segunda-feira, 31 de março de 2014

A OPINIÃO DO FEITOSA

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Morre de repente o Belizário. Pessoa muito legal, Belizário tinha todos os documentos. Trabalhava de carteira assinada, pagava os impostos, cumpria seus compromissos, não cometia crimes nem contravenções. Legal... muito legal, mesmo.
Além de ser pessoa muito legal, Belizário também era músico. E um músico muito legal: pagava ECAD, registrava suas composições, fazia parte da "ordem", não plagiava. Legal. muito legal, mesmo. Dificilmente um músico é tão legal quanto o falecido Belizário.
Dias depois da morte do músico, um de seus filhos procura o Feitosa. Tem em mãos uma música inédita do pai. Sabe que o Feitosa lida com música e quer saber sua opinião. Justo a de quem faz a mesma coisa e ainda não alcançou o sucesso. Ingenuamente, o rapaz não espera que a opinião daquele homem seja desconfortável, dúbia e frustrante, não por maldade, mas pelo instinto natural de sobrevivência que se agrava na "segunda divisão" do meio artístico.
     - Esta música é mesmo do seu pai?
     - É sim, seu Feitosa. Tem mais ou menos uns três meses.
     - É. Está organizadinha. Tem partitura. Certa cadência. Só me diga uma coisa: ele a registrou?
     - Registrou, sim. Eu nem trouxe o registro, mas ele registrou. E então, seu Feitosa? O que diz da música?
     - Visivelmente desconfortável, Feitosa coça o queixo e se ajeita na cadeira. Estende a música para o moço e o despacha com uma incógnita.
     - Legal... legal mesmo... muito legal.
O jovem olha pro chão, "gradece" com um "brigado" espremido e sai. 
Se depender dessa única opinião, ele jamais saberá se a música é uma porcaria que a gentileza do Feitosa promoveu a "muito legal", ou simplesmente uma obra-prima que a sobrevivência do Feitosa rebaixou para "muito legal".

PODER

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Todos querem ter poder...
Senão de compra, barganha.
Senão de caça, procura...
Ou em forma de algum dom,
Pode ser de profecia
Ou de cura.
O que vier está bom,
Mas todos querem poder...
De bater ou de apanhar,
Acumular patrimônio,
Falar a grandes plateias,
Converter
Ou expulsar o demônio.
Até mesmo de calar,
Ser humilde pra vencer
Pela humildade,
Ter seus tesouros aqui
Ou guardá-los na Suíça
Da eternidade.
Oprimir, ser oprimido,
Muitos creem que se ganha
Em se perder;
Não importa como for,
Pela guerra, pelo amor,
Todos querem ter poder.

quinta-feira, 27 de março de 2014

REPRESSÃO NUNCA MAIS

Demétrio Sena, Magé - RJ.

São inúmeros os que desejam ver de volta o velho pau-de-arara; instrumento oficial de tortura nos tempos da ditadura militar. Nessa época muitos artistas, intelectuais, ativistas políticos da oposição e cidadãos comuns confessaram crimes que não cometeram. Abriram mão da inocência e foram parar nas celas, solitárias e covas rasas reservadas a quem simplesmente não concordava com o regime de governo.
Era no pau-de-arara - e nas mortes que serviam de exemplo - que os lacaios oficiais ou simples puxa-sacos do governo mantinham a suposta ordem nacional. Tinham controle dos desejos e das manifestações populares. Eram donos da verdade instituída. Faziam sangrar o patriotismo que não era patriotismo. Era medo. Sobrevivência.
Querem de volta o pau-de-arara, os que serviram à ditadura. Os filhos dos que serviram à ditadura. Os "ordeiros" intransigentes e inimigos da democracia nos pontos em que ela os incomoda. Os que não suportam a voz das massas; das diferentes classes; da cidadania em si, porque tudo expõe suas nódoas; a distorção do seu caráter; sua natureza tirana, preconceituosa e fanática. Separatista e perdida no tempo.
Quem quer o retorno do pau-de-arara é inimigo da denúncia. Do jornalismo investigativo. Da crítica literária. Da educação irrestrita e ampla. Da arte, a cultura em um todo, como formas de manifestação política e social. Do pensamento livre. Da expressão organizada, inteligente. Morre de pavor da inteligência. Do conhecimento sem fronteiras.
Os nostálgicos da ditadura querem voltar a calar as vozes que se levantam em nome da razão. Querem ser novamente os algozes do brio, da vontade própria e da verdade popular. São fantasmas tristonhos dos velhos tempos que ficaram nas ferragens da história, quando bateram em alta velocidade contra o próprio equívoco. 
É certo que a democracia também tem seus buracos. Não cura o caráter doentio dos maus políticos, policiais, professores, empresários, maus cidadãos que são tantos, mas também não cala nossa voz. Não impede que sejamos quem somos e gritemos contra desmandos, injustiças, impunidade, pelas mais diversas formas de manifestação.
Nenhum cidadão de bem tem saudades da ditadura. Querer de volta o pau-de-arara é querer que ninguém discorde. É ser incomodado com a liberdade alheia. Tentar impedir a manifestação do outro, quando essa o remete às próprias mazelas. Ficar ofendido com a manifestação legítima de quem compõe, canta, faz literatura, esculpe, atua, pinta e borda como formas criativas de crítica e protesto.

