domingo, 24 de novembro de 2019

A MÃO NA CONSCIÊNCIA NEGRA

Demétrio Sena, Magé - RJ.

"Vem cá; você não acha que seria justo criar o Dia da Consciência Branca?"; foi o comentário infeliz de um... infeliz. E não. Não acho que se deva criar o Dia da Consciência Branca, o movimento branco nem a lei de cotas para brancos. Não são os brancos os grandes injustiçados neste país. Não é para os brancos que são sonegadas as maiores oportunidades de trabalho, independente da qualificação dos negros. Nem são os brancos, os perseguidos em supermercados, porque "provavelmente roubarão"... sorteados para revistas policiais nas ruas e conduções, porque "são prováveis bandidos". Também não são os brancos os mais injustiçados na escola e segregados nos clubes sociais.
"Tudo mimimi"; dirão os mais empoderados do que nunca, desde o primeiro dia de janeiro deste ano, pelo conceito massificado e distorcido de justiça social. "Ué; não se busca igualdade? Por quê esses privilégios para o negro?"; diria o mesmo infeliz. Porque é dívida. Porque o país deve ao negro. Porque há menos de dois séculos ele ainda era escravo, e quando liberto, foi se virar nas ruas, sem nenhuma lei de reparação; de qualquer direito adquirido e de garantias trabalhistas futuras ou retroativas. Enquanto isso, imigrantes italianos ocupavam, com todos os direitos, remuneração e prerrogativas da época, os lugares até então ocupados, como escravos, pelos negros.
Daria um livro, falar de todas as razões pelas quais o Brasil deve, sim, manter e cumprir as leis de reparação, proteção e garantias ao negro. Porque as portas da sociedade, das oportunidades de emprego, da justiça e do reconhecimento de sua contribuição, sua cultura e seu valor não se abrem naturalmente. Só por lei. E ainda existem os grupos racistas que tentam convencer o negro, algumas vezes com sucesso, a questionar, contestar e rejeitar os próprios diteitos, como se todas as conquistas alcançadas com muita luta e consciência fôssem esmolas da sociedade branca e depusessem contra sua capacidade. Comprar esse discurso é cair na mais perniciosa das armadilhas sociais, dentro desse contexto.
"Mas a sociedade atual está mesmo dura e discriminatória para todos os pobres!". Sim. Para todos os pobres, e bem mais para os pobres negros; para todas as mulheres, e mais ainda mulheres negras; todos os gays, em especial gays negros; crianças pobres e negras, nem se fala. É preciso tomarmos, urgentemente, consciência da importância do empoderamento e da busca de mais e mais espaço na sociedade; mais e mais respeito e reconhecimento para o negro. Quando a igualdade racial for uma realidade sem margem para dúvidas e questionamentos, aí sim; a luta estará vencida e serão desnecessárias as leis específicas em favor dos negros deste país.
É preciso que a sociedade branca tenha consciência dessa igualdade humana e social. Mas também é preciso que o negro rico não deixe de se reconhecer como tal nem de lutar por essa causa... que o policial, branco ou negro; a atendente branca ou negra; o juiz, o politico, empresário, porteiro do prédio, segurança do clube (...) deixem de julgar o cidadão pela cor da pele ou a presunção da etnia por características marcantes como cabelos, olhos, lábios, nariz...
O Dia da Consciência Negra é a data que julgo mais importante no calendário dos feriados estaduais. A única não imposta pelo comércio nem pelo poder público. Ela foi conquistada exatamente pela força da consciência de quem precisa se posicionar cada vez mais e se propor... enquanto não for assim, continuar a impor, pela força da lei, o respeito, o reconhecimento e a inclusão legítima; merecida; que não é favor da sociedade branca e passa da hora de ser institucionalizada.
A indústria, o comércio e grande fatia dos demais setores da sociedade resistem ao Dia da Consciência Negra. É preconceito; racismo. Com justificativas hipócritas que não podem ser compradas pelo cidadão. Especialmente o cidadão vítima desse preconceito; esse racismo; essa hipocrisia. E o que mais assusta na resistência, é saber que algumas escolas não reconhecem o feriado. Têm seus discursos e justificativas, de fundo falso, pois não reconhecem. Se fosse o caso, respeitariam o feriado e levariam seus alunos a entender a importância desse dia. Falta consciência no Dia da Consciência Negra.

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