sábado, 4 de fevereiro de 2012

PERDÃO É TROCA

Acho que o perdão é gradativo. Tem que ser.  Esse negócio de um momento registrado, em que um pede perdão e outro dá, vira documento. Documento é burocrático e tem tudo para se tornar mais um objeto de hipocrisia. Ou de desigualdade, em que este se humilha, se assume inferior, e aquele se engrandece exercendo uma prática ostensiva que será posteriormente admirada por todos. Vejo que os perdoadores nunca são anônimos. Seus atos de grandeza institucional são difundidos e lhes dão prestígio na comunidade; especialmente entre os grupos religiosos dos quais fazem parte.
O verdadeiro perdão não tem palavra decisiva, gesto cortante, ato único. Isso é teatro; serve para emocionar, produzir lágrimas e filmes. São realmente belos os espetáculos produzidos pelo “me perdoa...”, “eu te perdôo!”, mas são apenas espetáculos que o tempo quase sempre desmonta, pela superficialidade. 
Perdoar expressamente é o grande momento de um ser humano em busca de notoriedade ou pelo menos uma boa massagem no ego. É aquele cenário em que uma pessoa se encolhe, baixa os olhos e suplica o produto de uma virtude que o mundo enaltece e transforma em vitrine socio-religiosa. Todos querem perdoar, porque o perdoador é protagonista. Mocinho da história ou do episódio. O perdoado é o vilão. Aquele que fez maldades e agora se rende à própria culpa, como se chegasse ao fim de uma novela, quando cada personagem presta contas de quem foi durante a trama. 
O mundo será mais transparente quando as pessoas se assumirem com seus erros e acertos, as virtudes e os defeitos, todos os lados de sua inevitável humanidade. Se achamos belo pedir perdão, imaginem um mundo em que todos reconheçam suas culpas e recorram em silêncio à generosidade gradual e também silenciosa dos que perdoam. Como não existem situações em que apenas um é culpado, perdoar e pedir perdão terão sempre uma resposta, e essa resposta será construída, estruturada lentamente. Não atirada pelo ímpeto, a precipitação, o arroubo próprio das neuroses de massa.
Perdoem pelo texto. Mas procurem mergulhar no contexto destas linhas e me peçam também perdão. Mas façam isto sem palavras, para que o tempo nos dê a chance desse exercício de grandeza que prefere a sombra e os bastidores. Desçamos do palco de nossas convicções, para ser possível melhorarmos por dentro.

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