IMPUNIDADE

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Matemática e fuja,
que a própria história já trata
de acelerar sua data;
sua geografia...
E logo tudo é matéria,
é tratado, é uma tese
que sai na urina e nas fezes
da sociologia.

quarta-feira, 26 de março de 2014

PELA REDE SUSTENTÁVEL

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Vou me ater ao amor, ficar em paz,
quanto ao mais aceitar o que já é,
pois amor não afronta ou polemiza,
não revisa conceitos e posturas...
Esquecer as questões da sociedade,
da política, os males desta era,
da cidade que oprime o cidadão
porque a fera do medo está no ar...
Quando falo de amor não fico só
sobre a face da terra nem do "Face",
não há nó nem silêncio à minha volta...
Vou me ater ao amor; curtir a vida,
ser curtido na rede social,
ter aval dos que temem ter problemas...

terça-feira, 25 de março de 2014

O REEENCONTRO

Demétrio Sena, Magé

Só preciso ajeitar algumas coisas em minha vida por aqui. Conquistar uns perdões mundo afora, dar algumas alegrias e perdoar a mim mesmo por quem sempre fui ao longo dos anos. Só assim poderei dar às horas tardias um contento verdadeiro. Autenticado e com firma reconhecida.
Quero ter tempo de achar as minhas perdas mais significativas e recompor meu ser, pedaço a pedaço. Ao chegar o dia da minha noite, preciso partir inteiro. Não quero que ninguém herde os meus cacos e termine por se ferir de mim.
Tenho bem pouco a fazer, serão poucos anos, e prometo não insistir depois disso. Não tentar enfiar o pé na vida extra nem fazer pirraça para ficar em um mundo que será passado em meu futuro. Será presente de grego numa carcaça carcomida pelos cupins dos anos.
Minhas crias ainda estão bem verdes... ainda precisam dos meus cuidados e palpites. Têm os próprios pés, mas de alguma forma caminham sobre os meus e dão sentido aos dias que me restam. Fazem tudo valer a pena.
Ainda hei sofrer algumas perdas, alguns danos, ter também alguns lucros. Na soma total do que me resta festejo em paz e silêncio, a expectativa do reencontro que vislumbro. Só mais um pouquinho, mãe... guarde bem o seu ventre para me reparir. 

POEMINHA BOBO

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Quem quer comer
a jardineira;
maria-mole;
o rocambole
da cozinheira...
E quer meter
chave na fenda;
o pé na porta; 
malho na Marta
ou na Inês
que já é morta...
Vai ter que ter
a fantasia
que só se tem
no vai e vem
da poesia.

segunda-feira, 24 de março de 2014

SERES HUMANOS

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Gosto mesmo de gente; pessoas tocáveis;
de quem ouve o que digo e quem diz o que ouço;
quem tem carne, tem osso, tem olhos nos olhos
e me sabe, mas sabe que também o sei...
São inúteis os astros, estrelas são vãs,
imortais nascem mortos no meu coração,
tenho chão no qual planto sementes de amigos;
colho afetos, amores, maçãs e poemas...
Amo a vida, os desníveis que o mundo contorna;
diferenças comuns que nos tornam iguais;
os 'dez mais' estão presos em suas redomas...
Quero a soma disforme dos seres humanos,
não as tintas e os panos que revelam mitos;
que me jogam pros deuses de céus fraudulentos...

