Ao contrário do que se pensa, escrever não é meu hobby. É um
ofício que me dá prazer, orgulho e renda extra, pois também sou educador. No
fundo, isso explica o porquê dessa necessidade. Cada coluna em periódicos; cada
texto na web;cada livro lançado é um recurso econômico direto ou indireto, além
de ser uma necessidade íntima; existencial.
Quando lanço meus livros independentes, a felicidade por
manter esse velho sonho de ver minha obra ganhar mundo, emocionar pessoas e me
ajudar a ter conforto material tem seus efeitos adversos. Entre os quais, a
indignação de constatar que muitos amigos (e são inúmeros os amigos) não
respeitam meu trabalho como tal. Não entendem que faço investimentos em um
produto que só me dará retorno se for vendido por dinheiro, além dos elogios.
Não apenas por elogios. Todo mundo respeita o comerciante, o camelô, a manicure,
o pedreiro e até o miliciano de sua cidade, mas quase ninguém respeita o
escritor palpável; visível; também de sua cidade. Tantos amigos e admiradores
desse trabalhador igual aos outros, mas a maioria quer ganhar seu produto;
jamais compra-lo, como compra roupas, calçados, bonecas infláveis, bijuterias,
potes, pastéis, caldo de cana e sorvetes.
Dia destes, um amigo me abordou na porta de sua casa
comercial, uma bela loja de roupas, para perguntar sobre o livro que lancei
recentemente. Incauto, abri a mala cheia de exemplares previamente vendidos
para uma escola da rede privada local. Então ele quis saber se havia exemplares
excedentes. Mais uma vez incauto, respondi que sim. Esperto, meu amigo pegou um
livro, apertou contra o peito, me fez elogios e arrematou: "Este aqui é um
presente para o velho amigo?". Constrangido, mas cuidadoso para não
constrangê-lo com um "não" daqueles, preferi responder de forma
simbólica. Entrei na loja, escolhi um belo casaco de grife, apertei contra o peito
e devolvi a pergunta: "Este aqui é um presente para o velho amigo?".
Flagrado em sua falta de ética ou noção, meu amigo teve
humildade o suficiente para rever seu conceito, pedir desculpas, consultar
sobre o preço, a temática do livro e, absolutamente por ter gostado, adquirir o
seu.
Quem tem ética e respeita o próximo, sempre há de valorizar
os produtos e serviços de qualquer trabalhador... e sempre há de ver como
trabalhadores, mesmo aqueles profissionais que os preconceitos de séculos
passados marcaram como preguiçosos; "boas vidas"; indignos de serem
levados a sério.
Ficarei feliz por autografar meu livro para você, com o
mesmo carinho e reconhecimento que você deve ao meu produto. Só não me peça
para doar esse "ganha-pão", a menos que eu tome a iniciativa do
presente, como às vezes faço, e só eu sei quando posso. Nem o leve para pagar
depois, caso esse depois não tenha data, horário, nem como ser cumprido. Faça
de conta, por exemplo, que meu livro é o contrafilé, a tevê de led (bem mais
baratinha), o refrigerante, a dipirona pelos quais você paga e não fica
chateado com os atendentes ou proprietários... mesmo que sejam velhos amigos.