segunda-feira, 28 de novembro de 2016

PAPEL DE PRESENTE


Demétrio Sena, Magé - RJ.

Apostei no que fomos, o meu afeto mais sincero e profundo. Fiz isso, até já não sermos. Foram anos e anos de sonhos que eu poderia julgar em vão, mas não o faço, porque mesmo assim fui feliz... porque tive a miragem que gerou raiz em meu coração, cresceu e deu frutos. 
Sou quem viveu de verdade; quem se doou de fato, porque fiz da quimera um enredo perfeitamente palpável... meu aqui, meu agora, o presente futuro num papel de presente que a saudade sempre afagará, das mais doces formas de nostalgia. Terei sempre o que reviver, para ser feliz de novo, junto ao ser feliz como sou neste momento, pelo meu poder de acreditar.
Hoje, além de viver do presente, usufruo dos juros daquelas juras de afeto, que saíram falsas de seus lábios e chegaram reais ao meu íntimo. Preservei o que fomos, e o faço quando já não és. Tenho asas para voltar ao passado somente meu e suprir a esperança de um novo dia, cada vez que os meus olhos se fecham para uma nova noite no céu das minhas expectativas.
Enquanto perdias tempo enganando a ti mesma, ganhei tempo construindo história. Renovei meu império sentimental, enriqueci ainda mais meu mundo, e fui ao centro de tudo para me reaver; me recriar. Pesquei para mim, todos os tesouros do tempo que perdeste.

CONFIDÊNCIAS


quinta-feira, 24 de novembro de 2016

RENASCER

Demétrio Sena, Magé - RJ.


Quem serás logo após é mistério sem fim;
sempre foste quem nunca saberei se és;
teu olhar de viés é a única estampa
que meus olhos distinguem cada vez que olham...
Gostaria de achar o teu eu verdadeiro,
desvendá-lo após tanto que julguei fazê-lo,
já enxugo teu gelo há mais tempo que posso
e me canso da caça dessa identidade...
Sei que vou te arrancar da zona de conforto
que meu sonho mantém desde quando não sei,
feito lei ou princípio, tradição de afeto...
Se me faço de morto pra todos teus eus,
desocupo meu eu e renasço em meu chão,
darei fim ao refrão dos teus tolos conflitos...

terça-feira, 22 de novembro de 2016

AUTORRETRATO

Demétrio Sena, Magé - RJ.


Hoje acho que achei o próprio rosto;
meu espelho reflete a minha imagem;
se me olho já sei, não é miragem,
tenho forma, textura, cheiro e gosto...

O que fui até ontem foi viagem,
pois não tinha raiz, um cais, um posto,
cada eu era um vulto ao caos exposto,
só estava ou só era de passagem...

Esse ontem faz tempo que já era;
já me tenho, apesar das estações,
entre as quais desenhei a primavera...

Desde quando cresci, mesmo depois
do meu tempo e das minhas mutações,
sou quem sou como quatro é dois mais dois...

sábado, 19 de novembro de 2016

MEDO DO ADEUS


Demétrio Sena, Magé - RJ.



Não te arranques de mim; será feito extração
dos meus dentes, os cílios, até meu tendão,
minhas unhas, os olhos, pentelho a pentelho,
e tirar o narciso da frente do espelho...
Se te arrancas de mim, perderei a noção
da verdade, o caminho, qualquer direção,
será como assaltar meu juízo já pouco,
me levando à loucura sem deixar ser louco...
Eu te peço, não partas, não me partas tanto,
que serei feito céu que não tem nem um santo,
um inferno vazio, sem fogo e demônio...
Meu apelo é de corpo, de alma e neurônios,
não te arranques de mim; vai doer no meu chão,
feito braço amputado pelo tubarão...

quinta-feira, 17 de novembro de 2016

CARAPUÇA UNIVERSAL


CIDADÃO ÍNTIMO


Demétrio Sena, Magé - RJ.


Não me privo de uma boa trama televisiva, quando há, só porque um sujeito me disse, depois que alguém lhe disse após ouvir de outro alguém, que novela emburrece. Nem procuro em outra emissora, o telejornal recomendado por quem desqualifica o daquela, que o desagrada, só porque desagrada ao grupo que ele segue, mas que não é menos corporativa, manipuladora nem politico partidária, pouco importa para que lado atue.
Livre como sempre fui, posso ver o programa que desejo, no canal que desejo, e saberei desprezar o que fere meus princípios; não os de quem procura depositar na minha conta os seus interesses; ideologias; rejeições; despeitos. Do folhetim ao futebol, do noticiário ao reality show, do filme ao programa de auditório, nada me prende nem assusta. Sei muito bem discernir por minha conta o que será proveitoso, relevante ou não.
No dia em que eu não tiver o controle nem do controle remoto do meu televisor, aí sim; não serei o cidadão pleno que o militante raivoso e pré-moldado se diz, mas está longe; muito longe de ser.

domingo, 13 de novembro de 2016

EM CONSTRUÇÃO

Demétrio Sena, Magé - RJ.