BOLSA-CRIME


GRANDEZA


sexta-feira, 21 de março de 2014

NOSSO NÓ

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Estou no ponto em que não quero mais viver nenhum recuo. Confiança reduzida. Cumplicidade freada. Nenhuma espécie de "alto lá", mesmo com os devidos e incômodos ares de carinho e gentileza.
Justo quando cheguei à magia de uma relação com que sempre sonhei, não quero ter simplesmente que voltar no tempo. Desde o começo, julguei que manteria possível nossa fábula, exatamente no auge do encantamento, mesmo que um dia ela viesse a ser só minha. Coisa da minha cabeça; digo; do meu coração incorrigível.
Caso tenha sido apenas um engano da minha escassez de noção, da minha fé na boa fé do outro, que se consuma o fim. Não as adequações, o "cada coisa no seu lugar", as aparas e o chamamento à tal noção... a descida indisfarçável, mesmo assim disfarçada, em busca do meio termo que pra mim nunca houve.
Amo todo absurdo que alcançamos, ou pelo menos achei que sim: nosso compromisso sem compromisso; nossa união sem status; uma cumplicidade sem culpa... sem "o que será que será".
Se tudo passou a ser demais pra você, o que restar de um passo atrás será de menos pra mim. Não quero me dar por satisfeito ao descobrir que jamais descobri o elo perdido das relações afetivas. 
Nem me proponha, veladamente, um inaceitável "pelo menos"... "mais ou menos"... "pegar ou largar"... a resignação deplorável de saber e aceitar que não passará de um doce laço comum, este nó que nos ata sem atar... que nos tem livremente presos um ao outro.
Não quero retrocessos. Regressões. Ou seremos cada vez mais quem somos ou seguirei sozinho... com quem sempre serei.

ALÉM DOS OLHOS

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Quem me aceita como sou... não me ama como show.

CRIANÇAS IMPRÓPRIAS

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Só entendo as mudanças progressivas;
cujas rotas não têm retrovisor;
sei que a flor nunca mais será botão
e que o tempo não faz percurso inverso...
A saudade só tem que ser saudade
ou estante honorária das lembranças;
nossa idade não dança o nosso tango
nem o aço do espelho exibe as almas...
Mas conheço quem vá na contramão
do seu tempo, seu vão, seu horizonte;
cai do vento e se arrasta contra si...
Não entendo pessoas decrescentes;
velhas mentes atadas aos umbigos
de crianças que há muito já não são.

terça-feira, 18 de março de 2014

EU TE AMO

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Redesenho meus olhos na folha dos teus;
minha vida faz pausa no voo das horas;
rasgo todos os véus, me desprendo, me solto
e me mostro por fora; me dou em flagrante...
Quando estou ao teu lado sou entrega plena;
tenho doce preguiça de não ser feliz;
peço bis ao silêncio pra te contemplar,
se me olhas calada e com flores nos traços...
Não há mundo ao redor dos momentos contigo
nem há chão sob os pés; muito menos há dor;
tudo fica de férias e me deixa em paz...
Pra depois nada importa, me dou à magia,
me desarmo e derramo cada sonho em ti;
não seria exagero dizer que te amo.

PRECE



segunda-feira, 17 de março de 2014

O QUE NADA MUDA

Demétrio Sena, Magé - RJ.


Não há Camões nem Platão;
nem Freire; Sócrates; Freud;
divindade, androide, pessoa;
o próprio Fernando em Pessoa...
Descarto mesmo Descartes,
Demócrito, Madre Tereza,        
qualquer certeza pensada
em letras, artes e credos...
Salomão, São Chico, Neruda,
Kardec, Pitágoras, Buda,
nem Gandhi; Maria; Jesus...
Ninguém relaxa verdades,
tem drogas contra saudade
ou habeas corpus pra cruz...

