sábado, 24 de dezembro de 2011

MULTIDÃO E JUSTIÇA

Quando um crime hediondo abala um país ou o mundo, ao tomar a opinião pública de assalto, pessoas de bom senso se acautelam. Todos tiram suas conclusões, equivocadas ou não; discutem entre família, rodas de amigos, colegas de trabalho, escola, mas não estabelecem que essas conclusões devem prevalecer.  Muito menos que seus arroubos devem perturbar a ordem pública, decidindo pela justiça instituída.
Quem invade as ruas disposta à promoção do linchamento é a multidão dos festeiros. O bonde da hipocrisia, que vive à espera de fatos nefastos, para protagonizar nos filmes de mau gosto que esses fatos rendem, por obra do sensacionalismo. Multidões dessa natureza se compõem de pessoas solitárias e com excesso de tempo, que seguem outras pessoas que também as seguem, cada uma pensando que a outra sabe o que faz.
Não é o retrato ideal da civilização, esse “estouro” de furiosos dispostos a assassinar o assassino, estuprar o estuprador e assaltar o assaltante. Na verdade nem vejo muita diferença entre nós e esses criminosos, quando queremos repetir contra eles as barbaridades que praticaram contra outros.
Dizer que devemos confiar na justiça pura e simplesmente não seria sincero. Acho que deve haver, de fato, a pressão de todos. Da imprensa e da população, das sociedades organizadas e do poder público. Mas isso deve ser feito com civilidade, até mesmo sob o risco de a justiça falhar. Aliás, o bom senso é sempre mais frágil do que a má fé. Um bom exemplo disso está na perseguição a bandidos, por bons policiais, nos centros urbanos. Enquanto o bandido não tem nenhum compromisso com a segurança dos cidadãos em volta, podendo atirar a esmo e para todos os lados, a polícia tem que pensar nisso e tomar todas as precauções para não ferir inocentes. Isso dá uma vantagem significativa ao perseguido.
Ser cidadão de bem tem suas desvantagens. Uma delas é assistir ou amargar injustiças que só seriam reparadas com outras injustiças, por causa de, entre outras coisas, a corrupção do judiciário ou simplesmente as falhas do sistema e as brechas da lei. Haverá sempre ocasiões em que o cidadão ficará impotente, porque terá de abrir mão de possíveis meios espúrios, tortos ou truculentos que seriam os únicos eficientes nessas ocasiões.
A imprensa é capítulo capital a ser analisado nesses episódios. Quando ela é criteriosa, sóbria, responsável, pode ajudar a justiça. Quando age de má fé, pensando só nos índices de audiência, leituras, acessos e resultados em espécie, são inúmeras as vezes em que a imprensa promove condenação de inocentes, absolvição de culpados e engavetamentos de processos importantes, manobrando em primeira instância essa multidão desavisada de que tratamos. Também utiliza o tráfico de suas influências, de acordo com interesses próprios e/ou dos que a mantêm financeiramente ou regem seu funcionamento.
Voltando ao foco, jamais sigamos a multidão sedenta de sangue; de vingança por mãos próprias. Multidão que não sabe o que persegue, porque age sob a hipnose da imprensa que espreme os fatos de forma cruel e sensacionalista. Se é certo que não podemos confiar nos homens que fazem as leis e regem a justiça, confiemos na justiça, por si só, como instituição essencial.

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