Já não tenho certezas; isso é bom,
porque são as certezas que nos secam;
que nos tornam estátuas do saber;
tábuas frias de leis petrificadas...
Foi difícil saber que nada sei;
quanto mais incertezas, mais ação;
sei que morro, mas depois de viver
e levar os meus tombos por aí...
Era tanta certeza, que os meus braços
não queriam senão ficar cruzados;
os meus passos romperam com os pés...
Por não ter mais certezas digo sim,
vou ao fim que não vem pela metade,
quando minha verdade se constrói...

quinta-feira, 10 de novembro de 2016

TEU...


Demétrio Sena, Magé - RJ.


Fui mais teu do que a voz é do tenor;
do que a dor é da carne, o dom da alma;
ou a palma da mão, a paz do monge,
mais que o longe pertence ao vasto azul...
Era teu como a farsa dos poderes,
como nunca fui meu com tanto empenho,
um engenho pertence ao seu senhor
e ao mesmo senhor pertence o servo...
Na verdade nem sei como fui teu,
mas fui mais do que o sonho é do poeta,
do que a reta se rende ao horizonte...
Só eu sei como eu era, e quão não sei;
tão sem lei, tão além do que se é;
fui mais teu do que a fé não é do ateu...

terça-feira, 8 de novembro de 2016

TODO TEMPO DO MUNDO

Demétrio Sena, Magé - RJ.


Aprecio, sobremaneira, esse tempo generoso que o meu emprego me dá, para conviver com a família. Para fazer meus poemas; minhas crônicas... exercer a criatividade, remunerada ou não, sem as rígidas obrigações de horários e obediências.
Mas, o que mais temo na vida é ter todo tempo do mundo. Por isso, além de precisar do meu trabalho formal, por questões específicas de sobrevivência, preciso dele para não ter tempo a desperdiçar com o que não é relevante. Às vezes, com o que pode até aviltar minha índole.
Ter todo tempo do mundo extrapolaria os espaços de convivência e criatividade. Seria um convite aos excessos do comportamento; às invenções fúteis; à prática da intromissão. Eu me tornaria invasivo; maledicente. Vigia ilegítimo da rua; do condomínio; da comunidade. Deixaria de reconhecer o alheio e diria gracinhas recorrentes às filhas e mulheres dos outros. Faria brincadeiras de mau gosto com a vizinhança, e saberia mais do que preciso e convém, sobre tudo e todos ao meu redor.
Não quero todo tempo do mundo, porque nenhum ser humano está preparado para isso. Já é de bom tom esse tempo bem dividido entre as obrigações, os prazeres, as criações e o repouso. Todo tempo do mundo poria os meus sonsos demônios para fora, com a missão de provocar os francos demônios que habitam outras pessoas, e levaria o próximo a me querer distante.
Ademais, ter todo tempo do mundo é dispendioso para quem, no fim das contas, paga a conta. Só se tem esse tempo com o patrocínio de alguém que julga fazer um bem tamanho, mas contribui para que o favorecido não cresça; não amadureça; não se torne um ser social. 

SOLITÁRIA LEI

Demétrio Sena, Magé - RJ.


Começaste a ter medo, ao constatares minha coragem de amarrotar os vincos. Derrubar meus segredos. Fazer as miragens ganharem formas.
Já nos meus últimos dias da ilusão contigo, desconfiavas da minha confiança em ti. Da confiança que eu tinha em tua confiança em mim.
Quando mergulhei mais profundo, retiraste o rio. Foste ausência, quando me fiz mais presença. Tua oferta não estava pronta para tanta procura.

sexta-feira, 4 de novembro de 2016

VIDA PLENA


Demétrio Sena, Magé - RJ.


Uma vida não pode ser metade,
não importa o seu tempo, seu tamanho,
ela tem a verdade que lhe cabe
na medida e no sonho que alimenta...
Longa, curta, uma vida seja plena;
tenha o justo limite da missão;
pés no chão, pensamentos no infinito
e a velha certeza de quem somos...
Todos nascem completos, definidos,
nossa história já chega desenhada,
não há nada que a torne meia história...
É preciso saber deixar saudades
rubricadas, completas, isso é vida
que a partida não tem como partir...

quinta-feira, 3 de novembro de 2016

PRECONCEITOS


Demétrio Sena, Magé - RJ.
O pior tipo de preconceito é aquele que se vale dos tons amenos, conciliadores e até simpáticos, bem humorados, para não parecer preconceito.

CIÊNCIA E PRAZER

Demétrio Sena, Magé - RJ.


Nunca deixe de fazer aquilo que lhe faz bem, só porque não existe comprovação científica de que aquilo que lhe faz bem lhe faz bem.

terça-feira, 1 de novembro de 2016

O ÚLTIMO EPISÓDIO

Demétrio Sena, Magé - RJ.


Basta. Não dialogo mais com seus monossílabos. Nossos diálogos migram a cada dia, para monólogos invariavelmente meus. Monólogos são espetáculos teatrais, e ao fazê-los para uma plateia também invariável, de apenas um expectador, sinto que perco tempo e dinheiro. 
Para dizer a verdade, sei que não sou um bom ator. Isto só pode significar que você é gentil. Muito gentil. Faz das tripas coração para me dar audiência. E no fundo, eu é que teria de pagar por tamanha gentileza, pois ao ver por outro ângulo, reconheço: quem atua mesmo é você.