeito...
Leva o peito vazio de sentido;
sua mente não rompe o próprio caos;
quem não sabe viver nasceu morrendo...

GRAVE AMOR


Dor que ataca e desacata
meu recato já sucata
nas agonias do mal...
Mal que assola e desconsola
minha bola de cristal,
tira o pé do pedestal
de alimentar esperanças...
Morte viva que destrói
a construção do compasso
deste abraço no futuro,
porque traço meus princípios
na base do meu fim...
Digo sim assim sinistro,
nesta confusão profusa
que não dosa reações...
Triste acato e desataco,
nem há mais por que lutar,
relutar comigo mesmo,
nas caladas de gemer...
Só tremer neste mistério
pelo efeito feito adaga,
pelo peito a desbravar...
Já gravei na gravidade,
que nenhuma pena paga
o que devo por amar,
quanto custa ser assim...

A PARTIR DA CONSCIÊNCIA


Quando a cara do espírito se ferir com a pelica desta luva que bate, mesmo com a leveza da pluma, sei que vai doer na moral e desonrar o seu brio. Será sombrio para sua razão que nada entenderá quando vir seu mundo ruir sem trégua. Comporei sua tragédia com beleza de gestos. Matarei o seu mal, bem na raiz, sem a força das mãos que degolam. Com o perfume do afeto que a vingança envenena.
Depois rirei do seu riso. Sairão de meus olhos os dardos de um silêncio mortal que você há de saber, bem fundo, o que diz. Minha sombra será seu vale da morte no caminho restante. Entrarei como um câncer na consciência, roendo sem tempo nem critério, e você perderá o medo que tem de, propriamente, morrer, pois isto não será nada, face ao que restará para chamar de sua vida.

VULTOS DE SAUDADES


De repente a surpresa insana. Cai a capa, e o que é verdadeiro se desnuda aos olhos. Vem a face calada e grita suas verdades no silêncio do susto. Vai no susto, no solo do presente que aflora, a esperança que aprendi a cultivar sem motivo. Sou agora o cuidado que se personifica face ao mundo inteiro.
Minou a vontade, não desejo mais crer em ninguém; sou pingente nas voltas desse globo. Tenho febre com delírios brutais. Posso ver o contraste, pois fica em meu lugar um traste aberto à visão do espírito. 
Sei agora, como nunca soube que no fundo sabia, que o teu ser, sempre oculto, era vulto  e só.
É assim que prossigo: Levando meus vultos de saudades. Saudades do que nem sei, porque sequer existiu. Na verdade não foste, apenas estavas o que dizias ser. Eras um empréstimo de falsa personalidade ao brilho dos olhos cuja luz parecia natural. Parecia sim, aos meus olhos que brilharam por tamanha ilusão.

O AMOR QUE DEVASTA


As gaiolas estão em cada canto, na varanda extensa da casa mais luxuosa daquela rua. O moço tem canários, melros, sabiás, arapongas, uirapurus... uma infinidade. Parece até que haverá um novo dilúvio, e desta vez ele foi o escolhido para construir uma arca diferente, na qual acomodará todas as espécies de pássaros. Enquanto a cheia não chega, vai guardando os coitados em suas celas distantes das matas onde eram felizes e, consequentemente, seus trinados.
Muita gente admira o zelo extremo com que aquele rapaz trata os pássaros: as gaiolas bem adornadas, água sempre limpa e fresca, as melhores sementes e rações. Obviamente, nada que possa devolver a dignidade perdida - bichos têm sim, dignidade -; o prazer de cantar de fato; a emoção de planar na imensidão do espaço, mas tudo muito esmerado, conforme a pompa que o ser humano preza e julga ser o caso dos animais... esses que são classificados como irracionais exatamente por nossa irracionalidade.
Nas conversas com os amigos e "fãs", o moço é vezeiro em afirmar, com um clichê mais velho do que agora uso, a razão de tamanha diversidade em sua casa: "Eu adoro pássaros.". Adora e os prende... Tenho temor de me perguntar o que faria, se os detestasse.  

HD


Configure-me agora pra ser seu,
ponha senha, defina seu login,
pra depois me acessar a qualquer hora
e dar fim ao temor de me perder...
Esse ter e não ter já nos deleta,
somos texto que a vida não salvou,
documento sem meta nem registro
que se possa encontrar destino adentro...
Nosso amor é pirata e contém vírus,
precisamos limpar a nossa história,
pra depois navegarmos destemidos...
Temos tanto HD por desbravar,
eis o mouse, as janelas do futuro,
céu e mar; temos tudo em nossa mão...

SEM RINITE OU CEBOLA


Já deixei de poesia na vida real;
fiquei mais terreal, afundei neste chão
as raízes dos pés que tentaram voar;
fiz coar o que sou de quem ponho nas pautas...
Essa coisa de amar como quem despetala,
feito bala de afeto que a boca derrete,
lua toda melada entornando no céu,
é papel que a caneta interpreta na mão...
Afastei o poeta na hora do homem;
ninguém mais será musa, no máximo a meta
do meu sonho de alguém que chamarei de minha...
Será tudo sem juras nem juros além
desse bem que se quer com leveza e limite;
sem rinite ou cebola cortada no adeus...

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

A DITADURA E AS COXINHAS


Fui desses adolescentes que atormentam as namoradas esguias, por uma transadinha. Não conseguindo, apelam forjando expressões humildes e desesperadas que abrigam argumentos como: "Então me deixe botar nas coxinhas; por favor... Só nas coxinhas!". Aí as meninas levantavam as saias - quase sempre eram saias -, para serem lambuzadas pelo prazer que não sentiam. Algumas vezes minha consciência gritou, sem que minha voz confessasse o peso. Com o tempo, acabava gostando da situação. Eu tinha o meu prazer, elas sabiam que não teriam o seu e se resignavam. Era cômodo para mim, porque não envolvia perigo e responsabilidade. Não haveria uma gravidez me obrigando a ser homem, nem o meu machismo teria de ser provado num desempenho que levasse à satisfação total da parceira. Sequer havia parceira. Havia coxinhas.
A relação entre povo e poder público, depois da ditadura militar, é um tanto parecida. Quando perceberam que a repressão aberta já os expunha ao perigo e exigia grandes responsabilidades, os políticos brasileiros acabaram recuando. O que pareceu uma vitória de artistas, universitários e intelectuais engajados na luta pela democracia foi apenas uma retirada estratégica dos ditadores. A ditadura estava gerando filhos rebeldes . Dando fama, fortuna e prestígio a opositores ousados e criativos. Tinha crises de impotência e já não se auto-explicava perante o mundo, por causa da truculência com que tangia o país. Tangia mesmo. Não regia.
Ditadores não querem dar prazer. Apenas tê-lo. Como descobriram que a democracia é mais eficiente neste quesito, resolveram travesti-la. Governos democráticos não precisam parecer super-homens, deixam o povo e seus líderes latirem à vontade e tocam suas carruagens de mentiras, ganância e corrupção. Eles matam sorrindo, poetizam a fome, a vilolência urbana, a falta de cultura e educação. Regimes democráticos não levantam Chicos, Caetanos, Vandrés, Brizolas e Gabeiras, e ainda conseguem amansar os "companheiros" menos convictos... os Luízes Inácios, que só assim chegam ao trono, dispostos a manter a ditadura risonha e sem farda.
Eis aí a democracia: É a ditadura que bota nas coxinhas, lambuzando a sociedade passiva que não goza, não sente nada de bom e não tem como lutar contra o que não existe. Os ditadores têm ponto fraco: Você os enfurece, fá-los perder a compostura e deflagrar sua truculência, mostrando quem são. Já os ditos democráticos, só matando: Não têm vergonha na cara; nada os atinge. A justiça internacional não os vê. Só as nossas coxinhas os conhecem... não. Não apenas as coxinhas. Também os conhecem nossos estômagos vazios, nossa indignação inofensiva, nosso temor do futuro e tudo o mais que não toca, não sensibiliza nem acorda suas consciências... que consciências?

