quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

VENDENDO FUNGOS


A moça da loja de pães e bolos quis me vender um pão-de-fôrma com validade vencida, usando um argumento esdrúxulo. Disse que os produtos com validade vencida, inclusive remédios, são melhores que os dentro da validade. Não satisfeita, fez olhos de sábia incontestável assegurando que aprendera isso numa palestra. Segundo ela, estava comprovado e pronto.
Como devo ser estúpido, inculto e incauto, não levei o pão. Preferi optar por um produto fresco, mesmo correndo o risco de contrair um câncer, por isto. Só não entendi, avaliando a lição da moça, por que o produto fora da validade estava empilhado em lugar bem à vista, numa promoção desesperada e "imperdível"; muito abaixo do preço normal. Sendo melhor, por ter entrado em decomposição e começado a criar mofo, acho que deveria estar mais caro. Ela podia valorizar o produto, cobrando a mais pelos fungos e ácaros e conquistando a gratidão das pessoas que nunca souberam dos benefícios que trazem à saúde os gêneros alimentícios bolorentos. Os medicamentos velhos. As conservas em latas oxidadas. O bicho da goiaba.
Confesso que ainda não consigo ingerir nada estragado, mas estou chegando lá. Já olho com mais simpatia prás carnes-de-sol bichadas; pro feijão azedado que o boteco do Rafa reaproveita; pros biscoitos empoeirados no varejão do mercadinho de minha rua. Os coliformes fecais do hamburguer que meu preconceito nunca me deixou saborear no velho quiosque da praça imunda que jamais frequentei, por ser mesmo besta.
Boa vendedora, essa moça. Oferece pães e bolos como quem oferece carro, computador e imóvel. Pela perfeição técnica de seu argumento em torno das avarias alimentícias, ela seria uma exímia vendedora de carros enguiçados, computadores em desuso e prédios condenados pela defesa civil, por serem "melhores" que os em bom estado. Só não poderia, com essa mentalidade, ser médica nem professora, por preferir paciente morto e aluno reprovado.
Não. Pensando bem, acho que não sou estúpido por não apreciar comida putrefata. A moça é que é. Estúpida e irresponsável, por querer impor ao mundo à sua volta esse mundinho particular do vale tudo para não correr o risco do eventual encalhe, com a justa redução de lucro. Até mesmo porque uma coisa é certa: Ela jamais daria aos seus o que recomenda aos nossos.

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