segunda-feira, 31 de outubro de 2011

MANIA DE NÃO GRANDEZA


O riacho me atrai, o mar nem tanto;
quero canto e me esquivo da cantata;
ter a lua na poça me contenta
muito mais do que auroras efusivas...
Meu momento resume a eternidade,
para mim o infinito está na esquina,
tenho mina de sonhos moderados
pelos quais tudo é pouco, mas é meu...
Nunca fui de cavar apoteoses;
entre as trevas e a luz quero a penumbra;
a mangueira me serve de mansão...
Conto estrelas enquanto não me cansa,
depois deixo que o sono feche o céu
na bonança da conta que perdi...

NATURAL DE LUGAR NENHUM


Gosto até de viver, mas não faço loucura,
meu apego tem senso do próprio limite,
sou aberto à sutura da brecha dos anos
e não acho antipática a cara do fim...
Tenho cá meus prazeres, mas nada incurável;
nunca tive o planeta como propriedade,
como pouco me toca se há céu ou seol;
acho mais atraente a previsão do nada...
Sei olhar de bom prisma o retornar ao pó
no silêncio e na calma duma noite morna;
sob a paz solitária do convite aceito...
Minha felicidade não decide o plano,
jamais tenho exigência para o que não sei,
sigo a lei natural do que terá que ser...

FUGA FICANTE


Se me deixas partir e repor minha vida,
recompor o meu barro e salvar a verdade,
poderei qualquer dia inverter a partida;
dar um golpe certeiro e depor a saudade...

Caso tenha o poder de serrar esta grade
que me faz amargar emoção recolhida,
saberei certamente o que ao âmago invade;
se depois me curar não terei recaída...

Só não posso esperar, numa fuga ficante,
feito livro encardido largado na estante,
que meu tempo me anule à medida que passa...

Quando chega o momento em que se apaga o fogo,
tudo a dois se transforma num  tipo de jogo
em que todos os lances envolvem trapaça...

FUGA FICANTE


Se me deixas partir e repor minha vida,
recompor o meu barro e salvar a verdade,
poderei qualquer dia inverter a partida;
dar um golpe certeiro e depor a saudade...


Caso tenha o poder de serrar esta grade
que me faz amargar emoção recolhida,
saberei certamente o que ao âmago invade;
se depois me curar não terei recaída...


Só não posso esperar, numa fuga ficante,
feito livro encardido largado na estante,
que meu tempo me anule à medida que passa...


Quando chega o momento em que se apaga o fogo,
tudo a dois se transforma num  tipo de jogo
em que todos os lances envolvem trapaça...

NINGUÉM SABE DE NADA


Pode ser que das coisas que penso que sei
nada seja o que penso, portanto não devo
decidir que se cumpra o que tenho por lei;
dar às minhas verdades função de relevo...

As pessoas não têm que dançar o meu frevo
nem seguir o que dito, compor uma grei
que defina esta vida justo como escrevo,
torne o mundo meu reino me aclamando rei...

Mas também não me peçam que siga receitas
dumas crenças ou ordens, de cultos e seitas,
qualquer cópia passiva de um conto-de-fada...

Sei que sei muito aquém do que às vezes ostento,
entretanto as notícias que chegam no vento
são do quanto ninguém nunca soube de nada...

AZEDUME


Nosso encanto quebrado consagra o tropeço
que fechou a questão sobre nossa verdade,
já não tente forjar o milagre do gesso
modelando a quimera de sua vontade...

Quanto a mim sei há tempo dessa novidade
com que tanto sofri que me pus ao avesso,
mas enfim é seu tempo de sentir saudade
sem haver como escape de pagar tal preço...

Fomos contos que as fadas perderam de vista,
sonho bom que fugiu sem deixar uma pista
que legasse uma chance, vislumbre que fosse...

Não restou em meu peito sequer nostalgia,
sua mágica em mim perdeu toda magia
e se fez azedume o que outrora foi doce...

SALÁRIO MÍNIMO

Já está decidido o novo salário mínimo... Ficou bem ao gosto do salafrário máximo.

NÓS E OS NÓS


Precisamos vencer este vício da espera,
da esperança calada, intocável, verdinha,
nesta imensa quimera dos "Cristos" das urnas
ou heróis populistas que surgem do nada...
Temos armas mais fortes do que reza e fé,
do que o manso exercício da democracia,
"pé atrás" ante o sonho que requer de nós
a porfia mais dura do que se previu...
Somos nós onde os nós nos parecem mais cegos,
quando pomos os egos atados aos brios
e destinos sombrios não nos intimidam...
Basta sermos tão fortes quanto a má vontade
que povoa os palácios de qualquer poder,
para não se perder a verdade sonhada...

