sexta-feira, 1 de junho de 2012

TABELA DE PREÇOS

Ter tudo é coisa que se descarta na história de qualquer ser humano. A felicidade não é nada mais do que o rabo de um cão que tenta morder esse rabo. Rosna e gira freneticamente até que a canseira o faz entender que melhor mesmo é ficar com a sensação do desabafo cumprido. Ou insiste à exaustão e no fim alcança o intento, mas paga o preço. Como sente o sabor, também sente a dor da mordida.
Na verdade, o tudo só existe para ser antônimo do nada, que, por sua vez, é o mesmo em relação ao tudo. São ambos estimativas do inconcebível; da nossa busca do insondável; do nosso vício de perseguir mistérios e justificar a essência do prosseguir. Do transcender as coisas palpáveis, ao alcance dos olhos. Neste moinho de abstrações é que entra o conceito filosófico de felicidade. Ela existe para ser de alguma forma inexistente e manter um sonho que de repente perde o sentido, se deixar de ser sonho... pelo menos na sua integralidade.
Todas as coisas, das mais fúteis e passageiras às mais profundas e duradouras passam pelo desejo de ser feliz. Entretanto, só se alcança essa graça parcialmente, pois a felicidade é setorizada, estende sempre uma promissória e temos de assiná-la. Quem quer a fama ou o anonimato, a riqueza ou a modéstia, o poder ou a sombra terá de pagar por isso com os efeitos colaterais que surgem na contramão dos rumos e atracam nos destinos.
Caso tente ser feliz em seja lá o que for, verifique a tabela de preços que a vida expõe honestamente como decreta a ordem natural das coisas. Pode ser que tal graça custe menos e seja bem confortável quando nos adequamos a ela, graças à eficiência do comodismo. Tais lições o tempo ensina, impondo até uma certa dignidade por meio do brio e da resignação de quem assume o insucesso da tentativa de obter tudo.
Ou, em última instância, talvez a felicidade seja mesmo isto; não tenha o sentido exato que lhe atribuimos. A plenitude, o sucesso absoluto e o sonho completamente realizado podem ser o início de um abismo, por deixarmos de querer tanto e ficarmos a disposição do vazio. Certamente, ser feliz é estar no céu. No ponto máximo do infinito imaginário, que reside onde nada mais se quer.

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