DESILUSÃO

Demétrio Sena, Magé - RJ.
 
Um dia ele percebeu que de ambos, era só ele quem propunha. Fora sempre assim. Nenhuma proposta era "de lá pra cá". Só de "cá pra lá". Nunca teve uma chance de responder. Dizer sim ou sim, como sempre seria, mas dizer. Ser solicitado por ela. Ficar envaidecido pela procura. Ter sua vez de ser cortejado.
Foi assim que outro dia resolveu trocar de margem. Remanejar os extremos. Ficar em silêncio e ver no que dava. Tinha esperança de que o silêncio faria "vir de lá" o que sempre "foi de cá". Jurava em seu íntimo que aquilo não era uma disputa, mas achava que ele mesmo nunca dera uma chance de ser o alvo; a caça. Era sempre o caçador.
O tempo se foi. Ele foi se deixando. Sua espera ganhou brio, quando percebeu que nunca "veio de lá" qualquer convite. Nenhuma proposta; solicitação. Ela não o amava; correspondia ao seu amor. Não o queria. Cedia generosamente ao seu querer. Até então, estava sempre ali. Provisoriamente ao seu alcance.
No fim das contas, ele não a tinha. Era tão somente contemplado pela preguiça do seu não... pela esmola do seu sim.

POEMINHA SAZONAL

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Se julho é breve,
parece eterno...
mas logo dorme
sob as lembranças
do próprio inverno...
A primavera,
se bem me lembro,
só mostra o rosto
bem agosto
de setembro.

sexta-feira, 14 de março de 2014

LIVRE DE VOCÊ

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Resolvi me despedir
Da despedida;
Ficar próximo do perto;
Desertar-me do deserto;
Só viver do que tem vida.
Já me calo pro silêncio
Da fala morta,
Que não diz enquanto fala,
Pois deixei de fazer sala
Atrás da porta.
Consegui me desatar
De quem se ata
Ou não ata nem desata,
Só mata o tempo
De ser ou ser...
Entendi que a solidão
É solidária,
Que nem mesmo a solitária
Será prisão
Pra quem é livre.

quinta-feira, 13 de março de 2014

DEFINITIVO

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Jamais acolhi um não como resposta enviezada e provisória de quem quer. Pode ser que seja; não sou doutor em humanidade, mas não acolho assim... como simples versão... tradução; estratégia do sim.
Para mim, um não se traduz como simplesmente um não. Aliás, ele não se traduz. É um não. É aquela semente que o meu chão acomoda, fertiliza e faz crescer sem medo; pausa; nenhum conflito.
Quem tem alguma intenção de me dizer sim, que o faça logo. Dos meus ouvidos ao coração, sim é sim. Sem sinônimo, homônimo, jogo e subterfúgio. Resposta esperada. Logo, facilmente aceita e absorvida.
Não há jogada plausível para engambelar uma pergunta ou proposta. Sendo assim, a resposta é não... se não for sim... se vier incompleta ou enigmática, "desenigmatizo" e decido assim: é sim ou fim. 

quarta-feira, 12 de março de 2014

AMOR PRÓPRIO

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Quando sou situado retorno ao meu canto;
me replanto e renasço inteiramente outro,
para quem me acomoda no ponto passivo
do caixote ou da ostra de minhas entranhas...
Se me sinto freado correspondo ao pé,
mesmo tendo certezas; verdades opostas;
tenho fé no bom senso e meus olhos têm asas
que me levam além do momento e da cena...
Valorizo a palavra, o discurso direto,
quero sempre o contexto sem traços demais,
mas aceito eufemismos; acolho pretextos...
Deixo em paz e não travo batalhas no ego;
se me sinto avisado me colho e recuo;
se não pode ser duo não será duelo...

terça-feira, 11 de março de 2014

NOSSO DIA

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Só depois de saber se quer assim
como tudo permite ou diz que seja,
diga sim ao meu sonho de nós dois
ou me veja em meus olhos pra entender...
Por enquanto se feche pra balanço,
analise o contexto das lembranças,
dê um toque de luz na solidão;
uma boa mexida em seu arquivo...
Faço minhas andanças e retorno
para ver se a paixão se preservou
ou ainda está viva nossa história...
É melhor nos calarmos no momento,
pra que o tempo nos dê sabedoria;
nosso dia não tem que ser agora...

