sexta-feira, 29 de maio de 2015

OS GÊNEROS E O AMOR

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Bem mais profundas e sinceras, as mulheres veem antes o que vai por dentro. Depois partem pro exterior, do qual gostam, por já amarem. Mais fúteis e visuais, os homens veem antes o que vai por fora. Depois partem pro interior, do qual gostam, também por já amarem.

Mulheres amam de dentro pra fora. Homens amam de fora pra dentro. Fazem do amor seu lugar comum, pelo que um dia esse desencontro acaba e ambos se acertam com seus defeitos e as eventuais virtudes.
Evidentemente, falo de amor. De quando se ama e se deixa amar. Afora isto, ambos os gêneros são seres humanos, e conhecemos bem nossa natureza... principalmente quando a solidão domina.

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quinta-feira, 28 de maio de 2015

RELAÇÕES ENCANTADAS

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Faz falta na trajetória de um ser humano aquela pessoa do gênero oposto e da mesma faixa etária, com a qual não se tenha quase ou nenhuma cerimônia. Pessoa cuja convivência conosco seja tão estreita que não encaixe mais ninguém, pela exclusividade. Pela história de muitos anos. O carinho inexplicável e a confiança irrestrita em ambos os lados... suficiente para que não haja distorções, melindres e o velho alto lá, que só ocorre quando quem se desarma o faz sozinho. Aí não vale a pena. Terá sido engano. É melhor desmoronar, para estabelecer a amizade comum com todos os filtros, escudos e armaduras que já conhecemos.
Essa relação tão necessária para todos nós é algo mesmo secreto, embora não exatamente oculto. São ocultas as nuances, as particularidades e a natureza única; os momentos bem íntimos, ainda que olháveis em derredor, por olhos que não podem alcançar o que vai além da imagem. Os alguéns desse tipo de relacionamento são restritos; raros; específicos. Não são colegas, amigos do dia a dia, e ninguém jamais queira ter esse nível de cumplicidade com o par romântico ou o cônjuge. Namorados ou cônjuges estão bem longe de ser as pessoas adequadas para nos conhecerem tão sem véus. Isso abala o romance. 
Ter essa pessoa confidente, alguém tão íntimo com quem não faz sexo, não divide as responsabilidades ou preocupações nem discute relação é algo mágico. Isso não cabe numa convivência com ranços de ciúme, cisma de traição nem no histórico de sofrimentos de uma vida em comum. Só cabe onde se dividem afeto, fantasia, momentos rasos ou profundos, porém sempre de prazer. Nunca o envolvimento que deságua no lugar comum dos laços de carne, futuramente formais, ainda que só na intenção de um dos lados.
Mora nisto, especificamente, a natureza rara desse relacionamento. Ele só se deixa encantar. Não quer o desencanto, a decepção, o rompimento nem a chance de pensar no fim. Torna-se profundo, mas não pesado. Não é tirano, vigilante ou cobrador. Sua exclusividade vem da própria natureza do ser humano que não tem espalhadas pelo mundo algumas dúzias de almas gêmeas; tão gêmeas quanto não são as que assim nomeamos comumente.


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quarta-feira, 27 de maio de 2015

AFETO EM QUEDA

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Se te assusta o carinho nos meus olhos,
meus desvelos te fazem recuar,
o luar do silêncio entre palavras
que aveludo em meus lábios te acautelam...
E também não entendes algum gesto
que dispõe um descuido, algum desleixo,
porque deixo aflorar a natureza
de quem pousa, confia e deixa estar...
Desconfias da minha confiança,
meu afeto sem armas, armadilhas,
minhas trilhas em busca de atenção...
Chego ao ponto final do bem querer,
me retiro em secretas retiradas
dos valores poupados na ilusão...

terça-feira, 26 de maio de 2015

ANDEI PENSANDO POR AÍ...

Demétrio Sena, Magé - RJ.


... A perfeição não existe, mas existe um caminho para ela. Quem tenta segui-lo, só pela tentativa já é alguém melhor.

... Se quase ninguém gosta de mim, a pergunta que não quer calar é a seguinte: quem precisa mudar; eu ou quase todo o mundo?

... O que seria do estúpido, se não fosse o seu próprio diagnóstico de bipolaridade...

... Às vezes é preciso escolher entre mudar ou mudar... mudar de atitude ou de ambiente.

... Pare um pouco para pensar por que você pensa o que pensa sobre determinados assuntos. Só assim será possível descobrir se é você mesmo quem pensa ou alguém que você idolatra pensa por você.

