segunda-feira, 12 de novembro de 2012

NOSSA MARIA


Abateu as hienas e os leões que sempre tentaram frustrar nossa trajetória incerta quanto ao futuro. Caminhou muito além do que todos esperavam. Ultrapassou a barreira dos senões de uma vida cujos caminhos tinham pedras... Muitas pedras... Cujos sonhos do simples dia seguinte foram cercados por espinhos... Incontáveis espinhos.
Era meiga e longânime. Suportava os pesos e as desmedidas de sua missão, sem qualquer queixa. No entanto, era bicho feroz; tinha garras e caninos contra golpes, tocaias, alçapões e vilanias em nossa direção. Sempre que o mundo marcava seus meninos e meninas, ela se punha de frente. Não temia covis nem batalhões que nos ameaçassem.
Foi a nossa Maria imaculada em seu amor. Cheia de graça entre as desgraças que nos rodearam por toda a infância. Sabia multiplicar o fruto escasso do seu trabalho árduo para nos manter. Nas muitas vezes em que as moléstias quase nos dizimaram, brigou contra seu Deus, no qual sempre acreditou, mas teve raiva da moleza divina. Das respostas demoradas. No fim das contas, a sua fé foi tanta; seu amor foi tão enérgico e marcado de atitudes, que voltamos à vida por conta e risco desse milagre.
Tivemos a mãe que pontua o sonho de milhões de filhos. Que sublimou e suprimiu a mulher, porque não podia ser as duas, em nome de nossa sobrevivência. Se teve uma vida que pudesse chamar de sua, fomos nós essa vida. Ela respirava os filhos... E se um desses filhos lhe faltasse, tudo perderia sentido, porque não fomos dez. Fomos apenas um.
Ela nunca percebeu que ficamos adultos. Que chegamos à meia idade, progredimos, ganhamos vida própria. Permaneceu vigilante, mesmo quando perdeu as forças físicas, pela doença que não demorou a levá-la. Mas no fundo, no silêncio de minha saudade, ainda sinto – sentimos todos – que o seu amor continua nos resguardando.

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