AMIGO ELIZEU PIRES:


Já decidi no coração, quais sãos os itens de minha riqueza: Minhas filhas, minha mãe, os irmãos e... os amigos. Amigos mesmo, desses que não perdemos porque são de fato. E havia tempo me julgava menos rico, pois sentia falta de sua amizade, que se fosse perdível não a teria mais, depois que o magoei por uma bobagem; dessas que hoje reconheço como bobagens. Meras bobagens.
Acabei ficando ainda mais rico, depois que você me deu como presente, no fim do ano passado, uma lição de grandeza e humildade: Mesmo sendo você a pessoa ferida, enviou-me um e-mail carinhoso, propondo um encontro para relembrarmos os velhos tempos. Não chorou mágoas, não me lançou ao rosto o passado, nem mesmo arrotou a grandeza, que assim se fez real, de perdoar. Perdoou sem palavras; sem ostentação.
Só me cabe abraçar a chance de saber que não perdi a honra de sua amizade. E não lhe peço perdão, porque sei que você não quer a formalidade que um pedido encerra. Sinto-me perdoado e no dever de não magoá-lo mais com os meus ímpetos e a injustiça que impregna meus sentidos. Cabe-me a missão de contê-la e fazer como você; aceitar o outro sem desejar que ele seja uma réplica de quem sou, como se eu fosse o dono de todas as virtudes.
Até dia destes, meu amigo. Agora sei que posso continuar aprendendo com seus dons de pessoa que se assume com as virtudes e os defeitos que tem... defeitos formidáveis para este amigo hoje marcado e amadurecido pelo tempo. Áh, o tempo... Como aprendi a valorizar o tempo!...

PRECONCEITOS

Negão, branquelo, bicha, sapatão e outros termos pejorativos só são aceitos em sociedades impregnadas de todo tipo de preconceito contra o outro e contra si mesmo, e dessa tolerância com a qual os preconceituosos passivos presenteiam os preconceituosos ativos.

INVESTIMENTO


É no tempo que poupo meus valores,
ponho toda esperança que se tem,
pra ninguém arrancar o que me cabe
dessas flores e farpas no caminho...
Nenhum banco tem tanta eficiencia
nem há bolsa capaz de seus prodígios,
minha essencia sorri a cada extrato
e vestigio do quanto me acumulo...
Porém sei que preciso ter essencia;
ter valores possiveis de aplicar;
ser viável pro meu investimento...
Sei que o vento corrói se me descuido,
se me deixo vencer pelas viroses
que nos tornam vilões de nossos dramas...

EFEITO COLATERAL

Romantismo em excesso dá diabetes no amor.

AMIZADE

Grandes amigos são amantes... que só não fazem amor.

ESTRELAS DUPLICADAS


Entre Jorge Vercilo e Djavan,
não sei se vou de Besta, vou de Van
ou me rendo ao divã pra resolver...
Se buscar Zé Geraldo acho Lenine,
Roupa Nova é The Fevers fanzine;
Vemaguete era mesmo Decavê...
Há no canto arrojado de Ana Canhas
a Ana Carolina de mais manhas;
o Bebeto adentrou Jorge Benjor...
E Lobão não sumiu, pois seu berreiro
se aveluda num tal Zeca Baleiro;
meu ouvido absorve bem melhor...
Este mundo é uma via de mão dupla;
quando sai um Serguei ressurge um Supla;
uma casa é bem próximo de lar...
A Gal Costa exagera na Tetê;
foi escrito na estrela do PT
que o PSOL tem um brilho similar...

CONCEITO DE MÍDIA

Parece que a piranha não é, exatamente, uma... piranha. É um peixe arrojado; destemido; ousado; intenso; atrevido... um peixe acima do seu tempo.

CONTROVERSO


Faço verso adverso porque sinto
como tudo é diverso neste campo;
quando acampo em tiradas mais luzentes,
faltam dentes prá farra dos sorrisos...
Isso mora no engenho do universo;
verso é mais instigante que a fachada;
lá no fundo, à distância do neon
é o inverso do nada já tão claro...
Quase nada converso em minhas pautas,
onde a vida está rasa e cristalina;
um poema perverso tem mil pés...
Verso bem, sendo caso de saudades,
de tristeza, rancor e solidão;
de verdades que o mundo expõe sem fim...

POEMA TEMPORÃO DE NATAL


Essas luzes que piscam  nas fachadas;
as canções lacrimosas de paz triste;
alegrias achadas na emergência
que resiste aos lamentos de outros dias...
Um amor decorado nos pinheiros
de resina ou de pets recicladas,
o dinheiro comprando as emoções
fabricadas prá justa ocasião...
Esse acordo, essa trégua pontual;
ponto alto, esse auto das famílias
que se despem do mal cotidiano...
É a lei do natal regendo as casas;
são as asas do sonho de harmonia
dando ares de lar a cada ceia...

MARCAS(SÃO)


Por favor um pão plus vita,
mas que seja da Bauducco;
da Plus Vita é muito caro...
Quero ainda umas brahminhas,
pode ser da Kaiser, Cintra
ou até da própria Brahma...
Também levo Coca-Cola
da Pakera ou Convenção,
um biscoito cream cracker,
mas da Cream Cracker mesmo...
Pro Marquinhos um band-aid,
pode ser de qualquer marca,
quase esqueço o leite ninho,
neste caso o ninho Glória...
Levarei uma latinha
dessa pomarola Arisco;
queijo minas do Pará;
batata inglesa do Rio...
Feche a conta e tome aqui,
pagarei com credicard;
mas meu credicard é Visa...

QUEBRA DE IMAGEM


Já não tem de vestir a fantasia
de pessoa cordata e sem melindres,
nem gostar de poemas porque faço;
ser o aço do espelho de quem sou...
Rasgue a sua expressão de tudo a ver,
deixe a sua vitrine se quebrar,
é a vez de assumir os entretantos;
receber pela imagem que vendeu...
Mostre as unhas, entendo que as possua,
vire a lua, revolte o mar sereno
que acoberta mentiras comportadas...
Não tem mais de ser faixa para mim
ou estar quem não é, conforme o caso
de ganhar mais um prazo em minha vida...