segunda-feira, 10 de março de 2014

PARA SER GENTE

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Aprendi a me calar, quando minha voz é mal posta e cai de mal jeito em um coração armado. Quando meu ser se assusta por ter apostado no escuro. Por ter acreditado no abismo de outro ser. Ou se perdido em mais um dos mitos da boa vontade.
Mas não posso me queixar, pois meu lucro notório é saber voltar para dentro sem maiores lesões internas, quando perco meu tempo numa entrega totalmente vã. Ao permitir lá no fundo, esse desempenho de acender minha chama, para então inflamar as emoções de alguém, caso existam guardadas em algum canto.
Cheguei ao ponto em que amargo meus rancores por pouco tempo. Logo depois os deixo nos recantos sombrios onde nasceram. Nos momentos fadados a serem só momentos. Passados vencidos por este orgulho que primeiro se vence numa batalha já nem tão árdua para quem passou a não ter o mundo como cruz.
Foi o quanto aprendi, quando a vida me convenceu a ser mais humano com os seres humanos. Fez-me ver que tenho tudo a ganhar com as perdas e os danos seculares de lidar com gente... ou aprender a ser gente, como a gente precisa.

sábado, 8 de março de 2014

MULHER

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Toda mulher paira entre dois mundos e tem esse olhar atento que avança quando quer. Que recua quando lhe soa sábio. Ela tem o domínio do sonho. Da esperança universal. Da boa fé no mundo; nas pessoas.
É a mulher quem acolhe a vida em flor, mas sabe lidar com os seus espinhos. Ela tem o dom de medir seus saltos, de supor distâncias, estudar o tempo e sondar o novo. Jamais confunda, quem quer que seja, suas investidas delicadas, pois têm um arrojo especial. A precisão de um bote. A tacada ideal para quando a vida é um jogo.
A mulher dirige o fluxo da natureza. Tem a força que o homem pensa que tem. Protagoniza como quem coadjuva e tem na palma do peito quem julga tê-la nas linhas pseudovidentes da mão.
Se somos "senhores", as mulheres são "donas"... Dona Rosa; Dona Matilde; Dona Gertrudes; Dona Maria... Dona do meu, do seu, dos nossos corações carentes de seus corações. 
Diz o nosso machismo, que as mulheres não vivem sem nós... mas pobres de nós!... digo; ricos de nós!... não podemos viver sem elas não viverem sem nós...

quinta-feira, 6 de março de 2014

DELÍRIOS LIBERTÁRIOS

Demétrio Sena, Magé - RJ.

...Minha ideia de liberdade alcança o cúmulo. Toma proporção de fanatismo. Antirreligioso, é claro, pois o fanatismo religioso é inimigo da liberdade.

... Ser livre é poder dizer "nunca mais!", ainda que se diga para sempre, de forma que nunca seja "nunca mais!".

... Esticar minhas vistas e não ver a rua é ser prisioneiro. Perder o nascer e o pôr-do-sol porque um muro impede a visão do horizonte, frustra e fere minha natureza de águia.

... Somos livres... livres o bastante para sermos presos por uso impróprio da liberdade.

... Sou do tipo que derruba o muro para plantar a cerca viva, quando a ordem artificial dos tempos é arrancar a cerca viva para construir o muro.

... A liberdade me prende; me tranca fora de mim... não consigo me livrar de ser livre.

DRUMMONDIANDO:

Era livre, o pasarinho;
mas havia o ser humano
desumano
no meio do caminho.


PERDOALIDADE

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Perdoar a tudo e todos é a mais altaneira e vantajosa das humildades: atrai prestígio; admiração; referência; status. Difícil mesmo - e todos precisam fazer isso em algum momento -, é pedir perdão... é descer desse pedestal de perdoador em série para reconhecer, aí sim, humildemente, que também precisa do perdão de alguém.

quarta-feira, 5 de março de 2014

MAGIA SERRANA

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Ela traz a leveza da pluma no vento,
faz o tempo esquiar sobre a nuvem da hora,
tem o dom de ser livre no meu sentimento,
passear no meu peito por dentro e por fora...