SEM DECÊNCIA


A minh´alma se ajeita pra corresponder
ao que tenha que ser, pos não dá pra fugir;
eduquei o meu corpo, estou pronto a doar
sem amar, sem sentir, sem querer o retorno...
Pela vida interposta que tens como trunfo,
tua grande chantagem, bilhete de aposta,
por achares que assim farás bem ao teu ego
não me nego, me rendo e respondo que sim...
Mas não queiras essência, somente atitude,
nem exijas virtude, verdade ou decência,
compromisso afetivo; efetivo te baste...
Sou ausente presença por convocação,
doação compulsória que tornaste lei
por cumprir e fazer-te mocinha da história...

CURVAS

Descuido ao volante:
Não atentou pro perigo
das curvas da moça.

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

ARCÁDIA QUASE DENTÁRIA


Como acadêmicos da escrita, costumamos condenar à fogueira os escritores menos ortodoxos. O que nem sentimos, de tão dormentes que somos, é que a fogueira das vaidades há muito nos consumiu, matando-nos de tanta pretensa imortalidade.
Prova disto é que hoje só somos reconhecidos por nossas "arcádias" escancaradas pro nada, mastigando a solidão em que jazemos num mundo que nos ultrapassou. "Arcádias" quase dentárias, rangendo contra toda espécie de autonomia nas letras e desclassificando indiscriminadamente o que soa espontâneo.
Somos nós, acadêmicos, o ranço inquisitório da igreja medieval que impunha um Deus tirano e cruel. Inquisidores literários, impomo-nos como deuses de prosa e verso, numa redoma que está bem longe de ser o reino dos céus. Por essa pretensão arrotamos decidir quem será salvo e quem ficará no limbo das letras por não rezar pela nossa cartilha rococó.
Enquanto isso, poetas e prosadores livres e desimpedidos continuam renovando o mundo e nos tornando cada vez mais ultrapassados. Produzem obras bem mais expressivas do que o fazemos e dispensam esse fardão ideologicamente geriátrico sob o qual nos escondemos das novidades assustadoras. Do bicho-papão da consciência dessa validade vencida em nós.
Nossas portas precisam se abrir pro mundo. Nossas mentes também. Temos que abrir os braços para este século, acolhendo as diferenças; reconhecendo os valores humanos e literários que se opõem aos nossos... E aceitando, sobretudo, que não somos modelo de conduta.

TRANCADO


Uma fresta revela que o mundo lá fora
tem arrimo de luzes, de cores e sons,
que minh´alma definha no ponto em que chora
sem saber que dissolve o melhor de seus dons...

Meu olhar que se despe de todos os tons
esqueceu a magia do nascer d´aurora,
dispensou a beleza dos momentos bons
e não quer evadir desta sombra em que mora...

Por um fio de brisa que adentrou meu canto
posso crer no milagre do breve acalanto
e no sopro daquela esperança perdida...

De repente o menino a caminho da escola
ou a turma ociosa disputando bola
vem dizer a meus olhos que tranquei a vida...

CHEGA DE SER POVO


Tudo bem, eu participo da greve. Mas quero ficar lá, no palanque ou trio, lado a lado com os sindicalistas que aspiram ser deputados no ano que vem, e contam com o sucesso de público deste movimento. Também quero uma "boca" na coisa pública, e manobrar essa "massa" que aceita urrar sob o sol e a chuva, dar murros no vento e levar cacetadas da PM pode render muitos votos.
Quero ser também um protagonista nessa história batida. Nada de grande elenco. Desejo ser o herói oportunista pelo caminho mais cômodo. A celebridade falastrã que se lança aos flashes e holofotes e ao servilismo ruidoso das multidões que se enchem de coragem colada; incutida; plantada no vácuo de sua personalidade superficial. 
Estou pronto a reivindicar, sim, mas do alto desse mesmo conforto dos chefes do burburinho. Com as mesmas ambições e possibilidades. Tendo um pé no poder público e na espera da hora de me apossar de uma vaga num desses palácios que hoje apedrejo porque não estou lá.
Fico ao inteiro dispor para o movimento, mas não quero ser bucha de canhão nem escada para promover os líderes de massas não cefálicas. Quero a linha de frente, a partilha do comando, a vitrine que pode me promover, como sempre fez aos heróis ocasionais de bravatas como as que só via de baixo, sendo olhado de cima. 
Chega de ser povo nessas horas. Está na hora de não deixar que joguem comigo e me façam de fantoche, peteca, pingue-pongue ou seja lá o que for... Afinal, se existem outras armas de reivincação e eles só querem essa, é porque tem sido bom para eles... Só para eles.

RAÇÃO DE AFETO


Minha caça ao tesouro é pedir teu perdão
com discursos, silêncios, olhares e gestos,
meu refrão é manter a rotina de senhas
(manifestos simplórios que não sei se valem)...
O que tenho de bom é saber que fui mau,
que mereço a porção desse gelo picado,
sua dose formal de frieza polida
conservando o passado sem graves odores...
Sou feliz como posso, até mesmo não sendo,
pelo menos me apóio neste pelo menos,
dando ao sonho a ração que me faz prosseguir...
Horizonte pra mim é ter fé nessa graça
de seus olhos raiando, rompendo a cortina
de fumaça, neblina, poeira de outrora...