... Não cometa o erro de ser sempre o certo.

... Para quem não presta ninguém vale nada.

... Não gostar de alguém porque alguém de quem gosto não gosta é uma forma injusta, insensata e burra de não gostar.


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segunda-feira, 25 de maio de 2015

MEMÓRIA DO ÂNUS


Demétrio Sena, Magé - RJ.

Por ser pobre como era, Francisco Sem Sobrenome muitas e muitas vezes limpou a bunda com sangue. Sangue de guerras e conflitos. De gente assassinada. Dos mortos e feridos em hecatombes, terrorismo e protestos reprimidos.
Limpou a bunda com a ditadura. Com a instituição do AI-5. Sujou de bosta os prisioneiros políticos e os governos militares em suas fardas engomadas. Pôs coliformes fecais nos discursos patriotas da direita, nos informes contidos da mídia escassa e amedrontada e também nos manifestos clandestinos da UNE. Por absoluta miséria, sua bunda foi democrática; impunemente democrática em tempos de repressão.
Não acreditava que pudesse, mas viveu o bastante para limpar a bunda com a anistia política. Com o retorno ao Brasil, dos políticos e os jornalistas; dos artistas e os escritores. Dos milhares de outros exilados em todo o mundo. Sem nenhuma cerimônia, esfregou na vala do seu corpo imundo e sem tratamento as mais famosas caras e bocas. Inclusive de presidentes da ONU e da UNESCO. De ganhadores do Nobel da Paz. Dos mais expressivos líderes religiosos do planeta e daquelas famosidades repentinas que se autointitulam célebres.
Cansado, idoso e sem qualquer esperança, Francisco Sem Sobrenome viveu até bem pouco tempo, ainda pobre. Muito pobre. Por trágica ironia, recentemente limpou a bunda com tanta, mas tanta corrupção mesclada com promessas de um país melhor, que nem soube como suportou! Isso foi mais duro do que a repressão, para ele que acreditou tanto na democracia e seus ícones, agora no poder, todos ladrões. Poluiu mais ainda o seu canal, com as novas formas de mentira, hipocrisia e desgoverno.
Limpou a bunda, como sempre haverá quem limpe, com a fome no Brasil e no mundo. As epidemias. O avanço da violência. Balas perdidas, revoltas populares e poucas; bem poucas notícias boas, porque boas notícias nunca circularam muito. 
Dia destes, Francisco Sem Sobrenome limpou a bunda e morreu. Não sei se de velhice ou intoxicação anal por tanta informação imunda. Só sei que ninguém vai limpar a bunda com sua morte. Afinal, pessoas como ele passam em branco pela vida. Mais em branco do que papéis higiênicos de luxo, cujos rótulos nunca foram lidos por bundas indigentes.

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quinta-feira, 21 de maio de 2015

DESCARINHO

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Ia sempre sondar se estavas bem,
como foram as horas dos teus dias,
se ninguém te feriu nem com palavras
ou descuidos de alguma natureza...
Era bom esquiar no teu semblante,
passear na ilusão de que me vias,
ler na folha do instante o meu poema;
meu diário das gotas do teu ser...
Pouco a pouco senti a solidão
do carinho, dos olhos, das palavras, 
do meu chão e dos passos de costume...
Recolhi estes pés que me levavam
ao encontro contínuo do deserto;
cada dia mais perto da distância...

O ABISMO DA SAUDADE

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Hoje volto a sentir aquela falta
mais intensa, profunda e consistente,
minha mente vai lá pro coração
e deságua o volume das lembranças...
Um vazio se alastra na garganta, 
vem a lágrima e finjo que não vem,
mesmo estando em completa solidão,
muito aquém do que podem me flagrar...
Fico meio abstrato e sem contorno,
desintegro a visão d que se vê,
meu entorno me solta e deixa vir...
Acordei entre teias de saudades
quase físicas, quase de argamassa,
numa praça de sonho e nostalgia...