PARA RITA


Antes de
conhecê-la,
das duas
uma verdade:
Jamais amei
um amigo;
não sabia o sentido
de amizade.

sábado, 18 de fevereiro de 2012

MOSAICOS


A criança perdeu o olho esquerdo. Aparece na foto com um sorriso incentivado pela mãe, que o abraça também sorrindo – por uma heróica resignação –, dando exemplo de superação e otimismo. Seu depoimento é de que depois de mais algumas sessões de quimioterapia o câncer será totalmente extirpado, eliminando o risco de morte e de perda, pelo menos total, da outra vista. Vai-se o olho, fica a vida. É a máxima de uma mãe esperançosa, que vem comendo o pão que o diabo de um erro médico amassou, quando o moço de branco disse que o “probleminha” era, talvez, o início de uma catarata, mas que o melhor mesmo era esperar mais um tempo para que tivesse certeza.
Veio a certeza de que não era a catarata, quando a mãe acordou da preguiça daquele médico e resolveu procurar outro. Fez isso em tempo de salvar a vida do menino, mas não em tempo de salvar seu olho. O mais foram tempos de sofrimento, incerteza, revolta e fé (pois ela remove montanhas. Remove até o globo terrestre. Só não foi possível fazer com que o globo ocular do garoto amargo e sorridente não fosse removido com todo o resto). Uma falha dessa virtude apregoada para que o ser humano supere a si mesmo, com isto superando os problemas, as angústias e os desenganos, brincando de ser feliz com o que “Deus” lhe deu para viver como pode.
Minha mente fotografa a foto do jornal. Meu coração a revela para toda a alma, e não consigo deletar essa imagem que deveria me alegrar, pois define uma vitória irrefutável. Sei que todos os que rodeiam a criança triste, de um olho só, estão dando graças aos céus pela cura. Uma cura que não poupou o rosto agora cavado, com um brilho a menos, um complexo a mais, a certeza de que o crime da displicência daquele médico será sempre relembrado em frente ao espelho implacável, que não deixa os egos mentirem. Cairá sempre por terra toda a gratidão encenada para o mundo, com o apoio dos que o amam, por isso o querem sorrindo (com os lábios e com o olho restante).
Ainda assim, celebremos a sobrevivência. A vida está cheia de compensações que não substituem a perda de um órgão, nem de um sentido, mas dão sentido à caminhada. Vale sempre a pena buscar o melhor das alegrias possíveis, da felicidade adaptada, de tudo que há para colar os cacos de uma vida que se quebrou em algum momento. Viver é isso, e podemos ter certeza de quem ninguém atravessa uma existência sem grandes perdas, tombos inesquecíveis, “estilhaçamentos”.  Todo ser humano é um mosaico, e muitas vezes há cacos irrecuperáveis. Aqueles de quando somos “quebrados” por médicos, educadores, motoristas, políticos, policiais e juristas irresponsáveis.  

SEU... SEMPRE SEU


Proverei a despensa de su´alma,
sem espaço pra flancos afetivos;
cobrirei as carências do seu corpo
sem dar corpo aos ensaios do vazio...
Guarde bem a certeza do que sinto,
sinta o sonho que deixo ao seu dispor,
tome nessa verdade um elixir
e renove o sentido da paixão...
Tenho fundo pro cheque ou xeque-mate
que seu medo pré-date pra medir
o valor e o tamanho deste afeto...
É a Glória do amor galardoado;
eu aqui me doando até doer;
venha ter o que há muito já é seu...

MEU CAFOFO


Serpentinas de sol vêm da janela
cujas frestas também refinam sons
da manhã camponesa que me chama;
rege a fauna que cerca meu quintal...
Abro a porta e me sirvo do que sobra
de neblina, luar e madrugada,
colho a fruta que o galho generoso
faz-se braço e me oferta na varanda...
Lá na rua "Seu" Gérson cantarola;
vai a campo (ao seu lado vai Tupã),
leva enxada; sorriso; cumprimentos...
Quase fico, a preguiça me convida,
mas a vida me chama prá cidade;
a saudade já vai na minha frente...

PEDOFILIA

Pedófilos não têm cara, classe nem idade padrão... Cuidado, por exemplo, com certos velhos fortemente armados de balas, doces, brinquedos e simpatia excessiva.

NATAL EM TEMPO DE CRISE


Pode ser que o natal da crise tenha todos os ingredientes do espírito próprio dessas datas que a cristocracia instituiu. As crises unem em torno do pouco aqueles que passam a formular na mente as mais inusitadas formas de partilhar. Não exatamente pensando em dar, mas em não ficar de fora. O ser humano é muito egoísta para pensar em qualquer partilha como quem a faz. Sempre pensa como quem a recebe. É claro que aqui se excluem as excessões. 
Seja como for, esse medo da solidão; do abanono nesse deserto do não ter acaba promovendo a aproximação dos iguais; a partir daí, o pensamento em comum promove ações em prol do todo. É um cada um por si coletivo, que alcança o próximo e estabelece trocas, tornando a vida intensa; interessante; humanizada. Desse egoísmo inicial nasce a solidariedade. Surge a idéia de conjunto e corrente. Os indivíduos se falam, se ouvem, se tocam, fazem planos e permutas e descobrem que o outro existe. Nos piores momentos de um país ou do próprio mundo nascem as mais fantásticas manifestações de consciência humana e social. Nascem também as manifestações de criatividade e grandeza. Os heróis nunca são frutos de realidades amenas. Eles surgem onde medram vilões.
Um exemplo deste discurso está na produção artística, literária e cidadã nos tempos de ditadura no Brasil. Se foram anos de angústia extrema, insegurança, medo, privação e vigilância, foram anos de intensa criatividade, quando artistas e literatos precisavam ser táticos, inteligentes e sutís para burlar a censura. Anos em que os jovens estudantes travaram as mais belas e românticas lutas contra o regime. Não lutavam por dinheiro, riqueza, fama nem status. Gritavam por liberdade, por direito de expressão, cidadania, e pela causa apostavam tudo; dedicavam suas vidas algumas vezes sacrificadas pela truculência militar. Hoje, quando vivemos em um regime democrático, ninguém mais precisa ser engenhoso nem quixotesco. A democracia torna o herói ridículo. Cala os arroubos e estabelece uma praticidade que não deixa rebrotar o romantismo daqueles que acreditam salvar o mundo.
Neste fim de ano, o mundo vive um momento crítico. Temos tudo para ressuscitar o velho espírito de solidariedade que, na minha opinião, não tem que ser próprio do natal. Tem que ser próprio do ser humano em qualquer época. É muito mais fértil nas crises. Nas hecatombes sociais. Faz-se necessário germinar em cada um de nós um herói disposto a cuidar do próximo, deixando que o próximo faça o mesmo por nós. Para tanto, é necessário descobrirmos o amor dentro de nós. Não exatamente o amor nos padrões da igreja. Descarta-se a obrigação de acreditar em Deus, Cristo, Jeová (...), tornando possível brotar a crença em nós, no mundo e no futuro.

EX-SER HUMANO


Um marido infartado que a mulher conduz
tão solícita, branda e sem ar de rancor,
qual quem leva uma cruz que teria que ser
ou afaga uma dor que nasceu pra ser sua...
Velho saco de ossada que a mulher transporta,
para tanto adivinha seus pontos tocáveis,
pois importa cumprir a missão redentora
desses dons incontáveis de certas mulheres...
É aquele "deus grego" esse pobre diabo;
deus da casa, da rua e das outras mulheres
que o levaram; comeram; sorveram tutano...
Esse ex-ser humano entulhado na pele
ressequida, sem viço e rachada nas dobras
virou sobras, rejeitos e devolução...

CRAQUES DE BREJOS


Os terrenos baldios são Maracanãs
de meninos descalços, vadios, contentes,
que dividem as poças com ratos e rãs
nas peladas que jogam depois das enchentes...


Lá não faltam platéias, o chão tem sementes
das quais brotam torcidas; esquálidos fãs;
fazem gestos, sorriem, xingam, mostram dentes
(e crianças doentes agora estão sãs)...


Jogam bola meninos de pais com cirrose;
muitos têm hepatite, leptospirose(...);
outros tantos não lembram se tiveram pais...


