segunda-feira, 16 de julho de 2012

O SOFRIMENTO HUMANO COMO ESPETÁCULO


Há certo sadismo na relação povo/imprensa, quando são noticiados crimes hediondos e grandes catástrofes naturais ou de qualquer natureza. Isto se evidencia na riqueza dos pormenores expostos principalmente pela televisão e a curiosidade patológica das pessoas, de consumir as notícias com esses detalhes que não acrescentam informações. Apenas adicionam drama, especulação e chantagem.
Vemos notícias criminais ou catastróficas como quem assiste a filmes policiais ou escatológicos. Queremos saber números de mortos, condições das mortes, medidas de sofrimentos, se os mortos perderam órgãos ou membros. Depois procuramos programas de entrevistas, assistimos a debates televisivos e reprises intermináveis. Tudo enquanto almoçamos, fazemos a ceia, a sesta, e nos comovemos sinceramente, mas em grande parte por engajamento e compromisso com a sensibilidade que esperamos uns dos outros. No entanto, na maioria das vezes não há um engajamento braçal; uma solidariedade física, presencial e de fato eficiente, como daquelas pessoas que estão lá. Nos cenários dos acontecimentos. Vistas por nós, mas longe de suas casas. De seus aparelhos de televisão.
Não tenho a intenção – nem o direito – de condenar essas atribuições inerentes à natureza humana; logo, à minha natureza. Entendo que a minha percepção dessa realidade não me torna superior ao meu semelhante nem arranca de meu íntimo essa natureza. Mas podemos treinar essa percepção e diminuir os requintes dispensáveis de crueldade que acompanham, por exemplo, as perguntas que fazemos a quem sofre uma grande perda. Tais perguntas podem ser trocadas por gestos e silêncios mais férteis. Por solidariedade menos invasiva e mais atuante nas horas certas. Na medida real da carência de cada um, seja ela material ou afetiva. Isto vale para os meios de comunicação, que de fato precisam noticiar com profundidade, para deixar a população ciente dos fatos, mas não precisam mastigar tanto, e com tanto engenho, detalhes menos jornalísticos e muito mais doentios, da intimidade das vítimas de acontecimentos trágicos.
Se não podemos nos arrancar de nossos íntimos, podemos conter nossa natureza nas manifestações de sua negatividade. Atribuições como curiosidade mórbida e sadismo, ainda que inconscientes, nascem como conosco, é inegável, mas podemos amainá-los o suficiente para não agravar o peso do sofrimento humano.
Podemos começar por não vermos a dor do próximo como atração; espetáculo. Por não fazermos da solidariedade um modismo vazio, pontual e sem resultados. Sermos sóbrios, constantes, necessários, diretos e verdadeiros será bem mais útil para o mundo que nos cerca. Existe mesmo essa superficialidade social que transforma a infelicidade maciça num reality show que troca de cenário, mas tem quase sempre os mesmos componentes: Pessoas que sofrem de verdade, não dentro da “casa” televisiva, mas dentro de nossa realidade.

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