terça-feira, 6 de março de 2012

EDUCAÇÃO ANTIEDUCATIVA

Recebo do professor Edivaldo – Vila da Penha - RJ – o seguinte e-mail: “Caro Demétrio; percebo em maioria de seus textos uma grande preocupação com as questões éticas que envolvem o educar. Vejo que você tem visão ampla no que diz respeito ao comportamento dos jovens de hoje e também dos que o educam. Mas quero lhe passar a impressão horrível que tenho de uma escola em que se estabeleceu entre funcionários de ponta e demais funcionários, uma espécie de sistema de castas. Para o grupo de ponta (e aqueles que o seguem, obedientemente) existem claros privilégios no que tange o tratamento em geral: Refeição diferenciada, talheres separados, água em copos especiais etc., tudo assistido pelos “meros professores”, demais funcionários e os alunos, que certamente veem tudo isso com olhos críticos. Um mau exemplo de separatismo e ostentação de hierarquia justamente onde se deveria aprender o contrário. Gostaria de saber o que você acha desse comportamento anticidadania. É complicado para você, comentar a respeito?”.
Não, Edivaldo. Não tenho qualquer problema em comentar publicamente esse assunto. Primeiro, porque nunca vi esse tipo de prática na escola em que trabalho. Aqui não existe essa ostentação de hierarquia. Segundo, porque as diretoras desta unidade (a Angélica, a Ângela, a Regina e a Márcia) são educadoras comprometidas com a democracia. Além disto, são profundamente religiosas, e como tais, não praticariam atos semelhantes, que pecam contra a igualdade entre e os seres humanos, a ética e a cidadania.
O que o escandaliza é muito mais comum do que se possa imaginar.  A sociedade em que vivemos é assim, e isto se reflete nas fábricas, nos supermercados, nas igrejas, nos presídios e outros estabelecimentos, como em algumas escolas. Algumas, porque a maioria já entendeu que escola não é lugar de separatismo, preconceito, ostentação de privilégios e anticidadania. Trata-se de um lugar em que se deve justamente lutar contra isso, mostrando aos jovens, adolescentes e crianças que o mundo é muito melhor sem essas besteiras que mancham as relações e resultam guetos; desigualdades sociais; ódio; guerras; sentimentos negativos que transformam a vida em sociedade num paiol de conflitos de todas as sortes.
Tentar educar um jovem num ambiente em que ele assiste o contrário de tudo que um educador deve repassar não só de disciplina formal, mas de lições de vida, é como um pai tentar dizer ao filho que não deve gritar palavrões exatamente gritando um palavrão. Ou ensinar a não roubar com palavras, enquanto rouba de alguma forma disfarçada, enrustida, de sorte que a sociedade não perceba ou feche os olhos. Até mesmo o fato de os educadores de sua escola aceitarem essa situação depõe contra o grupo diante dos alunos. Eles veem que são educados por pessoas acomodadas, que aceitam ser tratadas como seres inferiores e indignos. Neste ponto, aprendem a ser também pessoas que se auto-excluem ou se revoltam contra a sociedade em um todo, com práticas que ferem essa sociedade.
Mas não brigue, Edivaldo. Arranje uma forma de educar esses educadores tortos, com muita didática. Faça de conta que eles são as crianças ou jovens que você tem em sala de aula e tenha muito tato. Eles aprenderão com você e alguns colegas seus, que compartilham de sua indignação. Você deve saber que existem colegas quietinhos, mas que também gostariam de fazer parte do grupo dos privilegiados, que não hesitariam em prejudicá-lo para isso. Ninguém sabe, na verdade, quantos são os que não aceitam, lá no íntimo, esse tipo de comportamento.

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