Mas as bolas são Teca, Totó, Duque, Rex,
nas peladas capengas daqueles moleques
que as estumam nas áreas dos lados rivais...

MUNDO SEM SURRA


Curiosa, minha filha Júlia, de três anos me perguntou com ares de segredo: "Pai; o que é uma surra?". Gaguejei. Baixei a voz e quis saber onde ouvira tal palavra. Ela disse que um coleguinha na escola em que a mãe trabalha cofessara ter levado uma. Pelo tom da voz, a Júlia entendera que não era boa coisa, e certamente o coleguinha surrado não fez expressão alegre ao dar a notícia.
Não tive coragem de dizer. Talvez devesse fazê-lo, não sei o que diriam os "educocratas", mas não tive. Convergi nossa conversa para coisas mais produtivas. Com o tempo, a Júlia saberá o que é uma surra, não graças a mim. Na verdade, fico feliz por ter uma filha que vive num mundo (o de nossa casa) que ainda não registrou a palavra em seu glossário de práticas.

POEMA IDIOTA


Só direi de viver que vale a pena,
vale até persistir neste clichê
e fazer um poema previsível,
desses versos patéticos de bares...
Uma vida resume qualquer coisa,
põe o mundo num cubo diminuto,
tem parcelas de luto e solidão
como preço de poucas alegrias...
Hoje o mundo não sabe o que fazer
do moinho de vidas sem sentido,
o sentido invisível do seu caos...
Mesmo assim lhe direi que a vida vale
o seu vale de sombras e de morte;
madrigais idiotas como este...

NATUREZA INSUSTENTÁVEL


Os anos de progresso irregular e insustentável tornaram a natureza também insustentável.  Não que ela seja cruel, como reza a superstição simplista de quem atribui à natureza os sentimentos humanos que a devastaram e seguem fazendo o mesmo sem pensar nas conseqüências. Mas, porque assim como o homem, ela precisa se manter. Reagir e sobreviver às agressões que a extinguem de todas as formas há muito tempo, apesar de seus constantes e evidentes pedidos de socorro.
Neste momento é Santa Catarina que sofre tragicamente os efeitos da ação humana. Mas o Brasil e o mundo estão sofrendo, a cada momento, esses mesmos efeitos de formas diversas, previsíveis e imprevisíveis. Já não podemos dizer, como sempre antes, que o Brasil é um país abençoado por não ter vulcões ativos, terremotos e outros fenômenos desastrosos que assolam grande parte do planeta, pois agora estamos em igualdade. A diferença entre nossos desastres ambientais e os de sempre em países como o Japão está no fato de que os nossos desastres são provocados por nós. Não por acidentes naturais e posições geográficas. Nossas secas e enchentes hoje matam quase tanto quanto os vulcões, os terremotos, maremotos e outros fenômenos comuns desses países. 
É claro que o mundo inteiro passa a sofrer de outras síndromes além das que sempre o vitimaram. Todo o mundo polui. Todo o mundo não sabe mais o que fazer com o lixo, o acúmulo de resíduos industriais, o excesso de fumaça lançada no ar. Aliás, sabe, mas não quer pagar o preço inicial da redução da poluição, que é o redirecionamento de seus lucros. A redução momentânea desses lucros. O reinvestimento na contramão de tudo o que se fez até agora, que não será possível de um dia para o outro.
Ainda existe o problema da falta de educação ambiental. Da educação social. Humana. Popular. O povo não acredita nos avisos escatológicos da natureza.  Segue afrontando-a. Com isso, pagam os que não têm consciência e os poucos que a têm. Santa Catarina sofre, sofremos todos com aquela gente, e cada estado deste e dos demais países do globo vai tendo aos poucos, e abruptamente a sua cota de sofrimento direto. 
Pena que parece não haver nada capaz de nos conscientizar das razões de tanta desgraça. Quando a bonança volta, continuamos com os nossos hábitos insustentáveis de ferir o planeta com o lixo caseiro e industrial. Com o excesso de fumaça no ar. De esgoto e óleo nos rios e mares. A caça predatória. O desrespeito às diversas formas de vida e a não reciclagem a não ser por arte e glamur. O vício de desmatar, assorear os rios, desnudar as encostas. Empresas, pessoas, todos unidos na destruição, em nome do lucro, da diversão e do desleixo, a falta de senso crítico e amor pelo meio em que vivemos.
Torcemos pela recuperação de Santa Catarina. Pelo fim do drama daquele povo. São nossos irmãos sofrendo, o que nos leva ao sofrimento. Mas torcemos também pela conscientização de todos nós. Pelo entendimento necessário, emergencial, de que a natureza nos pede uma trégua, disposta a fazer o mesmo. Ela não está nos assassinando. É o  Preço natural dos nossos atos que, estes sim, assassinam a natureza. 

ZUMBI


Quando a gente parou de se querer,
desejei apagar o meu passado;
quis viver a partir da escuridão
do momento em que tudo ficou claro...
Desde quando acordei daquele sonho
sou a própria expressão da inexistência,
ponho as horas num canto e me recuso
a saber do meu tempo; meu caminho...
Fui alguém ao teu lado, agora estou
quem não sei se restou pra me dizer,
o que faço é somente me seguir...
Quis nascer no silêncio da explosão
do vazio que trago desde lá,
mas o chão se perdeu; não tive onde...

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

ANTES QUE CEREJA TARDE

Mangas muito de mim, mas pêra aí: Caqui entre nós, te dei um mamão quando precisaste. És meu amor, amora de minh´alma, e confesso que és uma uva. Mas tudo passas. O tempo avança e dá uma banana prá vaidade.
Agora abacaxi, que vou te dizer uma coisa: Não ameixas tanto com o meu brio; já estou cheio do teu jenipapo furado. Parece coisa à toa o que digo, mas a situação é graviola. Nem me tomates a sangue-frio, como estás fazendo, pelo teu desprezo mal disfarçado.
Se desistes de cajá comigo, tudo bem; posso entender. Mas terás que dizer francamente. Sou como cigano, sempre limão, e a tua mão diz que mentes. Nozes fomos felizes por um tempo, mas de repente ficaste assim. Teu corpo inteiro revela que já não me queres.
O desejo que tenho é de fugir do país. Ir pra melão. Ficar lá por um tempo, até esquecer. Se figo aqui não esqueço, e a lembrança lima o que me resta de orgulho. Além do mais, não suportarei quando a mulher que amo começar açaí com outro.
Eis o grande problema, carambolas! Eu te amorango demais pra partir! És como deusa em minha vida! É sapoti que junto sempre os meus cocos e repito, aqui no íntimo, este clássico "para todo o sempre; amêndoa".
Agora tenho kiwi. Vou trabalhar. Falei tanto e não disse nada. Mesmo assim penses bem. A gente pinha tudo para ser feliz, mas está jaca indo num poço sem fundo. Abricó teu coração, antes que cereja tarde demais.

TRAGA FOGO

Tire um tempo dos muitos compromissos;
peço até que reveja o seu fichário,
pra roubar uns minutos de si mesma;
dedicá-los ao quanto estou carente...
Seja minha num lapso das horas
que lhe querem somente para o mundo,
ponha flora na fauna já sem vida
zumbizando nas cinzas do meu brio...
Tenha tempo espremido pra me amar;
pode ser sem amor; por emergência;
uma espécie afetiva de U.T.I. ...
Só preciso lhe ter mais uma vez,
sua tez nem precisa trazer alma;
traga fogo pra ver se queima o resto...