RAÇÃO DE AFETO


Minha caça ao tesouro é pedir teu perdão
com discursos, silêncios, olhares e gestos,
meu refrão é manter a rotina de senhas
(manifestos simplórios que não sei se valem)...
O que tenho de bom é saber que fui mau,
que mereço a porção desse gelo picado,
sua dose formal de frieza polida
conservando o passado sem graves odores...
Sou feliz como posso, até mesmo não sendo,
pelo menos me apóio neste pelo menos,
dando ao sonho a ração que me faz prosseguir...
Horizonte pra mim é ter fé nessa graça
de seus olhos raiando, rompendo a cortina
de fumaça, neblina, poeira de outrora...

REGATO


Nessas águas que passam sussurrando
seus segredos profundos em minh´alma,
singra o sonho sereno e cristalino
sobre um canto singelo igual canoa...
De repente este verso alheio às regras
flui da calma, espreguiça, e num bocejo
deixa estar a magia do regato;
nem me faço pensar que sai de mim...
Pois o próprio cenário se compõe
no talento informal da natureza,
na pureza inerente aos seus estilos...
Preso aos elos sutís dessa corrente
nado livre à deriva dos meus nadas
e nada mais me falta nesta hora...

BOSSAL/DORSAL

Sei fazer de cada espinho bossal que atravessa o peito uma nova espinha dorsal que sustenta a fé.

EM OUTRO PLANO


Ela sonha comigo e confunde a verdade
quando vê que a verdade me lança em seus olhos,
que circundo caminhos comuns aos seus passos
e me deixo tão perto de suas menções...
Para ela, se existo é um aviso do além;
profecia que nasce de velha miragem;
crê que venho das noites de suas insônias,
nas quais mora o desejo de me trasladar...
Acontece que vivo por artes opostas
ao desenho traçado por sua emoção,
sou de planos alheios ao seu sentimento...
Quando passo por ela me torno passado
sem um dia ter sido futuro e presente;
objeto abstrato, apesar de objeto...  

TRABALHISTA

Maus profissionais vivem perdendo bons empregos... E maus empregos vivem perdendo bons profissionais.

BANHEIRO


Tua lei que me ocupa feito trono
nunca deu importância pro meu cio;
cuido até dos detalhes do teu sono
e me faço edredom se passas frio...

Sou terreno marcado por teu brio
que me quer e me deixa no abandono,
teu instinto entre sádico e sombrio
se regala e te julgas o meu dono...

O que sei é que tenho que fazer
tudo quanto te agrada e dá prazer,
ser a gueixa que valha o teu dinheiro...

Na verdade só vivo prás manobras
com que ditas o mundo às minhas sobras (...)
e te sirvo somente de banheiro...

VENTO POSSESSIVO


Ciúme do vento
ao levantar uma saia...
Areia nos olhos.

MAR (CHISTA)


Inconstante, o mar:
Ora cobre de carinhos,
ora surra a rocha.

FLORES DE GÁS


O que acaba entre nós é o excesso de sonhos;
foi de sonhos que tudo se fez como é;
resta o pé que precisa retornar ao chão
e mudar de caminho, visar outro alvo...
Vai morrendo entre nós o sentido que havia
numa busca de além dos limites humanos
no que tange o querer, o gostar, o sentir;
onde nasce o mentir, apesar de sincero...
Entre nós a certeza do futuro incerto,
nosso rio duplica sua correnteza
divergindo consigo em relação ao mar...
É que nós nos atamos com nós abstratos,
distorcendo os retratos da vida em comum,
camuflando os espinhos com flores de gás...

MEDALHAS


Validade afetiva que o tempo venceu;
brincadeira madura de felicidade;
utopia encarnada para vida breve,
fantasia de tudo sobre quase nada...
Eternidade gasta que mostra seu fim,
o momeno em que o sim vem confessar que não,
que o pra sempre se oculta sob nunca mais
e se deixa levar, esculpir, convencer...
A verdade obitua o que fora imortal,
uma força maior do que a nossa infinita
rompe as sombras e grita que o reinado é seu...
O silêncio das horas impõe o decreto
redigido entre as falhas do laço perfeito;
cicatrizes no peito são nossas medalhas... 

CRIANDO ASAS


Comecei a plantar o meu campo do sonho
de fluir como a brisa que vai porque sim,
dou meus passos calouros além de onde sei,
como sei que o destino passou a não ser...
É que agora desejo nem mais desejar;
permitir tão somente que acessos me levem
por estradas astrais que sequer são estradas;
são apenas os nadas abrindo horizontes...
Quero tudo que alguém só conquista sozinho,
porque ninho enraíza, nos planta e mantém
num eterno presente que a vista limita...
Minha história começa no fim da ilusão
que no termo de tudo a realidade cria,
prá real ilusão frutificar em mim...

SABENDO MENTIR


Sei compor no meu rosto estes ares de tonto,
porque sei que viver é questão de fazê-lo...
Cabe sempre outra queda se caio num conto
e me fazem de novo enxugador de gelo...