segunda-feira, 18 de maio de 2015

SUJO DE FLOR

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Era uma rua fétida. Insuportável: viam-se pelo chão, velhas fraldas imundas; ratos mortos; muitas poças de lama em dias de chuva, e muita poeira nos dias ensolarados. Às margens, o capim crescia desordenado e cobria uma vala que a prefeitura nunca fazia manilhar.
O agradável contraste naquela rua era o belo quintal da professora Janice. Via-se pela cerca de arame uma grande área de chão arborizado. As árvores eram nada menos do que alguns pés de flamboaiã que se mantinham floridos quase o ano inteiro. Eles cobriam de pétalas o chão arenoso e grato por tamanha beleza. 
De vez em quando a professora Janice era vista mal humorada, vassoura em punho, varrendo as flores que atapetavam o chão de seu tão belo quanto admirado quintal. Admiração não somente pelas flores, mas também pela sombra extensa, com leves pitadas de sol que tornavam tudo mágico. Era mesmo impossível passar pelo quintal da professora Janice e não dar uma boa olhada.
Passei um bom tempo sem ir ao bairro em questão. Logo, sem admirar o quintal da rua imunda. Quando voltei a passar por lá, foi grande a surpresa pelo que vi: o quintal da professora Janice, agora cercado por um muro de pouco mais de um metro e meio, não tinha mais as árvores. Como não resisti, aproximei-me para ver melhor e vi o chão todo pavimentado, sem nenhum arbusto; nenhuma roseira; maria sem vergonha... qualquer planta. 
Finalmente, o imóvel da professora estava mais imóvel do que nunca: não tinha vida; os pássaros foram embora; também se foram as borboletas. Restou a casa, bem mais ampla e luxuosa, cercada pelo chão pavimentado e quente, além dos banquinhos de cimento expostos ao sol torrencial.
Curioso, perguntei a um menino da rua imunda se a professora Janice não mais morava no local. Ele respondeu que sim. Encorajado por sua boa expressão, me deixei indagar se ele sabia o motivo de a professora ter mandado cortar todas as árvores do lugar.
- Olha, moço; saber, mesmo, não sei não... mas ela vivia reclamando porque as árvores davam trabalho... deixavam seu quintal todo sujo de flor.

sexta-feira, 15 de maio de 2015

TUDO É ÁGUA


Demétrio Sena, Magé - RJ.


Água que lava
e abriga larva
que vira inseto...
Água que falta
e também medra.
Enche os riachos,
invade as casas
e fura pedra...
Água que afoga,
também afaga
e fertiliza...
Água pesada
que adia o jogo.
Supre a baía,
gera energia,
pois água é fogo.

FIM DE NOVELAS

Demétrio Sena, Magé - RJ.

As novelas perderam todo enredo;
não há drama real nem fantasia;
nada é sério nem tem senso de humor
ou amor; ou mistério; tudo é fútil...
Ver novela é costume de ver algo
e manter olhos fixos na tela,
ser fiel ao cardápio da emissora
por preguiça de sair do canal...
Acabaram-se os dramas convincentes,
os olhares e os gestos verdadeiros,
textos plenos, vertentes criativas...
Não há mais a novela como a vida,
nem a história vestida de magia
que nos leve a sonhar além da trama...

BELOS DIAS MORTAIS

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Hoje o dia nasceu belo. Mais uma vez, irremediavelmente belo. Um céu profundo, maravilhosa e distantemente azul. Belo de morrer... ou de fazer morrer.
O sertanejo, de olhar também distante, mas não azul, para e olha pro nada. Quem sabe tenta não ver, ali bem perto, as carcaças mortas e ainda vivas do gado que um dia ele tangeu para lugar nenhum. Esse mesmo lugar nenhum em que agora descansa não por cansaço, mas por desânimo. Por não haver mais do que se canse.
Por mais belo e azul, pouco importa. O céu não seduz o sertanejo. Desmancha em seu coração a esperança do dia feio... turvo... do céu cinzento e triste com que ele sonha. Só a tristeza de vários dias sombrios e molhados será capaz de alegrar o chão agreste... alegrar e florir. Fazer parir o pomar e o pasto... gerar o milagre da ressurreição.
Os dias belos e alegres, e o céu azul do sertão geram medo e revolta. Levam trevas, angústia e desespero ao coração sertanejo.

terça-feira, 12 de maio de 2015

MEU SEM QUERER

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Como a quero não tem lugar pra culpa,
não há buscas, tocaias, tentativas,
minha lupa se mira na distância
e me faz entender o meu lugar...
Só a quero, não quero nada mais,
nenhum passo a caminho do fazer,
do prazer que não seja o de sonhar
ou tecer fantasias improváveis...
Quero a troca de olhares e silêncios
que não podem ser lidos nem pescados,
meus pecados etéreos pelos seus...
Quando muito, a serena interação
de algum gesto remoto, inconfessável,
sem ação no querer de quem não quer...

segunda-feira, 11 de maio de 2015

DONO DOS MEUS PÉS

Demétrio Sena, Magé - RJ.