SEM GARÇAS

Há óleo nos olhos azuis do mar;
nesses olhos hoje nem tão azuis;
quase nem a distância os faz assim...
Hoje o mar não tem gente, não tem aves,
não há moças ajeitando maiôs
nem há moços cortejando as moças...
Só há poças de lama onde era areia,
só há tons incontáveis de venenos
embaçando o reflexo de um céu
já sem rosto pro aço desse espelho...
Cataratas fatais de poluentes
deixam tudo sem graça, revoadas
são escassas na lama da maré...
Hoje o mar é qualquer coisa sem garças...

PRUDÊNCIA

No que tange os temperamentos humanos, há muitos casos em que ser prudente é bom... prodente.

DESPREVISIBILIZE

Cão "que ladra" demora mas nos morde;
nunca engorde os perigos mais franzinos;
cobra-d´água se humilha, engole sapos,
mas com crise de brio nos ataca...
Os remansos às vezes surpreendem
nas enchentes causadas pela chuva;
é na uva, na cana e na cevada
que as indústrias do vício têm essência...
Creia sempre naquele que ameaça,
faça caso daqueles que outros dizem
que só dizem; não fazem; algo assim...
Não desmonte nem fuja, mas no fundo
tenha medo de tudo que amedronte;
não aposte num mundo previsível...

BEM FUNDO

Quem quiser explorar o meu saara
corre o risco de achar alguns preceitos;
trago feitos passíveis de surpresas,
neste chão arenoso de minh´alma...
Pegue o mapa das minhas inconstâncias,
tome o lombo do velho dromedário
que suplica em seu íntimo essa caça;
faça sua vontade reprimida...
Eis a chance de achar alguma prenda,
só me aprenda, me queira por matéria
secundária no curso de seus pés...
Tenho minhas virtudes, mesmo escassas,
minhas praças ou álamos no fundo
deste mundo esquecido; meu deserto...

SUPER HERÓIS REFORMADOS

O Hulk já não é mais tão Incrível,
nem o Quarteto é tão Fantástico...
Já o Homem-de-Ferro enferrujou
e ninguém nunca mais viu
a invisível mulher Invisível...
Quanto ao Zorro, este só quer
saber mesmo de suas zorras;
não tem, nem é mais espada...
O Homem Aranha se emaranhou
numa enorme teia de intrigas,
subiu pelas paredes do mundo...
Mulher Elástica eticou as canelas
e foi no Príncipe Submarino,
para o reino de aquém-mar...
Capitão América foi rebaixado
e se tornou Recruta Zero,
Demolidor tá demodê
naquele modelito escarlate...
Agora o Batman ficou Duende;
ninguém à sua volta entende
porque só batman em mulher Gato...

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

CAIS

Teu amor foi um surto com prazo marcado;
ser amado foi susto que me fez feliz;
acabou teu teatro e me negaste bis,
hoje vivo do cheiro daquele passado...


Solidão tomou posse e se fez ponto "xis",
fui outrora o que vejo de um vidro embaçado,
chego a crer que o destino já veio traçado;
um desenho infalível nos traços do giz...


Respondi com verdade à paixão fraudulenta,
ao amor de rompantes emergenciais;
tal cardápio curtido com sal e pimenta...


Mesmo assim és lembrança que faço de cais
da saudade que fere e também apascenta;
uma dor que deploro enquanto peço mais...

DENTADURA

Governos ditos democráticos são aqueles que descobriram na dita democracia uma forma contemporânea e bem mais inteligente de ditar. Sabem eles que democracia é ditadura sorridente: Dá cordas para o próprio povo ir ao cadafalso e cala os artistas e intelectuais que adquirem fama e fortuna se tornando mártires de uma grande causa popular. A democracia, em suma, é a dentadura do regime ditatorial.

UMA ENTREVISTA DESCONCERTANTE


Ansiosos, os jovens universitários iniciam a esperada entrevista que foram fazer a um escritor. Ansiosos sim, mas já sofreram ligeiro baque ao perceberem que a casa daquele homem tão pesquisado em suas últimas aulas de literatura leva uma vida bastante modesta: Mora num cafofo com telhas de amianto, fincado em terreno arenoso de área rural no qual cultiva batata doce, tomate, pimenta e caju para consumo próprio.
Logo ficam sabendo que o escritor não dispõe de internet, não tem tevê digital, telefone fixo, conta bancária e cartão de crédito. Áh, e também estranham que não use óculos o tempo inteiro nem camisa social de mangas dobradas. Sequer fama ele conquistou, apesar de ser cultuado pelo velho professor que o tem como um dos grandes poetas e prosadores brasileiros da atualidade. Possivelmente exagero de um velho mestre caduco.
A entrevista, entretanto, vale pontos para os exames finais. Resta aos estudantes a esperança de pescar narrações de aventuras, vitórias e conquistas literárias do entrevistado. Não é possível que não os tenha, pensam os moços, não dando qualquer importância para a possível qualidade dos textos daquele a quem foram entrevistar tão somente por ser um fazedor de textos.
-O senhor já recebeu muitas homenagens, imaginamos...
-Nenhuma.
-Tem quantas medalhas, senhor?
-Nenhuma.
-Quantos troféus?
-Nenhum.
-Não vemos nas paredes nenhum certificado de participação em eventos literários; uma menção honrosa ou algo parecido. O senhor não acha importante expô-los?
-Na verdade não os tenho também. Não participo de pelejas literárias.
-Mas o senhor não tem nem mesmo uma... (?)
-Um momento, rapazes. Creio que posso ajudá-los a fazer um trabalho mais notório, indicando outra pessoa.
-...
Um velho general. Tem medalhas e comendas por toda a farda que jamais tira. Em cada peça, uma história de bravura. É uma figura legendária. Um herói de guerra.

A CRISE EM LINGUAGEM LEIGA


Ainda não se entendeu a simplicidade do motivo da crise que o mundo amarga: gastar-se mais do que pode e não se preparar para os tombos que as surpresas dão. Esse não preparo se deve, no caso dos estados Unidos, à arrogância. À certeza de uma invulnerabilidade que não é real em nenhum país. 
Mesmo leigo, percebi que os ataques terroristas daquele fatídico setembro, às Torres Gêmeas nos EUA não teriam efeitos resumidos às mortes e aos danos materiais do dia. Começou ali a crise que foi se desenhando ao longo de uma guerra – declarada pelo governo norteamericando à ditadura Saddan, ao mesmo tempo em que caçava o terrorista Bin Laden. Foi uma guerra excessivamente dispendiosa e infrutífera, se considerarmos as causas ideológicas que só obtiveram a vitória específica da captura e morte de Saddan Hussein. Não aquela, contra o terrorismo em si.
Mesmo para o país mais poderoso do mundo, não dá para sustentar ao mesmo tempo as pesquisas e práticas de conquistas espaciais e os gastos com uma guerra igual à que o mundo assistiu, de poucos resultados, o uso de muitas armas de última geração e de outras tecnologias avançadas que oneraram o país. Há, decerto outras, mas estas são as causas capitais do que estamos começando a sofrer, graças aos efeitos globalizados em um mundo que se tornou muito pequeno para sair ileso de uma crise que tem início justamente na terra-parâmetro do mundo moderno.
Certamente que os termos da economia não serão tão simplórios ao explicarem a crise. Virão gráficos complexos, termos burocráticos e números confusos para “dessimplificar” a questão, pondo-a fora do alcance de nosso entendimento. Mas o que houve pode ser entendido perfeitamente, comparado àqueles casos em que uma família gasta com o que não pode, e quando as despensas e carteiras estão vazias surge uma doença exigindo recursos que já não há. 
Sendo ainda mais simplista, direi que os governos terão que ter, mais do que o domínio de conhecimentos econômicos para vencer a crise, uma boa dose de juízo. É do que precisam as famílias nos momentos críticos. Desse juízo provêm o esforço, a abnegação e a união de todos pelo bem comum.