Desenrolo sem queixa o mais denso novelo,
quem quiser me amarrar nem precisa dar ponto,
pois me deixo seguir o mais leve desvelo
que se finge ao redor qual destino já pronto...

Na verdade me junto às mentiras expostas,
aprendi  com que traços forjar as respostas
pra levar os que pensam que o fazem comigo...

Porque sei me adequar a tais climas de vícios...
Finjo crer em palavras, discursos, comícios,
como tolo que abraça quem se faz de amigo...

GULA POÉTICA


Que não a falte poesia na minha despensa,
pra que a vida não pare no meio do nada,
nada faça meu tempo azedar no vazio
nem o mundo me anule com sua vertigem...
Haja sempre uma imagem guardada no sonho,
nos arquivos da ideia um colar de palavras,
na fusão dos conceitos o pronto equilíbrio
de miragens e fatos que se complementem...
Nunca falte o tempero dos termos tecidos,
da cortina dos verbos tirados do peito
nos momentos mais férteis de minha emoção...
Tenha plena fartura de achados frasais,
grandes fardos de versos que tomem de assalto
minha gula poética, vício vital...

VIRGULARIDADE

Dos que estão de bem com a vida: "Nada como um dia após o outro!". Dos que morrem na indigência: "Nada como, um dia após o outro".

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

TUDO POR TI


Troco alívios restantes pelas tuas dores;
o que tenho de flores pelos teus espinhos;
dou meus sonhos e colho qualquer pesadelo
que se alastre no solo de tuas verdades...
Quero tuas angústias por minhas certezas,
as tristezas que sentes por toda a alegria
casual num recanto indecifrado em mim;
traz o fim que te ronda e leva meu começo...
Se alguém há de sofrer, por favor seja eu;
sejam minhas as chagas, as patologias,
os conflitos humanos, existenciais...
Toma minhas poesias tecidas nos laivos
de contento extremado eternizando encantos,
lança teus entretantos no meu poço fundo...

PERDÃO

Perdoar não é simplesmente esquecer... É esquecimentar.

IMPOSIÇÕES SOCIAIS


Daria tudo para saber qual artigo da constituição brasileira ou do código penal proíbe a combinação de determinadas cores. Queria entender de qual punição é passível quem decide comer da culinária japonesa com garfo, observando apenas os princípios de higiene e moderação. Às favas a etiqueta, as tradições e os costumes, havendo este conceito simples de liberdade. Boas maneiras, a meu ver, são aquelas que não enojam, prejudicam, ofendem ou constrangem justificadamente.
Digo isso de tudo quanto cerca o ser humano: Moda, culinária, decoração, comportamento público. Se além dos danos especificados os códigos de ética estão mantidos, nada é de mau gosto ou de mau alvitre. São questões pessoais essas quebras de protocolo, costume, rotina e consenso. Quem o faz sem ser hilário, grosseiro, deselegante ou deseducado não quebra grandes coisas. Simplesmente faz uso de sua liberdade.
Ser intelectual, por exemplo, não desagua na rígida obrigação de só gostar de música erudita, filme e papo "cabeças" ou pintura abstrata. Nem significa ser inteligente. Informado sim, detentor de saberes, mas não obrigatoriamente inteligente. Na mesma linha do raciocínio, a baixa escolaridade não determina que alguém é "tapado", desprovido de raciocínio. A história prova o contrário com os grandes gênios de todos os tempos, que não tiveram bom desempenho escolar ou sequer frequentaram salas de aulas.
Gostar de pagode e feijoada, música sertaneja e contação de "causos" não tem que ser próprio do populacho. Nem impróprio para as elites. Muitas vezes quem torce o nariz em público, para tudo isso, cultiva secretamente o gosto e a prática da chamada breguice. No entanto, basta o Caetano Veloso num desses surtos oportunistas vir a público determinar que o brega é chique, para que toda a soçaite faça coro numa clara demonstração de sua superficialidade e ausência de conceitos próprios.
O povo sabe que gosto realmente não se discute, como sabe preservar e defender os seus gostos com a originalidade inexistente nas classes que acham que gosto não se diz, incute. Classes bestas e separatistas que tentam estabelecer o que é de pobre, o que é de rico, o que é de bom e de mau gosto. A mesma gente preconceituosa que aceita o Pelé rei do futebol, mas não o aceitaria rei do golfe, ministro da música clássica ou candidato a papa, por questões de berço, etnia, genealogia, tradição.
A sociedade universal seria de fato feliz se cada um pudesse, ostensivamente, ser quem é; ter gostos individuais; estabelecer conceitos próprios e livres de vigilância ou censura. Imagino quanta gente esconde aspirações, preferências, conceitos e impulsos apenas para seguir padrões inúteis e de fachada, sendo que o que deseja não feriria a lei, não atentaria contra o pudor, a ética, a boa educação e a cidadania.
No mundo com que sonho, a moda não seria ditada. Não haveria Deus imposto. É claro que existiriam o bem e o mal, nos limites da humanidade, pelo que o crime continuaria sendo crime... Mas pecado, não. Nada seria pecado, porque isso não fere o direito alheio, é de foro íntimo. Se todos deveriam, por iniciativa pessoal cultivar a moderação, a gentileza, os costumes dignos e outros princípios já citados, nada seria, em meu mundo, por etiqueta; formalidade; protocolo; imposição social.