Põe açúcar no pranto, se minh´alma chora;
faz a vida pairar, suaviza o momento,
e lhe peço em meu sonho pra não ir embora,
e no sonho sou dono do seu pensamento...

Se me ama ou não ama, quase tanto faz;
ela tem um sorriso que me deixa em paz,
uma forma de olhar que me banha de amor...

Pela sua leveza também viro pluma,
tenho calma de rio, calmaria e bruma,
tudo graças às asas do seu bom humor...

terça-feira, 4 de março de 2014

BURRICE INTELECTUAL

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Alguns intelectuais obtusos - o que é redundante, mas existe - rejeitam veementemente nas redes sociais tudo aquilo que adoram nos jornais e livros de papel: tiradas de humor, pensamentos, reflexões, tirinhas... É bem provável que para eles, o problema esteja no fato de as redes sociais terem se tornado janelas democráticas, ou como dizem, "massificadas". 
Dentro deste contexto, vem à mente a pergunta que não quer nem deixarei calar: será que lá no futuro bem distante, quando esse povo desprezado pelos intelectuais vier a se tornar um povo leitor, os intelectuais deixarão de ser? Para ser mais específico ainda: será que a chamada elite só é leitora de livros por achar que a "massa" não é?

POESIA COM POESIA

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Qualquer poema me atrai, se o seu teor me toca profundamente, com as linhas singelas da sinceridade. Sei apreciar versos brancos ou rimados; livres ou medidos; comedidos, rasgados ou fluentes. Eles precisam tão somente ser bem construídos e ter sabor autêntico de poesia.
Sempre tive prazer nos poemas vindos do ventre. Paridos antes do tempo, na hora exata ou depois da hora. Desta ou daquela forma, os poemas têm que ser naturais. Não podem nascer de cesariana, porque isso inclui ferramentas, parafernálias, recursos artificiais. Esses recursos, que incluem   mergulhos doentios nos dicionários, para fins de rebuscamento que substituam a inspiração, só danificam. Geram poemas bizarros; retorcidos; Frankensteins literários, sem estrutura confortável.
Excluindo essas cirurgias, composições forçadas mutantes do poema, sempre amei os versos ditos perfeitos pelos puristas das letras... mas também os versos mancos; de pés quebrados; coxos. Admiro a poesia exata (porém fluente, natural) do poeta "roxo", e também a volátil, descomprometida e marginal do poeta cigano, que despreza regras; réguas; retas; gráficos; leis.
Qualquer poema me atrai, quando não me trai. Quando não se revela poema para depois se mostrar uma farsa travestida como poema... equação rimada... raiz quadrada literária. Comoção teatral, poesia desidratada ou apenas a louvação mecânica da estética. 

segunda-feira, 3 de março de 2014

CHANCE

Demétrio Sena, Magé - RJ.

A leveza me atrai; a cruz me afasta;
caminhar tem que ter desenvoltura;
quem arrasta uma carga de si mesmo,
terá cura; mas há de querer muito...
Só não conte comigo, pois sou leigo,
faço amigos, não trato pacientes,
quero amores, não frentes de conflitos,
descobertas e não exumações...
Tenho muita preguiça de pessoas
que se agarram à sombra de morrer
entre ser e não ser; só por questão...
Quem me chama terá que se soltar
não por fuga, esperteza ou habeas corpus,
mas por dar uma chance à própria voz...

domingo, 2 de março de 2014

DA PALAVRA

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Sempre fiz da palavra o meu porto seguro,
minha arca, meus bichos, terra prometida,
no dilúvio das mágoas, paixões e saudades;
minha dor preferida; tristeza feliz...
Navegar nas palavras me aporta no sonho,
me distrai de morrer, me prolonga e põe asas,
faz do mundo este aquário dos olhos de crer
nas pessoas; no tempo; no dom de seguir...
Ser o deus da palavra do céu que desenho,
ter amor ao que tenho e poder decantar,
possuir as não posses da vida comum...
E poder reciclar esse nada em meu ser,
é meu show pra mim mesmo nesta solidão;
a palavra me salva de não ser quem sou...