Sorrirei meus sorrisos; não esses da moda;
tenho sins, tenho nãos que ninguém me vendeu;
não entrei numa roda, uma gangue, uma tribo,
e só colho alegrias que vêm do meu chão...
Sigo minhas verdades, não tuas cartilhas,
vejo pelos meus olhos, não à luz dos teus,
há um "Deus" que não ouço nos discursos vãos
dessas milhas e milhas de palavras vagas...
Aprendi a trilhar um caminho escolhido,
quando a noite governa me deixo brilhar
sem excesso de luz; abuso de neon...
Céu e terra são palhas da minha cabana,
falharei meus acertos acertando as falhas
mais humanas e fundas do meu bem viver...

domingo, 10 de maio de 2015

GENERALIZAÇÃO DO COMPLEXO CORAÇÃO DA MULHER

Demétrio Sena, Magé - RJ.


Se você me aceitar, meu bem querer, prometo que não serei prestativo, grudento, apaixonado e presente o tempo todo. Muito menos do tipo sincero e manso, contido, fiel, dedicado e meigo... cidadão honrado e acima de qualquer suspeita.
Posso até lhe jurar, e se preciso, gritar para o mundo inteiro ouvir, que serei um cachorro sem vergonha. Vira lata sem coleira. Sujeito vagabundo, indecente, mentiroso e sem palavra. Sonso, irresponsável, cara de pau, sem a menor consideração.
Seja minha e prometo não decepcionar. Não serei seu. Pode me amar sem temer o meu amor. Curta o mais profundo possível seu sentimento. Sinta suas dores e sirva o meu prazer, com a certeza de que não sou nenhum estraga prazeres.
Ofereço-me como a razão de seus tormentos e dos momentos de mágoa, dúvida, solidão, ciúme ou fúria. Tão apenas me queira, e prometo ser o tipo de homem que machuca e conquista... que jamais entedia o complexo coração de uma mulher.

quarta-feira, 6 de maio de 2015

A CRÔNICA DO MURO


Demétrio Sena, Magé - RJ.


Justo quando saio às pressas e não levo a minha câmera, o que raramente acontece, um grande motivo fotográfico assalta os meus olhos, em uma esquina distante. O que me resta é a transcrição paciente, sob os olhares curiosos de quem passa por mim.
Em um velho muro que o tempo castiga sem piedade, com os efeitos do sol, do vento e a chuva, leio a mensagem anônima que disponho a seguir: "Comunico aos familiares e amigos, que já não há mais motivo para sumiço, distanciamento e silêncio. Aqueles meus problemas foram resolvidos, não contraí novos problemas, minha saúde anda perfeita e vou bem, financeiramente. Logo, não existe mais o risco de choradeira e pedidos de socorro, empréstimo e locomoção motorizada. Apareçam; amo vocês.".
Quis fazer uma crônica sobre o assunto. No entanto, seria chover sobre o molhado. A crônica está na própria mensagem, sem necessidade alguma de aplicações ou adornos. Para quem sabe ler o mundo e a vida, cada momento já é uma crônica.

terça-feira, 5 de maio de 2015

SOBREVIDA

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Quando o tempo sulcar a minha pele,
corroer as entranhas e a memória,
minha história verter a sua cor
e meus ossos perderem todo cálcio...
Na tardinha do mundo sobre os anos,
no momento em que a vida oxidar,
onde as perdas e os danos derem mostras
dos alqueires finais de meu caminho...
Não me deixem virar um Frankenstein,
pelos cortes, costuras, agonias
por uns dias de vida como esmola...
Quero ser um pardal que pousa e dorme
ou a folha que seca sem alarde;
uma tarde chuvosa que anoitece...

COLCHA DE RETALHOS

Demétrio Sena, Magé - RJ.
Nascerei outra vez, e dessa feita,
quando passo do meio da jornada,
minha idade serena já se vê
sobre o nada; num lento voo livre...
Tenho medo, mas tudo mostra o fim
que me assalta, me pega pelo meio,
porque veio disposto a me acordar;
quer meu sim; não aceita meu talvez...
Redesenho a jornada, volto ao chão,
me replanto e não sei como será;
quem serei; que será do que já sou...
Foram tantas as mortes, tantas vidas,
tantas idas, atalhos recomeços,
que o que sou é uma colcha de retalhos...