DISTINTO

Trate a todos com distinção... Sem distinção.

SEM FUNDO

...É um homem muito acomodado: Só quer saber de muito dinheiro, bens materiais e altos cargos... Valores até consideráveis para comprar sexo, casamento, colegagens, lisonjas e medos, mas ninharias com as quais nunca poderá obter afeto, coleguismo, amizade, respeito e admiração sincera. Su´alma é cofre vazio, e seu caráter, cheque sem fundo para cobrir valores essenciais ao ser humano.

SOBRE QUEM PLAGIA


Já nem me surpreendo ao ver no RL expressões ou frases minhas enfiadas em alguns textos, não como paráfrases ou citações com os devidos créditos, mas travestidas de partes originais desses textos. Plágio mesmo. Falta de originalidade e de senso do ridículo. Não, não digo isso com ira nem vai aqui um aviso de possível recurso judicial. Nada farei contra os pobres coitados. pelo menos enquanto eles estiverem escondidinhos em comunidades literárias, como fazem aqueles estudantes infanto-juvenis que usam poemas alheios, muitos poemas até célebres, para "pegar" as meninas de seus ambientes escolares. Se ousarem o uso profissional/comercial de minhas crias, no todo ou em parte, aí sim, conversaremos em juizo.
Convenhamos, no entanto, que é no mínimo burrice (nem vejo má fé, só burrice mesmo), um sujeito plagiar um texto em determinado site e usar o produto de seu plágio exatamente neste site ou em outros bem próximos, por suas características. Isso ocorreu contra mim, e o pior é que o sujeito fez um bom texto, que continuaria bom sem minhas expressões, mas não resistiu: Tascou-as no meio, inseguro de sua criação. Mais esdrúxulo ainda é que o plagiador trabalhou sobre um poema infantil que publiquei há poucos dias no RL, e sua publicação foi aqui mesmo; no recanto.
Mas o meu objetivo não é condenar, constranger nem retaliar meu plagiador. Prova disto é que preservarei seu nome. Quero apenas falar sobre a fragilidade dessa prática na internet, e de como é difícil acreditar na completa inocência do praticante. Se escrevo algo que me pareça óbvio, o que significa que alguém já pode tê-lo escrito, jogo a frase num site de pesquisa e em poucos minutos sei se estou sendo original. Qualquer um pode fazer isso. Outra forma de não plagiar por coincidência é publicar apenas textos previamente registrados pela Biblioteca Nacional. A BN não registra plágios e reproduções. Por isso registro sempre meus escritos, e só depois os lanço em livros ou sites. Fazendo assim me preservo e posso contestar quem me acuse de plágio ou crime parecido. 
Não acredito que um plagiador se sinta realizado. Pode até mesmo desfrutar de uma alegria fugaz, volátil e conflitante, mas não se sente realizado. O vazio logo volta e se reinstala em seu íntimo, porque ele sabe que aquilo não é de todo seu. Que a sua capacidade não está inserida naquele trabalho e que ele precisou de uma muleta intelectual para escrevê-lo. É um deficiente intelectual ou artístico usando esmolas de criatividade que ninguém lhe deu.
Outra suposição deste plagiado é a de que o pobre sujeito nem saiba o que é plágio, portanto, sequer sabe que está plagiando, que isso é crime e pode lhe render desventuras. Penso assim, porque conheço muita gente que tem por plágio a cópia integral, a reprodução com autoria ou assinatura falsa. Isso é mais grave que o plágio, e merece cadeia quem o faz, mas não é plágio. Plágio é disfarce. É o ato de mascarar um texto para assiná-lo, ou de embutir partes de um texto alheio no seu texto, sem citação ou crédito, tornando-o parte desse trabalho. Em resumo, fraude. Sujeira velada. 
Por fim, quero dizer aos plagiadores que nem todos os plagiados são tranquilos como este, que não faz questão de pôr o mundo do avesso para punir quem o fraudou. Sejam cuidadosos e creiam mais em seus trabalhos, ou assumam para si mesmos que lhes falta a capacidade que desejam ter. Feito isto, partam para outras práticas e achem finalmente seus dons; aquilo no que podem ser de fato originais e que os faça felizes. 

VIGILÂNCIA

Contra os vigilantes truculentos e despreparados que as empresas contratam, só existe uma recomendação: Sejamos... Vigilantes.

GOSTO E GASTO

Há roupas baratas elegantes... E roupas caras cafonas. Isto nos inspira a máxima de que a pessoa de bom gosto não é, necessariamente, a pessoa de bom gasto.

VÍCIOS FINDANISTAS


Fim do ano parece fim dos tempos, quando só existe a intenção festeira de ostentar um sentimento superficial. Natal é o caos, quando os sentimentos estão confusos e desesperados para competir no mercado das manifestações que nos conectam com o momento. Com a moda findanista. O corre-corre do consumo com o qual pretendemos comprar uma vaga na ventania festeira da ocasião.
Não haverá um novo tempo, de ano novo a ano novo, enquanto não existir a sinceridade que desconhece datas, porque está sempre em ação. O que deixa sempre um buraco no coração da humanidade é essa indefinição de sentimentos. São esses folguedos que declaram no grito amores de lojas, de artifícios que piscam nos pinheiros de plástico e nos tons multicoloridos de presentes comprados que tentam compensar a falta de presença dos trezentos e muitos dias decorridos.
O natal será verdadeiro quando não tiver classe social, alegrias vizinhas de tristezas, arroubos forjados, religiões em conflito e separatismo racial. Tudo será novo quando o ser humano se reformar a partir do íntimo, desprezando as convenções e a obrigação de estar alguém melhor. É hora de sermos melhores, e isso não pode apenas figurar no velho círculo feito em nosso calendário. Um círculo vicioso.

DURO ACORDAR


Conseguiste matar meu sentimento,
por teus olhos de fio de navalha;
deste ao vento a função de varredura
dessa palha que tudo se tornou...
Felicito a destreza do teu feito,
teu talento prá mágoa e pro rancor
que despertas num peito outrora terno;
com que fazes amor virar fumaça...
Congelei aqui dentro as emoções,
as razões afetivas pro meu pulso
exceder o compasso com tu´aura...
Já nem aura restou pra recordar,
foi um duro acordar e consentir
que soubeste mentir por tanto tempo...

DURO ACORDAR


Conseguiste matar meu sentimento,
por teus olhos de fio de navalha;
deste ao vento a função de varredura
dessa palha que tudo se tornou...
Felicito a destreza do teu feito,
teu talento prá mágoa e pro rancor
que despertas num peito outrora terno;
com que fazes amor virar fumaça...
Congelei aqui dentro as emoções,
as razões afetivas pro meu pulso
exceder o compasso com tu´aura...
Já nem aura restou pra recordar,
foi um duro acordar e consentir
que soubeste mentir por tanto tempo...

PASSARAIO


Gralha disse que viu trombas
de elefantes cor-de-rosa,
mas o pombo gritou "pombas!
Vejam só que mentirosa!".


O mutum saiu do tom
e pensou que ninguém via,
mas calada e no bem-bom,
uma esperta cotovia...


