terça-feira, 5 de junho de 2012

ONDE MORA A FELICIDADE


Em frente à casa pequena e muito simples onde vivo com minha filha mais nova, de cinco anos, uma bela e ampla residência está em fase final de construção. Gil, seu proprietário, é um moço muito simpático, a exemplo de maioria dos moradores dessa pacata localidade semirrural. O moço está noivo; não parece ter condição econômica avantajada, mas é caprichoso, trabalhador e acima de tudo paciente.
Dia destes, quando chegava com a Júlia, deparei-me com o Gil e brinquei. Propus a troca de meu barraco, escondido entre as velhas árvores de um quintal acidentado, por sua casa tão imponente quanto a área que se estende ao fundo. correspondendo à brincadeira, ele respondeu que sim. Que depois falaríamos a respeito.
Já em casa, dei a Júlia um livro de pinturas e fui cuidar do almoço enquanto ela se divertiria colorindo os desenhos de flores, borboletas e crianças. Já era um pouco tarde e não dava tempo de brincar com ela, como sempre faço, dos mais variados tipos de faz-de-conta que saem daquela cabeça encantada; cheia de fantasias.
Quando já servia o almoço, percebi que a Júlia não tocara no livro. Estava triste, calada e tinha os olhos fixos no chão. Naturalmente preocupado, acariciei seus cabelos e procurei saber o que acontecera. O que a deixara daquele jeito, se eu não me lembrava de nenhuma razão para tal.
As lágrimas até então guardadas percorreram a face de minha moleca. Ela disse que não queria deixar a "casinha feliz" onde vivemos, por nenhuma outra. Nem mesmo enorme, linda e luxuosa. Desabafou que passa as horas mais alegres de sua vida em seu quarto pequeno e bagunçado e no quintal, este sim, grande e com muitas árvores, além de um velho e querido balanço no limoeiro.
Depois de consolá-la e dizer que só foi uma brincadeira, não tive como evitar minha lágrima discreta. Não de tristeza, mas de contentamento e ternura. Minha filha é feliz com o que temos! Não apenas alegre, como demonstra nas muitas brincadeiras, contações de histórias e invencionices, mas feliz de verdade! Ama o zelo, presença e atenção paternos mais do que ao conforto que proporciono ou não.
Sou igualmente feliz. Especialmente por saber que não ofereço à toa o melhor do que sou e tenho. E se a Júlia um dia quiser ter conforto bem mais expressivo, poderá fazê-lo. É para tanto que me preocupo em não deixar que lhe falte, além dos ensinamentos domésticos, a boa educação escolar sem a qual não se alcança nos dias atuais nem mesmo o pouco do qual disponho.
Tudo o mais é afeto. Mais lar do que casa. Mais bem querer do que bens. Muito mais presença do que presentes. Mais tempo do que tampas, compensações ou subornos que não cobrem descuidos e abandonos.

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