ESQUECENDO DE ESQUECER

Há pessoas tão esquecidas (ou esquecedoras), que quando parecem não esquecer nada, tenham certeza: Estão esquecendo de esquecer algo.

O VELHO DO SACO


O ônibus sempre leva uns bons minutos naquela pequena rodoviária logo depois do ponto inicial. Sentado próximo à janela e com uma criança de dois anos ao colo, o homem passeava os olhos no cenário externo: Via gente indo e voltando, o barraqueiro dos doces dando um breve cochilo, o motorista lá fora dando risadas, a vida fervilhando naquele pedacinho de mundo que tem muita história para contar. 
Deteve-no grupo de idosos e portadores de deficiências que aguardava para entrar pela porta da frente, conforme reza o direito. Direito este que as empresas de coletivos sempre querem negar e o fazem vez e outra. Muitas vezes são os motoristas que arbitram, por si próprios, não permitir que essas pessoas tenham a gratuidade. 
No meio do grupo, um senhor baixinho e simplório olhava para o céu e coçava o saco, espantosamente à vontade. A mão resvalava por entre a calça, ele abria levemente as pernas e mandava as unhas, sem que nenhuma outra pessoa, nem mesmo a mais próxima desse por isso. Aliás, isso é algo tão corriqueiro que as pessoas acabam mesmo se acostumando com essas e outras práticas que deveriam faze corar.
Distraidamente, já que estava sentado à espera da partida, o passageiro viu. Mas apenas viu, sem dar importância, sem sequer reparar na falta de higiene e bons modos do velho. Logo desviou o olhar para outras cenas, e certamente apagou a imagem da mente que se perdia mais em seus pensamentos do que propriamente no que os olhos enviavam naquele instante. Logo todos entram, o motorista liga o motor e a viagem se reinicia com a tranqüilidade inerente às tardes naquele itinerário.
Não demora, e logo atrás do homem da criança no colo é iniciado um ritual de mastigação barulhenta. Quem acabara de sentar abriu um pacote de biscoitos de polvilho e danou a comer como se estivesse em desespero de fome. Aquilo atraiu de chofre, a atenção da criança que lançou os olhos arregalados sobre o pacote de biscoitos, demonstrando claramente o seu desejo de comer também. Só que o ônibus já partira, não havendo mais como o pai satisfazer seu desejo ou gula, talvez o caso típico do que chamam de “olho maior do que a barriga”.
Como nos lotações o que não falta é gente solícita e boazinha, não demorou muito para que a criança fosse atendida, pelo menos em parte. O velho coçador, que era também o comedor de biscoitos, com a maior sem-cerimônia do mundo usou a mesma mão para puxar uma unidade e oferece-la. Distraído e sem noção, o pai agradece com um sorriso e deixa o filho saborear o agrado com a mesma sem-cerimônia.
O velho do saco existe. Não é lenda, e realmente faz mal às crianças. Ele pode estar em qualquer rodoviária coçando o dito cujo, para depois infectar um biscoito, uma bala, um doce ou seja lá o que for, garantindo o ciclo dos germes e bactérias que por essas e outras não corre o mesmo risco de extinção das espécies que deveríamos preservar.

DESPEDIDA RADICAL

Adeus, amor... Vou a marte pra sempre.

POBRE GRAMÁTICA!

Deputados lincham a gramática, nas tribunas... E como não bastasse fazê-lo só uma vez, eles não têm dó: Relincham.

NÓDOA


Esse muro que às vezes nos tira de nós,
que se faz deste clima sem clara estação,
põe mordaça na voz do sentido que brada
uma funda emoção que por isto se abala...
É segredo afetivo sem lógica em tudo
quanto somos um doutro e que nada supera,
mas parece que às vezes queremos motivo
pra que tal primavera se parta no meio...
Parecemos cansados de muito felizes,
produzimos deslizes de mágoas e dramas
e queremos o choro, a tristeza, o rancor...
Uma cor que distoa da nossa pintura,
quase rui o castelo de nossa magia,
cria nódoa cruel no que temos de belo...

TEMPO REAL


Chegarei à velhice de alma velha
pra que a mesma não lute contra o corpo,
não farei do seu templo essa piada
entretendo as futuras gerações...
O passado enriquece meu presente;
nele sei conceber o que há de vir;
levo a vida no tempo dos meus dias
para só desaguar no leito exato...
Viajar é perfeito em meu vagão,
já fui moço e minh´alma foi também,
sendo fruto maduro a polpa idem...
A velhice terá que se assumir
na leveza da minha consciência,
sobre o peso da idade bem vivida...

INJEÇÃO


Dói assim porque chega de surpresa,
por mais planos que tenham sido feitos;
um moinho de mágoa e de tristeza
definhando noss´alma em seus efeitos...