Cisne conta uma piada;
guaxini, que não disfarça,
diz de cara bem lavada:
-Mas que piada sem garça!


Pra quem acha que ela mente,
é que Dona Tana jura;
se tem pássaro doente,
a Doutora Sara cura...


Urubu foi enganado;
ameaça dar um murro,
perguntando a todo lado:
-Tenho cara de uruburro?


Bacurau, que bem-te-viu,
me cantou essa firula;
vendo a raiva do tiziu,
pica-pau picou a mula...


Desde quando aquela naja
quase o devorou no mato,
é que o beija-flor viaja
só de gavião ajato...


Inspirada pelo vento
ou a própria cantoria,
sabiá mudou o acento
pra ganhar sabedoria...


Com carinho e singeleza,
neste grito em paz, "de guerra",
faço prece à natureza:
-Ave aves desta terra!

COUVE-FLORES NO CAMINHO


A batata faz seu doce,
mas o milho é bem milhor;
o forró da beringela
faz inhame...inhame... inhame...
Se viver não é alface,
não direi não coentro mais,
tenho até cará-de-pau
pra dançar o meu maxixe...
Beterraba é um chuchuzinho,
cebolando no terreno
com lacinhos de giló,
ao alegre som da salsa...
Mas a onda de abobrinhas
macaxeira a confusão,
quando chega o grão-de-bico
provocando o caruru...
Vou pular feijão-de-corda,
espinafre quem quiser,
afinal jamais me couve
ser exemplo de juizo...
Agrião, que vai passar
o desfile das ervilhas,
muitas milhas de folia
e de fogo nas chicórias...
Não me alho desse jeito,
que resolvo meus pepinos,
desde guando percebi
que só querem me arrozar...
E não vou tomate nada,
pro quiabo teus temores,
quero semear apenas
couves-flores no caminho!

SÓTÃOTÃOSÓ


Sua falta está farta no chão de minh´alma,
porque medra e transborda na calma tristonha
que se aduba nas horas desta solidão;
na versão de morrer que se ocupou de mim...
Seu adeus me persegue por este vazio,
feito rio silente cortando a floresta;
como tristes lamentos noturnos de brejos;
realejos de gente que tudo perdeu...
A saudade que sinto me aleija por dentro,
é o centro gasoso do meu universo
e sufoca o desejo de seguir vivendo...
Naufraguei nas lembranças e nada me acode;
nada pode me achar, pois virei o fantasma
que se assombra no sótão dessa nostalgia... 

TUDO A VER

O que "dizem as más línguas" tem destino certo e vezeiro: Os maus ouvidos.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

NEGRO DE ALMA NEGRA


Quando se fala em preconceito racial, na escola, finge-se que a questão resume apenas o não gostar da cor negra. Isto resulta situação bastante cômoda para os educadores que encontram sempre um caminho para desqualificar a lei 10.639, que torna obrigatório o ensino de História da Cultura Africana nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio. Outra tangente utilizada pelos preconceituosos velados é a de que outras raças são igualmente alvos de preconceito, e por isso não justifica criar uma lei específica voltada para as questões africanas e afro-brasileiras.  
Com todas as distorções inerentes ao preconceito que insiste em não se render aos novos tempos, conceitos e mentalidades é que as escolas vivem burlando a lei. Falam da culinária e das contribuições agrícolas. Gritam que "todo mundo é igual perante Deus", no tocante à cor. Repetem inúmeras frases feitas que põem o negro em situação de inferioridade, como se ele fosse obsequiado pela bondade dos brancos ou não negros, sendo aceito com reservas e ressalvas. Querem o negro tutelado pela sociedade brasileira, desde que ele se despoje de sua ancestralidade.
A lei, que exalto como o faço a poucas leis brasileiras, visa a totalidade. Ela tem por fim garantir o respeito, o reconhecimento e a inclusão do negro na sociedade brasileira, tanto quanto resgatar sua história, seus costumes, valores morais, culturais e religiosos, e ainda pagar ou amenizar a enorme dívida que este país tem com a negritude. Não existe o contexto de obrigar ninguém a simplesmente gostar dos pretos e aceitá-los como quem faz um favor. Todos têm o direito de não gostar de preto, estrangeiro, protestante, umbandista ou homossexual, mas ninguém pode fazer o que este país faz com o negro, fechando-lhe as portas, excluindo-o de formas abertas ou veladas, como ocorre nas escolas quando elas se negam a contribuir para a reparação histórica dos prejuízos humanos e sociais sofridos pelos negros, especialmente nos anos de escravidão.
É a África, a grande vítima da humanidade. São os afro-descendentes (e os índios, embora este artigo não seja sobre eles e já exista, em boa hora uma lei da mesma natureza sancionada para os indígenas), os credores do Brasil neste aspecto. Dívida é para ser paga, e a sociedade não quer fazê-lo. Por isso deturpa leis como a 10.639, a lei de cotas e outras que visam essa reparação, com discursos esdrúxulos que desviam o foco de uma questão muito mais ampla, complexa e profunda do que se faz pensar.
Há que se incluir o negro em todas as camadas e contextos sociais, não impondo-lhe os vernizes da cultura européia, das religiões norteamericanas, dos cultos globalizados e da moda. Exigir que o negro não tenha identidade ou seja branco naturalizado é desejar que ele continue escravo como nunca deixou de ser. O Brasil não tem o direito de obrigar ao negro a síntese de sê-lo apenas na cor da pele. Ainda estamos vivendo a velha e absurda máxima do "negro de alma branca".

REMENDOS


Recomeços têm muitas rachaduras;
falta piche pra todos os reparos;
cobram preços que oneram para sempre,
são avaros; não dão abatimentos...
Essa lei do retorno que se farpa
tem ciladas ao longo do caminho,
cria escarpa nos pontos de subida;
um espinho na flor de cada passo...
Toda volta requer uma empreitada
que nem pode sonhar com perfeição;
é lição que ninguém gabaritou...
Mesmo assim são viáveis os remendos,
quando existe real maturidade;
se a verdade for bem remodelada...

COM SAÍDA


Pode vir que me amar não deixa obesa;
sou alface; agrião; maçã; ricota;
faz um tempo que venho pondo a mesa
pra quem finge ou de fato sequer nota...


Meu amor já passou da própria cota;
sou guerreiro vencido; sem defesa;
uma carga banal pra sua frota,
prenda simples demais para princesa...


Mesmo assim reivindico esse momento
no qual possa mostrar meu sentimento;
jóia rara; sem outra; feito a vida...


Venha leve, sem medo, sou ameno,
tenho beijos e abraços sem veneno
e me amar não é beco sem saída...

HUMILDEMENTE AMEAÇANDO


Eu podia estar roubando;
Traficando.
Estuprando.
Vadiando...
Conspirando,
Fraudando,  
Cheirando.
Torturando...
Matando...


Ou estar pirateando,
Sacaneando,
Pedofilando,
Aterrorizando...
Maracutaiando...


Pastoreando alguma igreja.


E podia estar mentindo;
Omitindo.
Extorquindo.
Transgredindo...
Oprimindo,
Fingindo,
Fugindo. 
Desnutrindo...
Rugindo.


Ou estar subvertendo,
Escarnecendo,
Apodrecendo,
Embrutecendo...
Obscurecendo...


Exercendo cargo político.


Podia estar podendo
E tendo à força,
Mas estou aqui  pedindo
Para ter o seu amor...


... Vai dar por bem ou por mal?

