segunda-feira, 30 de abril de 2012

DE FAMÍLIA E SOCIEDADE

Em todo conglomerado de parentalha (condomínio ou terreno destinado a moradias de familiares) existe aquela casa que ninguém respeita. É a casa em que todos entram a qualquer hora, convidados ou não. Aquela cuja tomada e torneira externas são usadas por todos como recurso de economia para quase todos e, finalmente, aquela em frente a qual se faz toda a sujeira do dia a dia. Um exemplo disto são os cocôs dos cachorros que aprendem, em tempo recorde, o caminho para o jardim da única residência sem cachorro, porque seus moradores optaram por não causar esse dano aos demais. Aliás, pior do que os cocôs é a invasão posterior dos que resolvem se munir de pás, vassouras e sacolinhas, para continuarem constrangendo os moradores da casa que ninguém respeita, com mais uma longa vasculhada na privacidade já corroída.
Copiando a própria sociedade externa, isso tem muito a ver com posição social. Forma-se uma sociedade privada na qual o menos favorecido é o mais prejudicado. Quero dizer que as casas que ninguém respeita são exatamente as dos menos favorecidos nesses conglomerados. Os que menos contribuíram financeiramente para a construção do todo, ainda que tenham participado como pedreiros ou serventes; os que têm os empregos menos apreciados ou enfrentam desemprego; os que têm sempre as participações mais modestas nos rateios em datas festivas, nos assuntos de doenças dos patriarcas ou matriarcas dos meios e nas obras de reparos gerais. Esses não têm direito a queixa, privacidade, respeito, explicações. Os seus históricos não os favorecem. São fichas sujas no SPC do clã. Marginais irremediáveis que podem se ferir muito, caso quebrem o silêncio.
Na verdade, não falo de uma situação incomum. Em toda a sociedade mundial e nas subsociedades que a sustentam é assim: Nas casas, nos ambientes de trabalho, nas igrejas e demais irmandades, nas associações, clubes, sindicatos e outros ajuntamentos. Até mesmo nas patotas dos meninos de ruas e nas organizações ou gangues criminosas. Neste aspecto, a ferocidade gerada pelas diferenças sociais, ainda que mínimas, levam o ser humano a situações de superioridade ou inferioridade que geram discórdia, subserviência, tirania, ódio, medo, injustiça, gueto, fome. Levaremos ainda um tempo inestimável para nos distanciarmos, em caráter, dos predadores selvagens. Precisamos nos tornar de fato superiores aos ditos animais irracionais, o que requer muito avanço nos campos da ética, do respeito e da solidariedade.

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