Desfiamos um mundo de conceitos
entre frases que surgem com destreza,
parecemos tão rijos, e perfeitos
entre os traços forjados de certeza...

Mas que dói é verdade bem calcada,
nossa vida parece desfalcada,
sem nenhuma verdade que a defina...

Passa logo, apesar da projeção
das lembranças que restam da injeção:
Isto é como tomar penicilina...

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

DE GENTE E DE BESTAS

Quase nada é mais estúpido que a discussão agressiva, porque nem é um duelo em que duas pessoas tentam se atingir mutuamente, o que até conseguem fazer. Ela é, na verdade, o patético e solitário desempenho de duas ou mais pessoas que tentam, embora duas ou mais, convencer a si próprias. Isso é feito aos brados e de formas que denunciam total ausência de razão. Exatamente a razão, que os ânimos querem tomar para si pela coação, pelo rapto do raciocínio, ainda que seja um caso de homônimo.
Sobre convencer a si próprias, tais pessoas se frustram, pois fora de si como ficam não conseguem se achar para tanto. Ruminam seu desespero e solidão momentâneos, percebendo que o outro não é o espelho de seus egos. Mais ainda, quando percebem que foram nulos os seus espetáculos de fúria e grosseria gratuitos. Trata-se aqui, tão apenas da discussão agressiva (o que não considero tão apenas). As "vias de fato", como classifica o eufemismo, vão além do meu poder de absorção, análise, crítica e debate. Creio que fique tão aquém da racionalidade, que não haja como caber em um texto que só deseja tratar dos limites humanos, que mesmo não aceitáveis, às vezes são compreensíveis. Para falar dessas "vias", que vão da agressão física ao homicídio, discorreremos mais tarde sobre as bestas.

DO ESQUECIMENTO E DO ABANDONO

O extremo da desventura de quem jamais foi ouvido em seus gritos de apelo, alerta ou qualquer outro, é a triste morte por dor de olvide.
                                            ...

Em ouvidorias de serviço público é assim: Você é ouvido agora e olvidado em alguns minutos.

                                            ...

Para cão leproso, abandono; para cão sadio, há bom dono.

AMOR SEM DOR

Se tiver o sossego de amores maduros,
nunca os dramas, lamentos e tantos fantasmas,
e tiver a leveza dos laços bem dados,
sem as asmas em peitos aflitos e afoitos...
Navegar sobre as águas de mansa baía
na certeza do porto de além-horizonte,
pra tomar a verdade nos braços felizes
da mais doce utopia que a mágica teça...
Viverei este afeto, se o tempo deixar;
caso a vida me chame florindo os caminhos,
pra me achar por aí sem depois me perder...
Nada mais de novelas de fundos pesares,
de mistérios, penumbras e luzes de velas
ou bazares de mágoas, balcões de agonias...

AMOR SEM DOR

Se tiver o sossego de amores maduros,
nunca os dramas, lamentos e tantos fantasmas,
e tiver a leveza dos laços bem dados,
sem as asmas em peitos aflitos e afoitos...
Navegar sobre as águas de mansa baía
na certeza do porto de além-horizonte,
pra tomar a verdade nos braços felizes
da mais doce utopia que a mágica teça...
Viverei este afeto, se o tempo deixar;
caso a vida me chame florindo os caminhos,
pra me achar por aí sem depois me perder...
Nada mais de novelas de fundos pesares,
de mistérios, penumbras e luzes de velas
ou bazares de mágoas, balcões de agonias...

CORAÇÃO DE CERVO

Assumamos a culpa se o poço é sem fundo,
se no mundo são raras virtudes tão vís,
nossos bairros são ninhos de ratos e afins;
nossos sins ao desmando parecem sem termo...
Convenhamos que o caos começou no silêncio
que se fez do descaso a partir do começo
duma história que um dia roubaram de nós
pra não sermos ninguém na partilha das graças...
Está claro que somos dos mais obtusos
entre os povos de um globo cansado de tudo;
temos alma de ovelha, coração de cervo...
Somos servos do engodo, lacaios da farsa,
uma gente covarde que se rende à força
dos que têm os seus trunfos de poder e fraude...

DOMÍNIO PÚBLICO

Pedirei pro Caetano gostar de meus versos;
não bastando então peço pro Chico endossar,
para ver se me torno esse "grande poeta"
cuja seta não falhe no seio da mídia...
E pra ser acolhido por vates de grêmios,
ganhar prêmios, prestígio, comendas, destaque,
saberei adular os monarcas das letras
ou pedir um prefácio ao que seja mais manso...
Depois disto, quem sabe, um ministro da destra
pode ser mola mestra, regente ou tutor
pro mercado editor se render ao meu dom...
Levaria um milênio por outro aparato;
minhas cinzas, bem tarde, seriam de gênio
mais barato, explorável, de lucro mais amplo...