HUMILDEMENTE AMEAÇANDO


Eu podia estar roubando;
Traficando.
Estuprando.
Vadiando...
Conspirando,
Fraudando,
Cheirando.
Torturando...
Matando...

Ou estar pirateando,
Sacaneando,
Pedofilando,
Aterrorizando...
Maracutaiando...

Pastoreando alguma igreja.

E podia estar mentindo;
Omitindo.
Extorquindo.
Transgredindo...
Oprimindo,
Fingindo,
Fugindo.
Desnutrindo...
Rugindo.

Ou estar subvertendo,
Escarnecendo,
Apodrecendo,
Embrutecendo...
Obscurecendo...

Exercendo cargo político.

Podia estar podendo
E tendo à força,
Mas estou aqui  pedindo
Para ter o seu amor...

... Vai dar por bem ou por mal?

A PRAGA DO RACISMO


Quando me propus a aplicar num determinado colégio, estudos sobre cultura africana, conforme determina lei recente, a diretora da unidade reagiu com espanto: "Vai falar de macumba?". Expliquei que sim. Que falaria de umbanda, quimbanda, candomblé e todas as ramificações religiosas nascidas ou não na África, mas de certa forma oriundas de lá. Não é necessário dizer que foi difícil convencê-la de que não poderia falar de África pulando seu aspecto mais marcante e desafiador, que é justamente a religiosidade. Seria como falar de Roma sem passar pelo catolicismo; do Japão, omitindo Buda, ou da Índia, sem lembrar de Gandhi. 
Fiquei também assustado. Não consigo entender o fato de estarmos no século XXI sem termos avançado nessa questão. As escolas, que deveriam ser núcleos de cidadania, portando-se como principais agentes da extinção dessa praga social que é o preconceito, estão disseminando-o mais e mais. Não bastasse a intolerância racial, o fanatismo cristão que assola a nossa sociedade estabelece uma guerra fria pela qual segrega, humilha, exclui. E esse preconceito é tão evidente, que as direções escolares querem atender à lei apenas em parte, fazendo um trabalho superficial, de fachada, de modo a não permitir que os jovens "corram o risco" de se encantar com a riqueza cultural, histórica e mesmo religiosa de nossos legítimos antepassados. Em outras palavras, querem fraudar.
Enquanto isto ocorre no Brasil, os estados Unidos acabam de nos dar uma grande lição, elegendo seu primeiro presidente negro. Os Estados Unidos não têm uma população negra proporcionalmente numerosa como a nossa. Os negros daquele país correspondem a mais ou menos 13% da população. E quem não é negro, nos estados Unidos, é branco. Não existe uma mistura de etnias tão acentuada como no Brasil. E se muitos disserem que o brasileiro elegeu um cidadão pardo, "portanto, negro", continuarei dizendo que não elegeu um negro dentro da concepção exata, de negro, que permeia nosso preconceito: Um preto.
Digo também que não importa o que há "por trás" da eleição de Obama, no que tange os bastidores da política do país. Falo do povo, do sentimento popular, da resposta que pretendeu (e deu, de fato) nas eleições, dizendo que está cansado de acreditar nos olhos azuis que sempre governaram como quiseram, levando os Estado Unidos à bancarrota que o mundo assiste, sofrendo junto as consequências. Lá, onde só vota quem quer, a população resolveu ir às urnas em massa, para dizer o quanto anda insatisfeita e o quanto é supérflua essa questão da cor e da ideologia pessoal de quem passa a comandar a nação.
O Brasil tem uma dívida imensa com o negro. Dívida que torna escasso o sistema de cotas que a sociedade "arianocrata" deturpa e quer invalidar. E essa dívida continua crescendo, porque o negro continua sendo excluído por causa da cor e de suas raízes. Aliás, nossas raízes, que renegamos quando somos "clarinhos" e pedimos bênção às ideologias sociais, étnicas e religiosas da Itália e dos Estados Unidos, entre outros países. Somos livres para isso, mas não para tentar anular a identidade dos "pretos" e daqueles que assumem essa identidade, inclusive no quesito religião. 

INSTINTO ARISCO


Poderei quase tudo pra sua carência
de carícias e beijos, momentos de afeto,
serei teto pro flanco; pro vazio exposto;
suprirei a falência de fundo instintivo...
Tenho muito prazer a dispor nessas horas,
porque venho curtindo a pimenta que trago;
minha flora revirgem garante surpresas;
meu estrago sanado corre novos riscos...
Só não quero esse risco de amar outra vez
ou a tes permitir que se atinja meu ser;
que se deixe vencer por sentido mais fundo...
Nada quero nem posso pra lá dos instintos;
vinhos tintos, prazeres em data marcada;
os arquejos de arcada que nunca me prenda...

MUTAÇÕES

As mudanças na sociedade moderna são tão abruptas e bizarras, que nem são exatamente mudanças. São mutações.

JOGAR E LOGAR

Antes, era "vivendo e aprendendo a jogar"... Depois da internet, é vivendo e aprendendo a logar.

TAPAS ETAPAS

São inúmeras as vezes em que as melhores etapas da vida surgem logo depois dos... piores tapas da vida.

sábado, 4 de fevereiro de 2012

PERDÃO É TROCA

Acho que o perdão é gradativo. Tem que ser.  Esse negócio de um momento registrado, em que um pede perdão e outro dá, vira documento. Documento é burocrático e tem tudo para se tornar mais um objeto de hipocrisia. Ou de desigualdade, em que este se humilha, se assume inferior, e aquele se engrandece exercendo uma prática ostensiva que será posteriormente admirada por todos. Vejo que os perdoadores nunca são anônimos. Seus atos de grandeza institucional são difundidos e lhes dão prestígio na comunidade; especialmente entre os grupos religiosos dos quais fazem parte.
O verdadeiro perdão não tem palavra decisiva, gesto cortante, ato único. Isso é teatro; serve para emocionar, produzir lágrimas e filmes. São realmente belos os espetáculos produzidos pelo “me perdoa...”, “eu te perdôo!”, mas são apenas espetáculos que o tempo quase sempre desmonta, pela superficialidade. 
Perdoar expressamente é o grande momento de um ser humano em busca de notoriedade ou pelo menos uma boa massagem no ego. É aquele cenário em que uma pessoa se encolhe, baixa os olhos e suplica o produto de uma virtude que o mundo enaltece e transforma em vitrine socio-religiosa. Todos querem perdoar, porque o perdoador é protagonista. Mocinho da história ou do episódio. O perdoado é o vilão. Aquele que fez maldades e agora se rende à própria culpa, como se chegasse ao fim de uma novela, quando cada personagem presta contas de quem foi durante a trama. 
O mundo será mais transparente quando as pessoas se assumirem com seus erros e acertos, as virtudes e os defeitos, todos os lados de sua inevitável humanidade. Se achamos belo pedir perdão, imaginem um mundo em que todos reconheçam suas culpas e recorram em silêncio à generosidade gradual e também silenciosa dos que perdoam. Como não existem situações em que apenas um é culpado, perdoar e pedir perdão terão sempre uma resposta, e essa resposta será construída, estruturada lentamente. Não atirada pelo ímpeto, a precipitação, o arroubo próprio das neuroses de massa.
Perdoem pelo texto. Mas procurem mergulhar no contexto destas linhas e me peçam também perdão. Mas façam isto sem palavras, para que o tempo nos dê a chance desse exercício de grandeza que prefere a sombra e os bastidores. Desçamos do palco de nossas convicções, para ser possível melhorarmos por dentro.