GROTEXTO

Contesto com texto,
no exato contexto
das coisas que atesto.
Detesto pretextos,
pré-textos gritados
nas ruas e largos,
coretos e bancos
de praças e afins.
Atesto que a testa
sem ser de bom ferro,
não vence no berro,
que o santo é de barro
e a polícia quebra.
Protesto e não tenho
pra tanto, cabresto,
pois faço com texto,
no texto eternizo
deixando atuar.
Os punhos ao vento
e muitas bravatas

AMOR EXTREMO

Só sei te amar com amor assim;
sentido no meu silêncio...
Só sei te amar com sentimento,
com rótulo eu ignoro
uma maneira de te amar...
Eu te amo sem som qualquer
ou atitude alguma;
sem ostentar uma prova
visível, sequer audível,
do quanto eu te amo...
Não sei te amar por amor amor-gesto,
nem por amor-palavra.
Tenho este problema,
só sei te amar por amor-amor...

VIRTUDES MATUTINAS

Cada dia é começo doutra vida
que se guarda em segredo para nós,
tem um novo conceito em sua luz
e nos cobra o poder de olhar além...
As manhãs vêm lavadas, leves, livres;
bem dormidas, pois nunca têm insônia,
trazem ares de aromas curativos...
Somos nós que perdemos das manhãs
os mais finos extratos e a magia
que oferece o milagre do renovo...
É que as vemos por fora, em seu comum,
na beleza que ofusca os próprios dons,
pois manhãs têm beleza interior...

PAZ E DOENÇA

Tudo na vida redunda. Um exemplo dissso é a pomba da paz, que é também a pomba da toxoplasmose.

PAPEIZINHOS SAUDÁVEIS

Na contramão dos que rejeitam, acolho cada santinho, prospecto e cartão que distribuem nas ruas das metrópoles. Faço isso, desde que nenhum engraçadinho tente me puxar para um canto, apertando o impresso entre os dedos assim que o aceito, para derramar sua lábia em meus ouvidos. São vezeiros nessa prática os que distribuem propagandas de óticas, planos de saúde e similares.
Excluindo esses incômodos, não me faço de besta: Vou enchendo os bolsos de papeizinhos embolados, até encontrar uma lixeira longe dos olhos dos panfletistas. Procedo assim, não sem antes dar uma lida rápida: Divulgam planos; empréstimos; jogadores de búzios; compra de ouro; advogados; milhares de outros serviços e produtos, alguns até inimagináveis.
Devo confessar que já tive minhas surpresas agradáveis com tal prática: Vendi bugigangas velhas quando estava mais duro do que um coco seco, arranjei um advogado trabalhista que me proporcionou um acordo razoável com a empresa que "pus no pau", e tive até uma noite de prazer com uma linda jovem cartomante que procurei para saber de bobagens. Eu estava carente, ela também parecia estar e os astros conspiraram a nosso favor. Tudo graças aos papeizinhos.
Quem aceita os impressos e não os joga no chão acaba sendo um agente voluntário em prol do meio ambiente, pois faz com que menos lixo emporcalhe as ruas. No meu caso (posso dizer sem ficar ofendido comigo mesmo), um lixeiro voluntário. Se todo o mundo fizesse o mesmo - perdoem se me uso como exemplo -, as cidades talvez não estivessem tão poluídas e propensas a enchentes em épocas de chuvas densas.
Some-se a isto, o fato de oferecermos mais dignidade ao trabalho honesto de jovens que, enquantro isso, não estão contribuindo para avolumar as pilhas e mais pilhas de papéis arquivados na justiça criminal, mesmo diante da informatização. Como se vê, aceitar os papeizinhos e dar-lhes destino civilizado é causa ecológica, assistencial, humanitária... E pode, ainda, resultar surpresas que nem as cartomantes imaginam.

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

PARA VOCÊ GOSTAR


Esta crônica é do Rubem Braga. Danado como ele só, fê-la num momento em que nada mais tinha para fazer. Nem mesmo crônica. Estava de papo para o ar, ou de glúteos para a lua, talvez caçando formas nas nuvens, coçando o saco num dia ou noite qualquer, sem nenhum evento a comemorar.
Assim era meu amigo Rubem: Sua inspiração não tinha fases, altos nem baixos. Dispensava os motivos e se inspirava até mesmo na falta de inspiração - ou de assunto - para sair assuntando entre as linhas que sempre acabavam produzindo encanto.
Quando concebeu estes escritos, o Rubão não queria nada que não fosse orbitar mentalmente. Repousava nos braços da preguiça, num ócio bem merecido por quem vivia para os outros dividindo-se entre páginas de livros, revistas e jornais; dando de beber às almas, de comer ao intelecto coletivo, mesmo no caso dos menos ou nada intelectuais, pois ele era de todos. Permitia-se a doce promiscuidade literária dos gênios nessa arte. Piranhava mesmo, com toda a classe de que dispunha, sem nenhum pudor de ser quem foi, por amor devasso à crônica; ao verso; a sei mais lá o quê, no reino das letras.
Reconheço que assusta ler termos chulos atribuídos ao Braga. Ele de fato jamais faria isso. Mas percebi nos seus olhos que você aprovou este texto, buscando na mente uma boa justificativa e aplicando por conta própria, no contexto, os vocábulos menos ortodoxos aqui expostos.
De fato menti. Esta crônica não é do Rubem Braga. Infelizmente é minha e quero me desculpar por tê-lo feito adorá-la. Era esta minha intenção e sinto muito, mas agora é tarde para considerá-la um lixo literário. Seria muita contradição, denotando fraqueza de caráter.
O jeito é continuar gostando e ficar armado para os próximos, pronto para não gostar, sabendo que serão meus e que talvez haja outras armadilhas para capturar seu gosto. De qualquer modo, reconheça que pelo menos a pegadinha foi de mestre.

AMÉLIAS DE FOGO


A carência das mulheres
que se guardam quando dão,
porque dão pra maus amantes,
é veneno que dá vida
para quem saiba extrair.
Trai o medo e dá prazer...
São arcanjos cujo céu
faz inferno em seus sentidos, 
cuja chama grelha os corpos
e produz os gritos d´alma,
numa calma de agonia
que deprava o que se cala.
Tais Amélias rangem dentes.
Têm urgentes dons em flor,
são aranhas que se caçam
pelas suas próprias redes,
nas paredes por quais sobem
quando explodem seus limites...
As mulheres mal amadas
têm um pólen bem curtido,
que produz o melhor mel
sob o fel das frustrações...
Só precisam que a colheita
seja exímia e delicada.

IMPORTÂNCIA

O Brasil é um país muito importante... Precisa exportar um pouco mais.

DO PRECONCEITO E DO ATO


O que a lei proíbe ao tratar do preconceito não é exatamente o ter. Isto seria muita pretensão, pois nada ou ninguém pode reprimir sentimentos, conceitos, preferências e prismas. Tudo isso é muito íntimo e pessoal, se ficar lá, guardado por quem nutre, restrito apenas ao direito inegável de não ter que se renegar para forjar imagem.
O que a lei exige do cidadão é que seu preconceito não vitime por gestos, expressões e palavras o alvo de sua existência. Quem não quer conviver com negros, por exemplo, tem o direito de não entrar em um ambiente onde haja pelo menos um negro. O que não pode é querer que o negro saia para tornar possível sua entrada, nem ostentar de nenhuma forma o seu motivo, levando-o ao constrangimento.
O preconceito é bem mais comum do que se assume e nem nos damos conta disso. Ele recheia nosso dia-a-dia e mora nas escolhas que fazemos, com bastante naturalidade. Quando não concebo a idéia de uma relação homossexual que me envolva, o preconceito se afigura. É uma idéia pré-concebida, um conceito prévio, uma opinião que se antecipa. Na verdade, o termo "jamais" é quase sempre de cunho preconceituoso.
Há que se respeitar o arbítrio, a pessoalidade, o gosto individual. O simples não gostar de alguém ou algo já denota o preconceito. Mas o exercício do respeito mútuo nos seres humanos de todas as etnias, cores, nacionalidades, religiões, culturas, orientações e classes é que pode possibilitar a fluência de um mundo melhor.
É em nome desse mundo melhor que a lei deveria se preocupar com os atos preconceituosos que excluem, mesmo veladamente, nas escolas; empregos; clubes; ordens; igrejas; outros ambientes. O segredo está exatamente em respeitar o que é de foro íntimo em cada um, sem permitir qualquer exteriorização danosa para outros. 

LAVANDO AS MÃOS


O menino rebelde que a escola deplora
traz afeto e doçura que os mestres não veem,
têm na sua carência os valores humanos
que ninguém descobriu, porque pouco interessa...
Somos muito ocupados pensando em nós próprios,
no salário achatado e nos outros quesitos
dessa busca de olhares pro nosso valor
como classe que abona o futuro da pátria...
Do menino rebelde se ocupe a polícia,
quando nosso abandono somar-se ao dos pais
e ficar combinado que o mesmo não presta...
Quanto ao mais o governo é que tem que prover,
saberemos provar que não somos culpados,
ao mostrarmos as mãos que lavamos faz tempo...

SAFADEZA

Estafa de político não é bem estafa... É estafadeza.

VERSOS HUMANOS


Quando versos bem maduros
pendem rubros do pomar,
um poeta se dá conta
dessas contas que não fez,
quando a cica em seu verdor
deu sabor de fruta imprópria...
Muito menos quando estava
dando flor por entre os galhos,
pois a vida mal havia
lhe mostrado acima o sol,
revelado que a distância
é que azula o firmamento...
Esse vate acorda e vê
que os rompantes eram vãos,
o seu grito estava mudo
e seu mundo não havia,
porque tudo à sua frente
era indiferente ao mesmo...
Nasce um homem no poeta
para se assumir humano,
na verdade que o engaja
nesse ritmo dos tempos,
que tempera de razão
a versão de cada verso...

ARTISTAS APANHAM

Como tantas crianças são punidas porque são crianças, os artistas também apanham porque fazem artes.